Walter Tull (primeiro à esquerda no alto da fila), coragem para além
das quatro linhas
Uma história de guerra dentro
e fora do gramado
Por Ananda Miranda para o
Universidade do Esporte
Em uma das batalhas mais
sangrentas da história, morreu Walter Tull.
O homem que trocou uma camisa de
futebol por um uniforme militar.
Em 1918, na sangrenta Batalha de
Somme, com um tiro na cabeça, agonizava o oficial de infantaria do Exército
Britânico.
O último suspiro de Tull marcou a
despedida de alguém que defendeu a bandeira até o fim, não apenas dos clubes
ingleses que defendeu, mas também do próprio império britânico.
A vida de Walter foi marcada por
lutas, que deixaram um legado para outras gerações.
Seu pioneirismo, embora esquecido
pela história, serve de inspiração que ecoa nos dias atuais.
Poucos conhecem a vida do gigante
Walter Tull, que foi muito além do primeiro negro a disputar uma partida da
primeira divisão da Inglaterra.
Neto de escravos, filho de
imigrantes e órfão aos dois anos de idade, Walter Tull nasceu com um instinto
natural de superação.
A família que lhe restara, enviou
Walter e um dos seus irmãos, Edward, para um orfanato em Londres, onde ficaram
até completar a maioridade.
Ao sair do orfanato, Tull
conseguiu um emprego, em uma gráfica local como tipógrafo, carreira de seu
falecido pai, mas ele já havia percebido desde muito novo, que queria mesmo era
ser jogador de futebol.
Se encontrar oportunidades como
jogador já é difícil, imagina para um negro nas primeiras décadas do século XX.
Apesar disso, Walter Tull não
deixou o preconceito ser o limite e insistia em seu sonho.
Tull fez o teste para o Clapton,
um dos melhores clubes de futebol amador da época, e foi escolhido.
Entretanto, o amadorismo não era
o objetivo final, treinava dia e noite para alçar voos mais altos, e como
destaque nas partidas vestindo a camisa do Clapton, logo foi percebido pelos
olheiros do Tottenham.
Em uma época de racismo
explícito, Walter Tull era chamado de “escurinho” pelos jornais.
A ideia de um mestiço jogar
futebol incomodava.
As equipes que antes eram
compostas apenas por brancos da elite inglesa, tiveram que se render ao talento
de Tull.
Já no primeiro treino, o atleta
chamou atenção pelas habilidades.
Prontamente, a equipe técnica lhe
ofereceu uma viagem à Argentina para disputar uma série de amistosos.
Não demorou muito para Walter ter
lugar no time titular, nem para conquistar a honra de ser o primeiro negro a
marcar um gol no então campeonato inglês, também não demorou para os ataques
racistas aumentarem.
Enquanto torcidas adversárias
hostilizavam a presença de Walter em campo e a arbitragem marcava-o
rigorosamente, o saldo de gols assinados por Tull só aumentava.
Na partida contra o Bristol
Rovers, ele marcou quatro, dos cinco gols do Tottenham.
Infelizmente, nessa partida, ele
saiu lesionado gravemente e passou muito tempo longe dos gramados.
Ao se recuperar, o treinador o
deixou no banco de reservas, sem oportunidades.
Por algum motivo, o brilho de
Walter Tull, no Spurs foi apagado.
Quando parecia o fim, Herbert
Chapman, um dos maiores técnicos da história, convidou Tull para o Northampton
Town, para disputar a Southern League.
Nessa época, os jornalistas já
haviam passado a reconhecer o craque, nomeado como melhor jogador de ataque
pelo The Futebol Stars.
Walter Tull parecia voltar a
brilhar.
Encerrada a bela trajetória de
três anos no Tottenham, Tull assinou com o Northampton.
A passagem pelo Northampton Town
foi brilhante.
A habilidade de Tull unida ao
fascínio de Chapman pelo talento do atleta, o tornou destaque na equipe.
Em 1914 Walter estava no auge da
carreira, tratado como craque, já era sondado por outros clubes, dentre eles, o
Glasgow Rangers.
No dia 21 de julho de 1914, todo
esse sucesso foi interrompido, o Glasgow Rangers não teve nem tempo de assinar
contrato.
Àquela altura, Walter Tull já
havia trocado a bola por uma arma, o campo de futebol pelo campo de batalha.
A Primeira Guerra Mundial estava
em seu início, Walter Tull, foi um dos primeiros jogadores de futebol a se
alistar no “Footballers Battalion”, o 17º da infantaria, que reunia jogadores
profissionais para lutarem na guerra.
Novamente, era pioneiro.
O primeiro negro nascido na
Inglaterra a lutar pelo Exército Inglês.
Seu comportamento heroico o
tornou o primeiro oficial mestiço do Exército Britânico, reconhecimento por sua
bravura em combate.
Ser oficial negro, numa época em
que era impensável um negro comandar brancos nos campos de batalha.
Tull estava a poucos dias do seu
aniversário de 30 anos, realocado como líder de infantaria na Segunda Batalha
de Somme, foi atingido por um tiro fatal na cabeça, caindo diante do inimigo.
Ali se encerrava a trajetória de
coragem de Walter Tull, o homem que rompeu todas as barreiras que o preconceito
levantou.
O corpo de Walter Tull nunca foi
encontrado, o protagonista dessa história não tem nem túmulo.
Foi condecorado com a British War
Medal, mas seu nome foi apagado na história, assim como as cinzas do seu corpo.
Existindo apenas no imaginário
dos grandes exemplos de superação do futebol mundial.
Um comentário:
Parabéns pelo "achado". Só você mesmo!
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