quarta-feira, maio 22, 2024

Walter Tull: craque, herói de guerra e um símbolo da luta pela igualdade

Imagem: Bob Thomas/Popperfoto via Getty Image

Walter Tull (primeiro à esquerda no alto da fila), coragem para além das quatro linhas

Uma história de guerra dentro e fora do gramado

Por Ananda Miranda para o Universidade do Esporte

Em uma das batalhas mais sangrentas da história, morreu Walter Tull.

O homem que trocou uma camisa de futebol por um uniforme militar.

Em 1918, na sangrenta Batalha de Somme, com um tiro na cabeça, agonizava o oficial de infantaria do Exército Britânico.

O último suspiro de Tull marcou a despedida de alguém que defendeu a bandeira até o fim, não apenas dos clubes ingleses que defendeu, mas também do próprio império britânico.

A vida de Walter foi marcada por lutas, que deixaram um legado para outras gerações.

Seu pioneirismo, embora esquecido pela história, serve de inspiração que ecoa nos dias atuais.

Poucos conhecem a vida do gigante Walter Tull, que foi muito além do primeiro negro a disputar uma partida da primeira divisão da Inglaterra.

Neto de escravos, filho de imigrantes e órfão aos dois anos de idade, Walter Tull nasceu com um instinto natural de superação.

A família que lhe restara, enviou Walter e um dos seus irmãos, Edward, para um orfanato em Londres, onde ficaram até completar a maioridade.

Ao sair do orfanato, Tull conseguiu um emprego, em uma gráfica local como tipógrafo, carreira de seu falecido pai, mas ele já havia percebido desde muito novo, que queria mesmo era ser jogador de futebol.

Se encontrar oportunidades como jogador já é difícil, imagina para um negro nas primeiras décadas do século XX.

Apesar disso, Walter Tull não deixou o preconceito ser o limite e insistia em seu sonho.

Tull fez o teste para o Clapton, um dos melhores clubes de futebol amador da época, e foi escolhido.

Entretanto, o amadorismo não era o objetivo final, treinava dia e noite para alçar voos mais altos, e como destaque nas partidas vestindo a camisa do Clapton, logo foi percebido pelos olheiros do Tottenham.

Em uma época de racismo explícito, Walter Tull era chamado de “escurinho” pelos jornais.

A ideia de um mestiço jogar futebol incomodava.

As equipes que antes eram compostas apenas por brancos da elite inglesa, tiveram que se render ao talento de Tull.

Já no primeiro treino, o atleta chamou atenção pelas habilidades.

Prontamente, a equipe técnica lhe ofereceu uma viagem à Argentina para disputar uma série de amistosos.

Não demorou muito para Walter ter lugar no time titular, nem para conquistar a honra de ser o primeiro negro a marcar um gol no então campeonato inglês, também não demorou para os ataques racistas aumentarem.

Enquanto torcidas adversárias hostilizavam a presença de Walter em campo e a arbitragem marcava-o rigorosamente, o saldo de gols assinados por Tull só aumentava.

Na partida contra o Bristol Rovers, ele marcou quatro, dos cinco gols do Tottenham.

Infelizmente, nessa partida, ele saiu lesionado gravemente e passou muito tempo longe dos gramados.

Ao se recuperar, o treinador o deixou no banco de reservas, sem oportunidades.

Por algum motivo, o brilho de Walter Tull, no Spurs foi apagado.

Quando parecia o fim, Herbert Chapman, um dos maiores técnicos da história, convidou Tull para o Northampton Town, para disputar a Southern League.

Nessa época, os jornalistas já haviam passado a reconhecer o craque, nomeado como melhor jogador de ataque pelo The Futebol Stars.

Walter Tull parecia voltar a brilhar.

Encerrada a bela trajetória de três anos no Tottenham, Tull assinou com o Northampton.

A passagem pelo Northampton Town foi brilhante.

A habilidade de Tull unida ao fascínio de Chapman pelo talento do atleta, o tornou destaque na equipe.

Em 1914 Walter estava no auge da carreira, tratado como craque, já era sondado por outros clubes, dentre eles, o Glasgow Rangers.

No dia 21 de julho de 1914, todo esse sucesso foi interrompido, o Glasgow Rangers não teve nem tempo de assinar contrato.

Àquela altura, Walter Tull já havia trocado a bola por uma arma, o campo de futebol pelo campo de batalha.

A Primeira Guerra Mundial estava em seu início, Walter Tull, foi um dos primeiros jogadores de futebol a se alistar no “Footballers Battalion”, o 17º da infantaria, que reunia jogadores profissionais para lutarem na guerra.

Novamente, era pioneiro. 

O primeiro negro nascido na Inglaterra a lutar pelo Exército Inglês.

Seu comportamento heroico o tornou o primeiro oficial mestiço do Exército Britânico, reconhecimento por sua bravura em combate.

Ser oficial negro, numa época em que era impensável um negro comandar brancos nos campos de batalha.

Tull estava a poucos dias do seu aniversário de 30 anos, realocado como líder de infantaria na Segunda Batalha de Somme, foi atingido por um tiro fatal na cabeça, caindo diante do inimigo.

Ali se encerrava a trajetória de coragem de Walter Tull, o homem que rompeu todas as barreiras que o preconceito levantou.

O corpo de Walter Tull nunca foi encontrado, o protagonista dessa história não tem nem túmulo.

Foi condecorado com a British War Medal, mas seu nome foi apagado na história, assim como as cinzas do seu corpo.

Existindo apenas no imaginário dos grandes exemplos de superação do futebol mundial.

Imagem: Autor Desconhecido

Um comentário:

jornal da grande natal disse...

Parabéns pelo "achado". Só você mesmo!