Meu pai, o torcedor...
Por Ícaro Carvalho - repórter do "Universidade do Esporte" da 88,9 - FM Universitária
Quando o adversário abriu o
placar aos três minutos de jogo, em Currais Novos minha cidade, meu pai, um
homem com pouco mais de 40 anos sentiu um calafrio na espinha.
Mas, meu pai é meu pai e, logo
arrumou culpados pelo tento do rival:
“Goleiro fraco”;
“O treinador escalou errado”;
“Negócio que dá ódio é torcer pra
esse time”.
Porém, o mais interessante no
torcedor habita em meu pai, e que em nada difere dos outros tantos milhões de
torcedores de futebol, é todos indistintamente trucidam sem piedade a
coerência...
Antes eram os elogios à equipe:
“Estamos numa boa fase”;
“Tem que ganhar hoje”;
“Só sossego com a vitória”.
Incoerência e idas e vindas fazem
qualquer partida ao lado de meu pai ser algo inesquecível.
Os muxoxos e as reclamações em
alto e bom som, convivem, sabe-se lá como, com piques de alta confiança.
“A gente vai ser campeão, não
tenho dúvidas. Mas pô, levar um gol com três minutos, esses caras querem acabar
comigo”.
Vem o segundo tempo e meu pai
permanece o mesmo.
O rival continua dando as cartas
e ele ansioso espera que seu escrete comece a lutar pelo empate que lhe dará o
título.
Com o passar do tempo, o
torcedor, dá lugar ao “treinador que desde sempre deteve o certificado emitido
pela FIFA...
Meu pai já não reclama, aponta os
erros:
“Estamos sem meio campo”;
“O 9 não tá com nada hoje”.
De repente, o time melhora.
Arrisca alguns chutes, cria
chances, ganha volume de jogo.
Meu pai exultante abraça minha
irmãzinha, que na esperança de vê-lo feliz, retribuiu o abraço ainda mais
forte.
Desesperado, faz promessas,
enquanto a abraça...
“Se a gente for campeão, dou um
celular novinho a você”.
Do nada, minha irmã, que sempre
foi alheia aos embates futebolísticos vira a mais apaixonada torcedora.
Vem o gol de empate e logo depois
o gol do título...
Meu pai vibra, mas por um
momento, para, pensa e solta essa pérola: “o troféu veio, mas me lasquei, o
prejuízo vai ser grande”.
Dali para frente, ele se junta as
comemorações efusivas que tomaram conta da cidade.
Meu pai já não era o torcedor ou
o “treinador”, era um “menino” no meio dos carros...
Descalço, com toalha do time nas
costas, cerveja na mão, “canta” aos berros o hino do clube do coração.
Compra mais cerveja, tira foto
com desconhecidos e feliz da vida acaba na casa da minha avó que tem mais de 80
anos e a carrega nos braços, enquanto com passos desajeitados dança a dança da
felicidade...
Nem liga quando alguém o
alerta...
“Cuidado, ela não pode ter essas
agitações!”
Meu pai não está nem aí…
Seu clube é campeão mais uma vez…
No fim dos festejos meu pai volta
para casa e vai dormir abraçado com a alegria.
Dormirá, não um sono qualquer,
mas sim, o sono de um campeão.
Eu, o observo e penso...
Não há nada como assistir a uma
partida do Flamengo ao lado de meu pai - ele se transforma, se transtorna,
sofre, ri, reclama, grita, xinga e ama...
Ama e me faz amá-lo ainda mais.
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