Quer Entender Um Pouco Mais do
“Legado” Rio 2016?
Por Alberto Murray
Desde o primeiro dia que começou
essa aventura olímpica brasileira posicionei-me contra, por razões que estão
públicas, as quais não vou repisar agora, porque não é o objetivo deste artigo.
O tempo passou e mostrou que eu
tinha razão.
Rio 2016 foi um engodo e uma
roubalheira desenfreada.
Por isso há muita gente que foi
presa.
Nesta semana, o prefeito do Rio,
Eduardo Paes, comunicou que doará uma das piscinas adquiridas para os Jogos
Olímpicos para a cidade de Maricá.
A iniciativa é boa.
Mas que não seja um presente de
grego. Junto com a doação precisa-se estabelecer quem dará os recursos para a
sua instalação e manutenção.
E, ainda, que seja criado um
plano de plena utilização do equipamento.
Não ficou claro para mim o que
será feita da piscina de aquecimento.
Embora antes tarde do que nunca,
é vergonhoso que uma piscina de altíssima qualidade tenha permanecido
empacotada, sem uso, por cinco anos.
Desde o período que precedeu os
Jogos Panamericanos de 2007 até a conclusão dos Jogos Olímpicos do Rio 2016, nunca,
na história deste país, jorrou tanto dinheiro federal, de maneira tão fácil e
tão sem controle, para os cofres do esporte.
Vamos, então, começar tratando do
legado falando em piscinas.
Antes desta de Maricá, outras
quatro piscinas compradas para o Rio 2016 já haviam sido doadas.
São elas: (a) para Manaus; (b)
para Salvador; (c) para o Exército Brasileiro, na Fortaleza de São João; e (d)
para a Aeronáutica do Brasil, mediante contrato.
Ao longo deste texto vamos
abordar mais sobre desportos aquáticos e o “legado” olímpico do Rio.
PARQUE OLÍMPICO DA BARRA
O investimento do Ministério do
Esporte no Parque Olímpico da Barra foi de R$ 1.2 Bilhão.
Vamos analisar item a item:
Centro Olímpico de Tênis:
Gastaram-se R$ 194.000.000,00
(cento e noventa e quatro milhões) com a construção do Centro Olímpico de
Tênis, que levou no nome da multi campeã Maria Esther Bueno. O legado prometido
para esse espaço era a realização permanente de eventos de alto rendimento e
projetos sociais. As instalações deveriam servir, exclusivamente, ao esporte,
em particular ao tênis. O que se viu não foi isso. A prática do tênis foi
esquecida. O local, em deterioração, tem várias outras utilidades, mas que não
são aquelas estabelecidas no projeto Rio 2016. Houve claro desvio de finalidade.
Deveria, de acordo com as promessas dos organizadores, ser administrado por
meio de uma Parceria Público Privada (PPP) e cuja prorrogação do contrato seria
definida em parceria entre o Ministério e as Confederações. Não existe.
Velódromo Olímpico:
Investiram-se R$ 140,6 Milhões
para a sua construção. O comprometimento do legado era fazê-lo um espaço
destinado ao alto rendimento e projetos sociais, para ajudar a massificar a
prática dessa modalidade. Também não foi nada disso que ocorreu. O ciclismo não
pode aproveitar o espaço como prometiam os organizadores do Rio 2.016. Houve
desvio de finalidade. Espaço totalmente subutilizado. Novamente, o espaço
deveria ser gerido por uma PPP, cuja renovação do contrato seria definida nos
mesmos moldes do Centro Olímpico de Tênis. Não existe, também.
Arenas Cariocas:
Os recursos do Ministério do
Esporte foram destinados à climatização, no montante de R$ 58,5 Milhões. A
contrapartida dos legados, previstas em notas técnicas e documentos oficiais,
eram as seguintes: (a) Arena Carioca I – serviria ao esporte de alto rendimento
e para a promoção de eventos; (b) Arena Carioca II – seria exclusiva para o
esporte de alto rendimento; (c) Arena Carioca III – Ginásio Experimental
Olímpico (GEO), que deveria ter vinte e quatro salas de aulas em pleno
funcionamento, laboratórios de ciências, de mídias e duas salas multiuso.
Obrigavam-se a ter um contingente de mil alunos em tempo integral. Basta uma
visita ao local para se ver que o legado prometido está muito, mas muito longe
do que a patota olímpica do Rio 2016 prometeu ao povo do Brasil, que pagou essa
conta. Mais um engodo.
Instalações Temporárias:
Para as instalações temporárias o
Ministério do Esporte destinou mais R$ 365,4 Milhões. E, assim, vejamos:
Arena do Futuro:
Foram gastos R$ 140 Milhões. O
legado a que os organizadores da aventura olímpica se obrigavam a proporcionar
ao povo, como contrapartida, era que aquela estrutura seria desmontada para
serem construídas quatro escolas públicas. Três seriam na região de Jacarepaguá
e uma em São Cristóvão. Novamente, nada feito.
Estádio Olímpico de Esportes
Aquáticos:
O valor empreendido foi de R$
225,3 Milhões. A contrapartida do legado deveria ser transformá-los em dois
centros aquáticos, a saber: (a) Parque Madureira; e (b) Campo Grande. Em um
deles obrigavam-se a colocar cobertura e arquibancadas para seis mil
expectadores. O outro, arquibancadas para três mil expectadores. Ninguém fez
nada. mais um contrato descumprido. E cuja conta VOCÊ pagou.
O Ministério do Esporte também
investiu outros R$ 159 Milhões, que foram usados para a construção das
primeiras linhas de transmissão de alimentação de energia do Parque Olímpico da
Barra, construção de subestação de energia elétrica e da primeira linha de
alimentação de energia do campo de golfe (cuja construção, em si, já foi um
outro escândalo, largamente abordado pela imprensa especializada).
E não para por aí. Ao Ministério
do Esporte também coube gastar R$ 290 Milhões no fornecimento de energia
temporária (geradores, cabeamento, operação e manutenção) para as instalações
de competições e locais de não competição na região da Barra.
O legado a que se obrigavam era
realizar uma PPP com prazo de vinte e cinco anos, envolvendo a prefeitura do
Rio, a iniciativa privada e as Confederações esportivas olímpicas.
Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ)
A UFRJ também foi palco de
eventos olímpicos e recebeu vultosos recursos do Ministério do Esporte no total
de R$ 61.390.000,00, divididos da seguinte forma:
R$ 1.739.364,48, para o que
chamaram de Projetos;
R$ 869.682,24, para Serviços
Preliminares;
R$ 21.162.267,92, para a
construção do campo de Hóquei na Grama;
R$ 8.406.928,35, para a
construção do campo de Rugby;
R$ 14.494.704,06, para a
reforma da piscina;
R$ 3. 768.623,06, para reforma
de edifícios já existente da EEDF (vestiários);
R$ 7.537.246,11, para
infraestrutura, urbanismo e paisagismo;
e R$ 3.411.183,78, para
assistência técnica, operação civil e instalações.
Tudo isso foi dinheiro público
federal destinado a uma universidade pública federal. O que se esperava é que,
após os Jogos Olímpicos, esses espaços estivessem conservados, sendo largamente
utilizados pelos alunos, pela comunidade local e pelo púbico em geral. Visite a
UFRJ e veja VOCÊ mesmo a situação calamitosa em que se encontram essas
instalações, subutilizadas e em franca deterioração. No ano passado, a
Confederação Brasileira de Hóquei na Grama fez um apelo legítimo, público, para
que as autoridades mantivessem o campo de hóquei preservado e em condições de
uso, para que não se perdesse de vez aquele “legado olímpico”. A desídia com
que a universidade federal está tratando tudo que foi feito é de se lamentar.
Entendo que a universidade federal, àquela altura, já não tinha recursos para manter
tudo aquilo. Mas isso deveria ter sido pensado antes. Instalações temporárias
teriam sido mais baratas e não teriam virado elefantes brancos.
Parque Olímpico de Deodoro
No início, havia hesitação por
parte das Forças Armadas em querer se envolver com essa questão olímpica que,
sem dúvida, acaba imiscuindo-se com políticos e política. Boa parte dos
integrantes das Forças Armadas têm restrições em se envolver com questões fora
da caserna, porque em todas as vezes que assim o fizeram, isso gerou um desgaste
para a instituição. Com toda razão, portanto, as Forças Armadas hesitavam
bastante em mergulhar na aventura olímpica brasileira, principalmente
considerando as pessoas que estavam à frente da organização do evento. Mas o
então prefeito Eduardo Paes literalmente forçou a barra para usar as
instalações militares de Deodoro como parte do palco olímpico. Mas ainda havia
uma questão a ser superada. Por lei, as Forças Armadas não recebem repasses
diretos de dinheiro que não estejam previstos no orçamento da União Federal. Ou
seja, não poderiam receber recursos além daqueles orçamentários, que seriam
usados na construção das obras olímpicas em Deodoro. Nesse cenário, para
viabilizar o projeto, a Marinha do Brasil usou uma empresa chamada EMGEPRON, a
quem coube receber os recursos. Quem pagou a conta da construção do Parque
Olímpico de Deodoro foi o consórcio da Prefeitura do Rio e do Ministério do
Esporte. Entre as obras esportivas que sobraram dos Jogos Olímpicos Rio 2016,
reconheço que o Parque Olímpico de Deodoro é o que tem melhor utilização.
Aliás, talvez o único espaço que seja, de alguma forma, utilizado. Mas
evidentemente que poderia ser muito mais usado, se houvessem os organizadores
dos Jogos cumprido as promessas feitas antes deles acontecerem. A utilização é
pouca em face do que poderia ser. O Parque Olímpico de Deodoro custou aos
cofres públicos R$ 820,9 Milhões. Foi VOCÊ quem também pagou por ele.
Laboratório Brasileiro de
Controle de Dopagem
O Ministério do Esporte
investiu a alta cifra de R$ 269,5. As novas instalações do LBCD receberam R$
151,3 Milhões do Ministério do Esporte e R$ 38,5 Milhões do Ministério da
Educação, para serem utilizados em obras e projetos. Para a compra de insumos,
novos equipamentos, materiais, mobiliário e operação foram destinados R$ 74,6
Milhões, sendo R$ 60 Milhões do Ministério do Esporte e R$ 14,6 do Ministério
da Educação. A quase totalidade dos equipamentos é importada. Além disso, houve
um aporte de R$ 43,6 Milhões, sendo R$ 28,6 Milhões do Ministério do Esporte e
R$ 15 Milhões do Ministério da Educação, exclusivamente para a chamada operação
olímpica. O laboratório foi recredenciado pela Agência Mundial Antidopagem
(WADA), em maio de 2.015, passando a ser o trigésimo quarto laboratório do
mundo credenciado pela instituição e o segundo da América do Sul. O outro está
em Bogotá, na Colômbia.
A contrapartida de legado para
esse alto investimento de recursos públicos deveria ter sido destinar esses
equipamentos a universidades federais e outras instituições públicas. Cabível e
necessária uma investigação do Ministério Público sobre o assunto.
Construção de Pistas de
Atletismo
Foram destinados R$ 301,8
Milhões do Ministério do Esporte para a construção de quarenta e sete pistas de
atletismo no Brasil. Haviam sido entregues apenas dezenove delas. As demais
ficaram pelo caminho do legado inexistente e esse é mais um ponto que merece
ser objeto de investigação por parte do Ministério Público Federal. O projeto
previa que, após a construção dessas pistas, a manutenção, equipagem e operação
delas ficariam a cargo de parcerias entre o Ministério do Esporte, Governos
Estaduais e Municipais, Universidades, Confederação Brasileira de Atletismo e
clubes.
Nosso herói olímpico, o
velocista André Domingos, fez um louvável esforço junto ao Ministério do
Esporte para que uma dessas pistas fosse construída em sua cidade natal, no
interior de São Paulo. Apesar de tudo, não logrou êxito, o que é uma pena.
Outro ponto a ser destacado é
que essas pistas, aquelas que saíram do papel, foram construídas levando-se em
conta critérios meramente políticos e não técnicos.
Equipamentos De Ponta Para
Preparação de Atletas – Rede Nacional de Treinamento
Essa foi mais uma promessa de
legado da Rio 2016. Desde 2010 o Ministério do Esporte celebrou cento e
quarenta e quatro convênios com entidades esportivas, cujos repasses excederam
R$ 300 Milhões. Os Convênios deveriam permitir, além da aquisição de
equipamentos modernos, expressivo investimento na preparação dos atletas de
alto rendimento, com participação em torneios internacionais, treinamentos em
outros países e no Brasil, além de identificação e formação de novos talentos e
a contratação de equipes multidisciplinares.
A compra de equipamentos
beneficiou alguns centros já existentes em algumas modalidades.
A contrapartida do legado
desses cento e quarenta e quatro convênios e do investimento de R$ 300 Milhões
deveria ter sido a Rede Nacional de Treinamento. Essa tal Rede Nacional de
Treinamento nunca saiu do papel na forma em que foi concebida, E é recomendável
ao Ministério Público Federal que investigue, uma a um, esses cento e quarenta
e quatro convênios, os recursos despendidos em cada um e os benefícios para os
atletas e para o povo brasileiro.
Laudo de Inspeção de
Instalações do Parque Olímpico da Barra
No dia 18 de abril de 2.017, o
então ministro do esporte, Leonardo Carneiro Monteiro Picciani enviou um ofício
ao então prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Bezerra Crivella, no qual
noticiava ter havido uma vistoria técnica nas instalações no Parque Olímpico da
Barra, entre os dias 07 de 10 de fevereiro daquele ano. Os engenheiros
responsáveis pela vistoria técnica encontraram, segundo a carta “mais de 1.300
(mil e trezentos) registros de anomalias ou falhas identificadas em diversos
sistemas construtivos”. Anexa à carta seguiu o laudo de vistoria técnica. Ao
final da carta, o ministro solicitava ao prefeito providências para correção
das “anomalias”, notadamente nas Arenas 1 e 2, velódromo e centro de tênis. E,
ainda, requeria aceleração no cumprimento de recebimento definitivo das obras,
para o cumprimento da cláusula décima terceira do acordo de cessão. Ou seja, o
Parque Olímpico da Barra, que deveria ter gerado um legado magistral, estava
literalmente caindo aos pedações e representava um risco para o cidadão. As
obras que VOCÊ pagou, com o dinheiro do seu imposto, estavam ruindo. O tal
contrato de cessão a que o ofício do ministro se refere, dizia respeito à transferência
do Parque Olímpico da Barra do Município do Rio de Janeiro, para a União
Federal. Isto é, a dívida tinha passado a ser de todo povo brasileiro.
Ainda é necessário frisar que essas”
mais de 1.300 anomalias’, identificadas pelos engenheiros, acabou por ser do
conhecimento de todas as autoridades envolvidas com a organização dos Jogos,
que nada fizeram. O próprio Escritório Olímpico, cuja função prática era
nenhuma, teve conhecimento do fato e também quedou-se inerte.
Centros de Iniciação Ao Esporte
Em 233 Cidades (CIE)
A finalidade de cada um desses
CIE, segundo a patota olímpica, era identificar talentos, formar atletas e
incentivar a prática esportiva em territórios de vulnerabilidade social,
mediante a construção de instalações esportivas que deveriam seguir as
exigências oficiais. Cada CIE tinha por obrigação oferecer a prática de treze
modalidades olímpicas, seis paraolímpicas e uma não olímpica (futsal). Tudo
isso teria o pomposo nome de Rede Nacional de Treinamento. O prometido é que
tudo isso deveria estar pronto no dia da abertura do Rio 2016. Nada aconteceu!
Essa teria sido a contrapartida para uma quantia de R$ 836 Milhões que, mais
uma vez, jorraram dos cofres do Ministério do Esporte e sabe-se lá onde foram
parar. Nunca ouvi, ou li, que se tenha feito uma investigação sobre o tema.
A Floresta Olímpica
Na inauguração dos Jogos
Olímpicos do Rio 2.016, cada atleta que entrava para desfilar, pegava uma muda
de árvore, que seria plantada em algum lugar do Rio, para se formar uma
frondosa Floresta Olímpica. Até pouco tempo atrás aquele amontoado de mudas
estava guardado em um lugar no Rio, sem nunca ter virado floresta. Há alguns
meses ouvi que alguém plantaria algumas delas em algum lugar. Não sei se o fez.
Os organizadores do Rio 2016 haviam prometido um “legado ambiental”, que nunca
foi feito. Aquela história das mudas era uma jogada de marketing para
esconder a falta de legado ambiental e dar a impressão de que o Rio 2016
preocupava-se em ser “sustentável”. Outro embuste, que VOCÊ pagou. O maior
legado ambiental que o Rio 2016 poderia ter deixado ao Brasil teria sido a
despoluição da Baía da Guanabara.
Conclusões
A tal da AGLO, criada para cuidar
do “legado olímpico” mostrou-se outra coisa inútil, que se não me engano
custava aos cofres públicos cerca de R$ 40 Milhões ao ano.
Era um cabidão de empregos, que
nunca fez nada.
Aliás, que legado ela teria para
cuidar?
Rio 2016 foi um embuste, que VOCÊ
pagou a conta e que não lhe trouxe nada de bom.
Muita gente ganhou muito dinheiro
com isso.
Esses atos de improbidade não
podem ficar esquecidos e cair naquelas coisas que, no Brasil, não raro, dão em
nada.
Temos um Ministério Público
Federal competente, que tem que ir atrás disso, antes que os crimes prescrevam.
E lutar muito que todas as
pessoas que fizeram parte do mar de lama Rio 2016, nunca mais retornem ao
esporte, ou a qualquer outra posição de liderança.
Desde que me propus a denunciar
as mazelas do esporte, passei a receber documentos oficiais, alguns públicos,
de gente insatisfeita com os rumos do olimpismo no Brasil.
Eu os uso para muitos de meus
artigos e, em alguns caso, para desbaratar quadrilhas que antes pareciam
invencíveis.
Pela ética e transparência no esporte, sempre!
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