segunda-feira, setembro 05, 2016

Da guerra contra as FARC para a paraolimpíada...

Do UOL, em São Paulo

No dia 12 de março de 2012, o capitão Diego Cuesta comandava um pelotão de 17 pessoas em uma investida contra a coluna Teófilo Ferreira, uma tropa de elite das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), quando chegou em um campo minado no meio da selva.

Seus soldados não estavam preocupados: sua unidade era a única da Brigada Móvel, responsável por aquela ofensiva, que não tinha perdido nenhum homem em combate por causa de bombas terrestres.

O problema é que sempre existe uma primeira vez.

Capitão Diego, do Corpo de Engenheiros do Exército Colombiano e especialista em explosivos, iniciou o procedimento padrão.

Isolou a área, conseguiu dar três passos.

Mas no quarto, moveu a estrutura que mantinha a bomba armada.

O explosivo foi acionado.

“Naquele momento, você tem a sensação que está deixando o seu corpo. Você morre, volta, morre novamente. A única explicação para que eu continue aqui é que Deus definiu que não era a minha hora”, contou Cuesta para a revista militar Diálogos América.

O acidente pode ter poupado sua vida. Mas o corpo sofreu os efeitos da explosão.
Seu rosto foi desfigurado e ele precisou de uma operação de sete horas, com uma cirurgiã ucraniana especialista em lesões oculares, para não perder os olhos.

Hoje, tem apenas 40% da visão.

Foi justamente a explosão que colocou o militar na rota dos Jogos Paraolímpicos do Rio de Janeiro, que começam na próxima quarta-feira (7). Não porque ele se feriu.

Mas porque o esporte foi o caminho que encontrou para sua reinserção à sociedade.

Diego Cuesta sempre foi nadador e resolveu apostar no esporte.

Três meses depois de sua primeira competição paraolímpica, foi convocado para defender a Colômbia em um evento internacional.

Em 2015, pouco mais de três anos depois, ele foi aos Jogos Parapan-Americanos de Toronto, no Canadá, levou três medalhas, duas delas de ouro, e se tornou o primeiro militar vítima da Guerra contra a Farc na Colômbia a se classificar para uma Paraolimpíada.

Dois soldados nos Jogos do Rio Fabio Torres, cabo do exército, foi o segundo.

Há 15 anos, estava fazendo reconhecimento em uma área de selva quando pisou no artefato explosivo – este da ELN (Exército de Liberação Nacional), outro grupo guerrilheiro do país.

Sofreu uma amputação na perna esquerda, abaixo do joelho.

Na Rio-2016, vai participar das provas de halterofilismo.

A Colômbia vem ao Rio de Janeiro com 39 atletas.

Os dois são os únicos militares.

Pode parecer pouco.

Mas na delegação do Brasil, com 287 atletas, nenhum é militar de carreira.

A chave para isso é a guerra de mais de 50 anos contra os grupos paramilitares na Colômbia.

O conflito começou nos anos 60, quando surgiram as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e o ELN (Exército de Libertação Nacional).

Aos poucos, a guerrilha passou a sequestrar personalidades políticas e cometer atentados.

Nos últimos anos, usou o tráfico de drogas para financiar suas ações.

Estima-se que o conflito tenha matado cerca de 250 mil pessoas.

Além disso, mais de 8 milhões tiveram de sair de áreas de conflito, por causa da violência.

O número de feridos, porém, nunca foi contado.

Fontes oficiais, por exemplo, falam em 6921 militares mortos ou mutilados somente em acidentes com minas terrestres.

Cuesta e Torres são dois dos mais de 5000 membros das Forças Armadas que participam de programas de reintegração.

Desses, 300 fazem parte de projetos esportivos.

67% dos deficientes colombianos são militares.

Algumas das estatísticas mais tristes do conflito envolvem justamente os mutilados.

Segundo a Coporación Matamorros, uma entidade privada que trabalha em reinserção social com as Forças Armadas colombianas, 67% das pessoas com deficiência física causadas por acidente do país fizeram parte de forças de segurança.

Atualmente, o programa esportivo do Exército tem investimento cada vez mais alto nos centros de reabilitação com foco esportivo.

Além disso, desde 2014 existe uma política oficial do governo colombiano para isso – desde então, cerca de 41 milhões de dólares já foram investidos no setor.

O objetivo é que, nos próximos Jogos Paraolímpicos, até 50% da delegação colombiana venha desses investimentos.

No último dia 24, o atual presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, anunciou um acordo de paz com as Farc que pode levar ao fim do conflito armado – para isso, será preciso que a população diga sim ao texto do pacto em um plebiscito marcado para o dia 2 de outubro.

Entre os termos aceitos pelas Farc para depor as armas estão a realização de reforma agrária e dois temas polêmicos, a criação de um tribunal especial para julgar os guerrilheiros e vagas garantidas no parlamento para membros do grupo.

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