Ministro usa até Desafio ao Galo
para distribuir honraria militar como mimo
Vinícius Segalla
Para o UOL Esporte
O Ministério da Defesa premiou
neste ano 252 pessoas com uma medalha de mérito militar que deveria ser
concedida somente àqueles que "prestaram relevantes serviços ao desporto
militar do Brasil".
Na lista dos agraciados, porém,
constam nomes de pessoas que jamais realizaram nenhuma ação em prol do esporte
militar brasileiro, incluindo políticos do mesmo partido do ministro da Defesa,
Aldo Rebelo (PC do B), dirigentes de clubes de futebol, aliados políticos e
comentaristas esportivos.
Até o extinto torneio de futebol
de várzea Desafio ao Galo foi motivo para o agraciamento, segundo o Ministério.
Trata-se da Medalha do Mérito do
Desporto Militar.
A honraria das Forças Armadas foi
criada por uma lei de 2006, mas só passou a ser concedida em 2008, após
publicação de uma portaria normativa que regulamentou o prêmio.
Desde então, sem contar as deste
ano, foram entregues 1.121 medalhas no total, uma média de 140 por ano.
Aldo Rebelo é o ministro da
Defesa que mais medalhas concedeu de uma vez.
Com apenas 51 dias em 2016, ele
já aumentou em 80% a média do que era distribuída por ano, com 112 a mais do
que o comum.
A portaria que regulamenta a
medalha é bem clara sobre a quem deveria ser destinada a honraria:
"militares brasileiros que tenham se destacado em competições desportivas
nacionais ou internacionais, bem como militares e civis brasileiros ou
estrangeiros que tenham prestado relevantes serviços ao desporto militar do
Brasil".
Apesar disso, como se pode ver na
lista abaixo, o Ministério da Defesa não levou em conta os critérios legais
para distribuir a honraria neste ano.
A portaria normativa que versa
sobre a premiação preconiza que quem deve propor os laureados são comissões
desportivas do Exército, Marinha e Aeronáutica.
Essas comissões devem entregar
suas propostas acompanhadas de justificativas para uma outra comissão geral,
que avaliaria se a pessoa seria ou não merecedora da medalha.
O UOL Esporte pede desde o dia 12
de fevereiro que o Ministério da Defesa forneça as justificativas oficiais
elaboradas pelas comissões militares, mas a pasta não forneceu e avisa que não
fornecerá os documentos, que são públicos.
Ao invés disso, enviou à
reportagem as justificativas que seguem abaixo para alguns dos premiados.
Na semana que vem, o portal
entrará com um pedido via Lei de Acesso à Informação para obter os papeis.
Vanderlei Luxemburgo
O técnico de futebol que
atualmente está trabalhando na China jamais realizou qualquer atividade ligada
ao desporto militar.
A justificativa para a sua premiação, conforme o
Ministério da Defesa informou à reportagem, é:
"Formado em educação física,
estudioso do futebol, ex-técnico da seleção brasileira, vitorioso na sua
trajetória como técnico no Brasil e no exterior."
Andrés Sanchez (PT-SP)
Os motivos alegados pela Defesa
para premiar o ex-presidente do Corinthians e atual deputado federal são:
"Integra a Comissão do
Esporte da Câmara dos Deputados, instituição que tem se destacado no
fortalecimento da legislação esportiva do Brasil."
Milton Neves
O apresentador de televisão e
comentarista esportivo é merecedor da honraria das Forças Armadas do Brasil, de
acordo com o Ministério da Defesa, pelos fatos que seguem:
"Jornalista, apresentador,
divulgador que, com sua atividade, divulga e valoriza a prática do esporte de
alto rendimento e, notadamente, do futebol do Brasil."
Marcelo Teixeira
O ex-presidente do Santos Futebol
Clube não tem nenhuma relação com o desporto militar brasileiro. A medalha está
sendo concedida a ele por sua atuação no "esporte amador e de alto
rendimento":
"Dirigente do Santos Futebol
Clube e empresário destacado no estímulo e apoio à prática do esporte amador e
de alto rendimento."
Ademir da Guia (PC do B-SP)
Figura pouco conhecida do grande
público, o advogado é um entusiasta do esporte rural, e por isso se tornou,
para o Ministério da Defesa, merecedor da honraria militar:
"Advogado e presidente da
Confederação Nacional da Prática do Esporte Rural, conhecida como Laço
Comprido. Pioneiro e organizador do laço no Mato Grosso do Sul e de suas
instituições..."
Fernando Fernandes Filho
(PSDB-SP)
O valor que o prefeito de Taboão
da Serra (Grande São Paulo) dá ao futebol de várzea foi o que motivou sua
premiação por parte do Ministério da Defesa:
"Prefeito da cidade de
Taboão da Serra, considerada a capital brasileira do futebol de várzea, esporte
por ele valorizado e promovido."
Hortência Marcari
A ex-jogadora de basquete nunca
teve o menor contato com o desporto militar, mas sua medalha de mérito foi garantida
pelo que ela fez pelo esporte dentro e fora das quadras:
"Dirigente esportiva,
integrou o Conselho Nacional do Esporte, com uma grande contribuição ao
aperfeiçoamento da gestão e da legislação esportiva no Brasil. É considerada
uma das melhores atletas do basquete de todos os tempos."
Vilmar Romera – (post mortem)
Eventos e passeios a cavalo
fizeram com que este radialista fosse honrado, após morrer, com a Medalha do
Mérito do Desporto Militar:
"Apresentador e radialista.
Fundador da Cavalgada do Mar e valorizador dos esportes equestres no Rio Grande
do Sul."
Gregório Antônio de Souza Poço
(PC do B-SP)
O secretário sindical do PC do B
em São Paulo não tem qualquer relação com o desporto militar. Sua ligação com o
esporte é por meio do torneio de futebol amador "Desafio ao Galo", e
foi isso que levou o Ministério da Defesa a conceder com a honraria militar:
"Presidente do clube dos
motoristas e condutores de São Paulo (CMTC Clube), que sempre valorizou o
esporte amador e comunitário. Sediou, durante muito tempo, o torneio amador
Desafio ao Galo, que se tornou um dos mais prestigiados eventos do futebol de
várzea da capital paulista. Acolhe até hoje atividades desportivas amadoras e
comunitárias."
George Hilton (PRB-MG)
Para o ministro do Esporte ter
ganho a honraria militar, a justificativa da Defesa é sucinta:
"Ministro do Esporte,
responsável pela organização dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos 2016 no
Brasil."