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Como funciona o licenciamento de clubes CBF, por que ele é positivo e
quais ressalvas devem ser feitas
Por: Felipe Lobo
A CBF deu uma bola dentro com a
criação de uma regulamentação de licenças para que os clubes brasileiros
operem.
São exigências mínimas que visam
que o clube tenha o básico, como categorias de base, profissionais com licenças
e infraestrutura.
É um passo importante para que
haja uma organização mínima no futebol brasileiro.
Só que há um detalhe importante
que a CBF não tratou e precisa tratar se quiser falar em licenciamento dos
clubes: calendário.
Mais do que isso, precisa
mostrar, de forma transparente, como isso será fiscalizado e aplicado.
E isso discutimos mais à frente.
Os clubes terão que se adequar a
diversas regras para conseguirem as licenças que permitirão que participem das
competições nacionais nos próximos anos.
A aplicação será gradativa,
começando em 2018 na Série A, em 2019 na Série B, em 2020 na Série C e, por
fim, em 2021 na Série D.
Segundo divulgado pela CBF, a
cada ano a entidade irá divulgar critérios específicos aplicáveis a cada série
do Brasileirão, além de regras específicas para licenciamento para outras
competições da entidade, como a Copa do Brasil, por exemplo.
Serão cinco critérios usados para
que a CBF conceda licenças para os clubes, que explicamos abaixo:
Critérios Desportivos
O clube terá que ter um programa
de desenvolvimento das categorias de base.
Isso inclui como é a organização
do clube em relação a isso, estrutura para treinamentos e jogos, equipes
técnica, médica e de administração, recursos financeiros, formação escolar dos
atletas, entre outros detalhes.
Também será necessário que haja
ao menos uma equipe na categoria sub-20; e uma equipe no sub-17 ou sub-15.
Os treinadores das categorias de
base deverão ter certificação, como a Licença B da CBF, além de ter um
certificado de clube formador.
No caso dos times principais, o
treinador deverá ter a Licença de mais alto nível recomendada pela Conmebol ou
CBF, como a Licença Pro da CBF ou qualquer diploma estrangeiro equivalente e
reconhecido pela CBF.
Os preparadores físicos também
deverão ter certificação da sua área e formação em Educação Física.
Os médicos do clube também
deverão ter a licença da sua categoria e experiência profissional mínima de
três anos.
Ainda na área médica, os clubes
deverão ter um arquivo médico de cada atleta, além de fazer exames preventivos
em cada um deles.
Os clubes também serão obrigados
a terem um time feminino, além de categorias de base feminina, ou ao menos ter
uma parceria, para aquele ano, com uma equipe feminina e de categorias de base.
Critérios de infraestrutura
O estádio que o clube for usar
precisa estar certificado pelas autoridades públicas e deve ser atual, o que a
CBF classifica como “não pode ter mais de um ano de expedição no começo da
temporada”.
O que chama a atenção neste
critério é o item “Disponibilidade do Estádio”.
O item diz que o clube deve
demonstrar que tem a propriedade de um estádio para as competições da Conmebol
e CBF e para mandar as suas partidas durante todo o prazo da licença.
Caso o clube use um estádio
alugado ou cedido, deverá apresentar documentação que comprove isso, como
contrato de locação ou cessão de uso.
Isso será obrigatório para a
licença.
Neste item ainda há uma
especificação que o clube “pode fazer uso de mais de um Estádio na temporada,
devendo demonstrar os acordos que possui e que cobrem o uso dos estádios
durante o prazo da Licença”.
Com isso, será bem mais difícil
fazer a venda do mando de campo, como se tornou muito comum.
Os clubes já deverão ter os
estádios que vai jogar designados dentro da sua licença.
Se quiser vender seus mandos de
campo, precisará de um contrato de licença para que jogue a qualquer momento do
ano naquele estádio.
Isso significa que, por exemplo,
se o Flamengo quiser jogar no Estádio Mané Garrincha ao longo do ano, terá que
fazer um contrato de cessão do estádio que vale por esse período.
O mesmo se quiser jogar em
Cariacica ou na Ilha do Governador, onde o time tem um contrato este ano.
Palmeiras, São Paulo e Santos
jogaram no Pacaembu ao longo do ano de 2016.
Para poderem designar o estádio,
que é da prefeitura, terão que ter um contrato de locação ou de cessão do
estádio com duração para o ano todo.
Estes são apenas alguns exemplos
do que pode ser feito.
Os donos dos estádios, seja onde
forem, poderão oferecer contratos anuais com os clubes para que seus estádios
fiquem disponíveis.
Critérios administrativos e de capital humano
Os clubes precisarão ter alguns
cargos profissionais no clube, como um diretor geral, um diretor financeiro, um
diretor administrativo, diretor de comunicação e diretor de marketing, todos
remunerados.
Ou seja: aqueles cargos políticos
não podem servir aqui.
Além desses cargos, será necessário
ter um ouvidor (que não necessariamente precisa ser remunerado) e um oficial de
segurança (este sim, necessariamente remunerado).
Critérios jurídicos
O clube deverá apresentar seu
estatuto e atos societários, registrados nos órgãos devidos.
Os atos constitutivos deverão
estar em conformidade com a legislação brasileira e com a regulamentação da
Fifa, Conmebol e CBF.
Deverá também apresentar uma
declaração juridicamente válida, assinada por seus representantes legais, para
descrever e confirmar a sua estrutura de propriedade e mecanismo de exercício
de controle.
Ou seja, basicamente, mostrar
quem é que dá as cartas.
Se o clube for social, é preciso
mostrar as estruturas de poder, quem tem de fato poder de decisão.
Se for um clube empresa, quem são
os sócios, quem é o dono e quem toma as decisões.
Outro ponto interessante do
critério jurídico é que o clube não poderá ter dívidas perante a administração
pública e entes fiscais e sociais, “oriundas de procedimentos transitados em
julgado ou que não comportem mais a interposição de recursos”, segundo o
documento da CBF.
Em parte, isso foi resolvido com
programas como o Profut, mas é importante para que no futuro, caso os clubes
deixem de pagar o Profut ou, no caso dos que não aderirem, não fiquem em dívida
de maneira alguma.
Critérios financeiros
Este é mais um ponto
interessante: os clubes deverão apresentar “Demonstrações financeiras
completas, anuais e auditadas”.
A auditoria destas informações
deverá ser feita por uma auditoria independente.
Os itens incluídos nesta
demonstração incluem:
– balanço patrimonial;
– demonstração do déficit ou
superávit do exercício;
– demonstração dos resultados
abrangentes;
– demonstração das mutações do
patrimônio líquido;
– fluxo de caixa;
– notas explicativas.
Além destes itens, que são
obrigatórios, o licenciamento recomenda que o clube também esclareça outros
itens:
– práticas contábeis adotadas;
– parte que exerce o controle;
– proprietário final;
– transações com partes
relacionadas;
– outras informações.
A CBF também irá requisitar que o
clube apresente balancetes com dados parciais do período solicitado.
Em geral, as empresas apresentam
balancetes trimestrais.
E, por fim, será necessário
apresentar um orçamento anual.
E deverá ser apresentado um
documento com as alterações que acontecerem ao longo do ano, atualizando e
complementando as informações com o orçamento real x orçamento orçado, quando
for o caso.
Quais os problemas?
Todas as medidas de licenciamento
da CBF são positivas, do ponto de vista organizacional e também de gestão.
Exigir que os clubes cumpram um
mínimo nesse sentido é ótimo.
Só que a CBF precisa dar uma
contrapartida aos clubes, especialmente à medida que isso for colocado em
prática para os clubes das divisões inferiores.
Exigir que os clubes cumpram
requisitos é importante, mas custa dinheiro.
E a CBF precisa garantir que
todos os clubes terão calendário durante o ano todo.
Mesmo que as exigências sejam
apenas para quem disputa competições nacionais, é preciso garantir um pouco
mais do que hoje.
Mesmo a Série D tem poucos jogos
no total para alguns clubes.
Os times eliminados na primeira
fase da quarta divisão nacional, por exemplo, disputam apenas seis jogos.
Isso significa, por exemplo, um
período de menos de dois meses para os clubes.
É muito pouco para que um clube
tenha toda uma estrutura pesada que a CBF deve exigir – ainda que a entidade
tenha deixado claro que as exigências serão diferentes para cada divisão,
claro.
A entidade precisa repensar a
Série D, a forma de classificação para ela e a fórmula.
Um dos problemas da CBF é
justamente pensar demais no alto da pirâmide, onde ficam os principais times do
país e especialmente a seleção, e pensar menos nos clubes menores.
O licenciamento dos clubes terá
um impacto muito positivo nos clubes de primeira e segunda divisão,
especialmente.
Deve melhorar o futebol, ao menos
em tese.
Em tese porque as medidas são
ótimas, mas só serão eficazes se a CBF for transparente na aplicação desse
licenciamento, de forma a poder ser fiscalizada devidamente também.
Afinal, todas as checagens para
emitir as licenças do clube ficarão a cargo da CBF.
Que a entidade mostre isso às
claras, para que os torcedores possam ver que não é só um discurso para
melhorar, é uma melhora de fato.
Com todas as ressalvas, o
licenciamento é muito positivo.
E para quem está na Série A (ou
pretende estar em 2018), é bom começar a se preparar.
Pode ser um novo começo para
todos esses clubes e para o futebol brasileiro.
Regulamento de Licenciamento de Clubes