segunda-feira, novembro 21, 2016

O prazer e as dores de correr uma maratona...

Imagem: Divulgação


Sempre tive uma imensa curiosidade sobre o que leva alguém a se colocar sob risco, mesmo que calculado, dedicando meses a fio a um treinamento exaustivo, solitário, cercado de cuidados com alimentação, hidratação e sei mais lá quantos detalhes...

Nunca me arrisquei escrever sobre o assunto, afinal, seria preciso viver todo o processo para poder descrevê-lo.

Gente “insana”, me atrai...

Pessoas que desafiam seus limites me causam um misto de “inveja” e admiração.

Por sorte, encontrei que pudesse contar...

Ricardo Medeiros Lima é médico cardiologista e uma dessas pessoas de quem se gosta facilmente...

Para minha surpresa, acabei descobrindo que entre as muitas virtudes que nele habitam, a tal “insanidade” e a vontade de desafiar limites faziam parte de seu caráter e impulsionavam seu espírito.

Há poucos dias descobri que Ricardo havia escrito sobre sua participação em uma maratona – segundo ele, sua primeira e provavelmente a última – tenho minhas dúvidas.

Como não poderia ser diferente, pedi sua autorização para publicar...

Demorou um pouquinho, mas Ricardo acabou me enviando seu relato.

Abaixo compartilho com os leitores as “42 razões” que levaram Ricardo a atravessar o atlântico, calçar os tênis e repetir o soldado ateniense Fidípides...


42 Razões

Por Ricardo Medeiros Lima

No início de outubro, corri minha primeira maratona.

Foram pouco mais de 42 quilômetros, da cidade de Cascais até Lisboa, em Portugal.

 Para muitos, um esforço injustificável. Para que correr 42 quilômetros pondo em risco a própria saúde?

Na verdade, os números impressionam: foram 4,5 horas, 46.206 passos, 38.360 batimentos cardíacos, 2.416 calorias gastas e mais de 2 Kg de peso perdidos em uma única corrida.

Tudo isso para ganhar apenas uma medalha?!

Não é bem assim.

Para correr uma maratona é preciso de muito mais do que uma generosa dose de insanidade.

Tudo começa com a definição de uma meta arrojada.

Depois, preparação minuciosa: no meu caso, 18 semanas seguindo planilhas, acordando de madrugada para treinar, abdicando de programas de fim de semana à noite com a família e os amigos.

Durante esse tempo, algumas dificuldades, várias intercorrências e muitos obstáculos.

Mas o foco estava no objetivo final que era completar a prova e chegar inteiro.

Desistir não podia ser uma possibilidade.

Principalmente porque tudo isso era só uma preparação para o que viria quando chegasse a corrida de verdade.

Nos dias que antecederam a prova, o estresse aumentou, a adrenalina foi às alturas, veio a insegurança, o medo e a incerteza de que estava realmente pronto para enfrentar os quarenta de dois quilômetros.

Nesse momento, o apoio da família e dos amigos teve enorme influência no sucesso da empreitada.

No dia da prova, acordei cedo e apanhei dois metrôs e um trem, em um trajeto de mais ou menos uma hora até o local da largada.

A volta seria a pé, mesmo!

Início da prova às 8h30min da manhã (pontualidade portuguesa).

Velocidade controlada, hidratação conforme o planejado e total concentração em cada quilômetro, cada metro, cada passada.

Quilômetro 10: aquecido.

Quilômetro 21 (metade da prova) e tudo bem.

Transcorridos ¾ da prova (por volta do quilômetro 30), o esforço e o cansaço começam a fazer você pensar em desistir.

Mas, ao meu lado, havia outros corredores: uns mais preparados, que me ultrapassavam deixando um rastro de inveja, e outros tão ou mais cansados do que eu.

Alguns já não corriam; caminhavam.

Uns, que passavam mal, com cãibras, desidratação, vômito, eram atendidos nos postos médicos pelo caminho.

No entanto, para mim, todo o preparo estava surtindo o efeito desejado.

Não sentia a necessidade de parar, nem de andar.

Ainda sabia quem eu era, o que estava fazendo ali e para que lado teria de correr.

Ótimo sinal.

O que tinha a fazer, então, era ir em frente.

Passei a evitar olhar a marcação dos quilômetros, pois, a essa altura, cada um parecia maior que o anterior (e ainda faltavam mais de dez!).

Encarei mais esse desafio: fui ao último round, de mais uma hora de duração.

Por volta da 1 da tarde, a linha de chegada.

Missão cumprida!

Tentei sorrir para a fotografia oficial.

Deram-me a medalha dos sobreviventes da prova e o kit para sobreviver às próximas horas (chocolate, água, barra de cereal e uma fruta).

Não fui dos primeiros a chegar – lógico! – mas isso foi o que menos importou.

A meta era cobrir o percurso e eu alcancei.

Para correr uma maratona é preciso pensar grande.

É definir objetivo, estudar e planejar.

É cumprir o planejado, superar os obstáculos que surgem pela frente, manter o foco, não desistir... e comemorar o merecido sucesso no final.

Pensando assim, é algo bem semelhante a muito do que todos nós vivemos e enfrentamos no dia a dia.

Tanto na vida pessoal quanto na empresa onde trabalhamos e construímos nosso futuro.

O resultado vale todo o esforço e sacrifício feitos.

Não tem preço.

Enfim, corri minha primeira maratona.

Provavelmente a última.

Ou... quem sabe, a primeira última.

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