Imagem: Blog do Juca Kfouri
Santa Cruz é 100
Por ROBERTO VIEIRA
Eram alunos de um colégio
católico e outro batista. O bairro onde se localizava a Igreja de Santa Cruz
transpirava ídiche, sendo a nova pátria de centenas de judeus oriundos do leste
europeu. Ambiente tão democrático só podia terminar em Paixão…
Todos eles jovens.
O mais velho com quinze anos.
Rasparam os bolsos e o resultado
foram três mil e quinhentos réis.
Dava pra comprar um picolé pra
cada um.
Augusto Dornelas pergunta qual
vai ser o nome de batismo.
O sino anuncia dezenove horas.
O novo clube passa a se chamar
Santa Cruz Football Club.
O sonho pega fogo na rua da
Mangueira, nº2.
O Santa Cruz seria o clube de
todos os sonhos.
E Lacraia seria a prova disso.
Lacraia que era o apelido de
Teófilo Batista de Carvalho.
Lacraia que era filho de médico,
mas possuía um defeito congênito.
Era mulato.
Um pecado no futebol sem cor da
década de 10.
Mas cadê Lacraia?
Lacraia não está no dia da
fundação.
Está estudando para o vestibular
de engenharia.
Luís Barbalho redige a ata.
Caligrafia esmerada.
José Luis Vieira é eleito o
primeiro presidente.
Por um motivo prosaico.
Luís Vieira era o único que
ganhava algum trocado no comércio.
O Santa Cruz será preto e branco.
Preto e branco vai assombrando os
outros times.
Disparando goleadas em quem passa
pela frente.
Ganhando fãs na massa que se
enxerga no sonho dos meninos.
Preto e branco que impera até
1915.
Quando o Santa Cruz teve de mudar
suas cores.
O Flamengo do Recife já era preto
e branco – dava confusão.
Conversa de cá e de lá.
O Flamengo do Rio passa de navio
por Recife.
Dezembro.
Flamengo que vai de Píndaro e
Welfare enfrentar a seleção do Pará.
Uma certa ‘Taça Jornal Folha do
Norte’.
Flamengo que usava o vermelho,
preto e branco.
Estava decidida a questão.
O alvinegro Santa Cruz se torna
tricolor.
E tricolor seguiu seu caminho nas
ruas e becos pernambucanos.
Santa Cruz de Tará e Tiano.
Santa Cruz de Marias e Josés.
Santa Cruz dos Coelhos, do Coque,
do Beberibe.
Santa Cruz que de tão pobre era
negado mil vezes pelos ricos que torciam por ele.
Santa Cruz que apenas Sherloque
pode explicar.
Santa Cruz da Maravilha do Arruda
e de Caça Rato.
Santa Cruz de Ramon batendo Pelé.
Santa Cruz que um dia decidiu
contratar Moacir Barbosa.
Goleiro da seleção de 50.
Santa Cruz que não tinha um
vintém na carteira.
Santa Cruz que pagou Barbosa
passando a cestinha nos mocambos de Recife.
Naquele dia.
Muito moleque pegou o dinheiro do
picolé e depositou na cestinha.
Porque o Santa Cruz sempre foi
assim.
Um sonho de meninos transformado
em Paixão…
Pinçado do blog do Juca Kfouri.