PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA
21º REGIÃO
Acórdão nº 126.983
Recurso Ordinário nº
75600-79.2012.5.21.0007
Relator: Desembargador José
Barbosa Filho
Recorrentes: Carlos César dos
Santos Filho e ABC Futebol Clube
Advogado: Felipe Augusto Leite e
José Wilson Gomes Netto e outros
Recorridos: Carlos César dos
Santos Filho e ABC Futebol Clube
Advogado: Felipe Augusto Leite e
José Wilson Gomes Netto e outros
Origem: 7ª Vara do Trabalho de
Natal
Recurso do Reclamado
Rescisão indireta do contrato de
trabalho – não comprovação do abandono de emprego
Inexiste nos autos prova efetiva
do abandono de emprego a embasar a demissão por justa causa alegada pela
defesa. Ao revés, há comprovação de que o autor participou de alguns jogos e de
treinamento no clube até a rescisão indireta do contrato, ou seja, permaneceu à
disposição.
Aplicação da multa do art. 475-J
do CPC.
A CLT é omissa quanto à multa
pelo não cumprimento da sentença trabalhista transitada em julgado e, ainda, a
multa do art. 475-J do CPC é compatível com as normas trabalhistas, pois
contribui para maior celeridade na efetivação da prestação jurisdicional, o que
atende aos requisitos de que trata o art.769 da CLT. Além disso, permite ao
devedor optar por cumprir voluntariamente a decisão e eximir-se da multa
pecuniária.
Multa do art. 477, § 8º, da CLT –
Aplicabilidade - contrato por prazo determinado – atraso incontroverso.
Inexiste qualquer óbice legal à
aplicação da multa do art. 477, § 8º, da CLT às rescisões de contrato de
trabalho por prazo determinado, quando configurada a mora.
Recurso do Reclamante
Direito de imagem – natureza
salarial.
O reclamado não juntou cópia do
contrato de licença de uso de imagem que teria firmado com o autor,
limitando-se a apresentar apenas o contrato especial de trabalho desportivo, em
desacordo com o art. 87-A da Lei nº 9.615/98. Diante dessa realidade, os
valores recebidos pelo autor a título de direito de imagem constituem
remuneração pelo trabalho prestado e, portanto, possuem natureza salarial.
Recurso provido, no particular.
Cláusula compensatória – base de
cálculo.
Reconhecida a natureza salarial
dos valores recebidos a título de direito de imagem, devem compor a base de
cálculo da cláusula compensatória, que, no caso, é de R$7.000,00, conforme
contrato de trabalho desportivo.
Verbas rescisórias – período de
apuração.
Para efeito de contagem dos
proporcionais de férias e 13º salário deve ser considerado todo o período de
vigência estipulado no contrato de trabalho firmado pelas partes, nos termos do
§9º do art. 28 da Lei nº 9615/98.
Multa do art. 467 da CLT – verbas
incontroversas
A tese do abandono de emprego
suscitada na defesa e, por consequência, tornou controverso o pedido dos
títulos rescisórios, inclusive o salarial, o que afasta a incidência da multa
do art. 467 da CLT, como decidido na origem.
Recurso do reclamado não provido
e do reclamante provido em parte.
I - Relatório
Trata-se de recursos ordinários
interposto por Carlos César dos Santos Filho e ABC Futebol Clube, buscando a
reforma da sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara do Trabalho de Natal, nos
autos da reclamação proposta pelo primeiro em desfavor do segundo recorrente.
O Juízo de origem julgou
procedente em parte a reclamação, confirmando a antecipação de tutela que
reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho, condenando o reclamado
a pagar ao reclamante os seguintes títulos: “13º salário; férias + 1/3; FGTS
não recolhido; indenização de 40% sobre os depósitos do FGTS; pagamento dos
meses de abril, maio e junho de 2012, incluídos os salários e os valores
relativos à cessão do direito de imagem; cláusula compensatória desportiva, no
importe de R$47.500,00 e multa do art. 477 da CLT, no valor de R$9.500,00.”
Determinou, ainda, a compensação de R$4.000,00 pagos a título de adiantamento
salarial. Custas de R$2.000,00. Retificação da CTPS do autor, para acrescer o
valor recebido a título de moradia (fls. 333/348).
Embargos de declaração
apresentados pelo reclamado e pelo reclamante (fls. 332/334 e 359/361,
respectivamente) parcialmente acolhidos para reconhecer como data da rescisão o
dia 04/07/2012 e para sanar a omissão da sentença, no sentido apreciar o
requerimento de condenação do reclamado em litigância de má fé e indeferi-lo,
mediante decisão de fls. 359/367.
Nas razões recursais, o
recorrente/reclamante alega que o Juízo de origem reconheceu a rescisão
indireta do contrato de trabalho, deferindo o pagamento dos salários entre a
rescisão e o termo final do contrato, mas considerou apenas o salário
registrado na CTPS sem acrescer o valor recebido a título de direito de imagem.
Assevera que o contrato de cessão de direito de imagem defendido pelo reclamado
não atendeu às exigências legais, constituindo-se, na verdade, em fraude ao
contrato de trabalho, de forma que toda a remuneração recebida nada mais é do
que contraprestação salarial. Defende que o valor a título de cláusula
compensatória deve considerar o valor registrado na CTPS, bem como o valor
recebido a título suposto direito de imagem. Alega que a rescisão antecipada do
contrato de trabalho, por descumprimento de cláusulas contratuais, implica nas
penalidades do art. 28, §9º, da Lei Pelé, de forma que os percentuais de
férias, 13º e FGTS devem considerar o termo final do pacto firmado entre as
partes e não apenas até o rompimento do contrato. Por fim, sustenta que o
próprio clube reconheceu o atraso no pagamento de salários, sendo devido,
portanto, a multa do art. 467 da CLT (fls. 372/387).
O reclamado/recorrente, em seu
recurso, alega que não houve motivo para a declaração da rescisão indireta do
contrato de trabalho, pois o pagamento dos salários, depósitos do FGTS e
contribuição previdenciária se encontrava em dia até a data do ajuizamento da
primeira reclamação (nº 63600-47.2012), que teve, posteriormente, pedido de
desistência por parte do autor. Argumenta que, na presente ação, o reclamante requereu
praticamente os mesmos pedidos, apresentando os mesmos argumentos para a
rescisão automática do contrato de trabalho, visando, em verdade, a sua
liberação para firmar contrato com novo clube. Acrescenta que, mesmo após a
desistência da primeira ação, o autor voltou a faltar aos treinamentos e
dificultar um entendimento com o clube, tendo sido demitido por justa causa,
por abandono de emprego, não justificando a condenação compensatória prevista
no art. 28, inciso II da Lei Pelé. Alega contra-senso o fato de o Juízo de
origem considerar indevida a verba referente ao contrato de cessão do direito
de imagem, por considerar sua natureza civil, no entanto, condenou o recorrente
ao pagamento dos salários de abril a junho/2012, com integração dos valores pagos
a título de direito de imagem. Alega ser indevida a multa rescisória, pois o
contrato de trabalho era por prazo determinado e o reclamante é quem deu causa
à rescisão. Por fim, alega ser inaplicável a multa do art. 475-J do CPC ao
processo do trabalho (fls. 431/438).
Contrarrazões apresentadas pelo
reclamante, sem preliminar (fls. 444/447).
Os autos não foram remetidos ao
Ministério Público do Trabalho.
II – Fundamentos do Voto
Conheço dos recursos ordinários,
porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade.
Recurso do reclamado
Rescisão indireta do contrato –
justa causa
Busca o recorrente a reforma da
sentença, para que seja afastado o reconhecimento da rescisão indireta do
contrato de trabalho e declarada à demissão por justa causa do reclamante, por
abandono de emprego.
Sem razão.
No recurso, nega o reclamado a
existência de motivo para a declaração da rescisão indireta do contrato de
trabalho, pois o pagamento dos salários, os depósitos do FGTS e o recolhimento
da contribuição previdenciária se encontravam em dia até a data do ajuizamento
da primeira reclamação (nº 63600-47.2012).
Acrescenta que, após a
desistência da primeira reclamação trabalhista por ele proposta, o autor voltou
a faltar aos treinamentos e dificultar o entendimento entre as partes, tendo
sido demitido por justa causa, por abandono de emprego.
À análise.
A demissão por justa causa é a
punição disciplinar administrativa máxima passível de ser aplicada pelo
empregador ao empregado, razão pela qual deve ser comprovada de forma robusta
nos autos, diante das conseqüências negativas que podem acarretar a sua vida
profissional do empregado, no caso, do atleta de futebol.
Alega o reclamado a ocorrência de
abandono de emprego a justificar a rescisão contratual, sob o argumento de que
a partir de abril/2012 o autor passou a faltar aos treinos, até que não mais
compareceu ao trabalho, razão pela qual foi publicado edital na imprensa
convocando-o a retornar ao trabalho, sem sucesso, de forma que, “não tendo,
porém, atendido aos chamados com aquele objetivo, o que caracterizou o
entendimento de abandono do emprego – mais de trinta (30) dias – e justificou a
demissão por justa causa, de acordo com o artigo 482, letra ‘i’ da CLT. Docs.
04 e 05” (fl. 200).
Inicialmente, deve ser ressaltado
que o reclamado sequer comprovou que efetivamente dispensou o reclamante, muito
menos por justa causa, pois não há nos autos documento que indique a rescisão
do contrato entre as partes ou de propositura de ação de consignação em
pagamento das verbas decorrentes da rescisão motivada.
Ademais, conforme bem observado
pelo Juízo de origem, se o autor abandonou o emprego em abril, por que somente
em junho, cerca de três meses após, o ABC passou a convocá-lo via edital?
Aliás, nas razões de recurso o recorrente sequer ataca este fundamento da
sentença para justificar sua tese de abandono de emprego.
Por outro aspecto, há prova -
documental e testemunhal - indicando que o reclamante jogou na condição de
suplente, nas últimas partidas do campeonato estadual, ocorridas nos dias
29/04/2012 e 06/05/2012 (fls. 296 e 298), tendo sido, inclusive, hostilizado
com ato racista praticado por torcedor adversário, no jogo do dia 29/04/2012, o
que enfraquece a tese da defesa (fl. 300), já que abandono não houve.
Com relação às ausências aos
treinos, que, segundo o recorrente, precedeu ao abandono, a testemunha
apresentada pela defesa apresentou alguns esclarecimentos, verbis:
“que o reclamante trabalhou até,
mais ou menos, o início de abril deste ano; que as finais do campeonato foram no
início de maio; que ele não participou desses jogos; que o reclamante treinou
até o início de abril, quando o superintendente do clube procurou alguns
atletas, com propostas; que alguns atletas que não estavam tendo rendimento,
foram chamados para serem feitas propostas financeiras; que o reclamante foi
chamado e não aceitou a proposta e a partir de abril, deixou de comparecer; que
acredita que houve um jogo, contra o América, num domingo, dia 29.04.2012, em
Goianinha; que não tem certeza se o reclamante participou desse jogo, no dia
24.04.2012; que soube que houve um ato de racismo, em um jogo em Goianinha. Mas
não sabe precisar se foi contra o reclamante; que o reclamante chegou a dizer
ao depoente que se a proposta do ABC para rescindir o contrato fosse boa, ele
aceitaria a proposta e sairia para outro clube, pois tinha interesse em jogar e
no ABC não estava jogando; que o reclamante não chegou a dizer ao depoente, mas
o depoente ouviu falar que ele comentou com outros atletas; que estava
insatisfeito com o clube e queria sair; que quando o reclamante começou a
faltar aos treinamentos, o Senhor Ricardo Morais, que estava junto com o
depoente, à frente do departamento de futebol, comunicou as faltas ao
departamento de futebol e ao departamento jurídico; que a única providência
tomada foi essa; que não chegaram a procurar falar diretamente com o
reclamante...” (destaquei - fl. 248)
De acordo com a testemunha,
Gerente de Futebol do clube, as faltas do atleta aos treinamentos foram
comunicadas aos departamentos de futebol e jurídico, mas não foi tomado nenhuma
medida disciplinar, sequer o jogador foi chamado para conversar sobre essas ausências,
implicando em perdão pelas supostas faltas.
Isso se explica pelo fato de o
clube haver perdido o interesse em alguns jogadores que, segundo a sua
avaliação, não estavam rendendo, dentre eles, o reclamante, levando o
superintendente a buscar a rescisão contratual com esses jogadores, conforme se
extrai do depoimento supra.
Aliás, deve ser ressaltado que a
permanência do reclamante até o término de seu contrato seria de enorme
prejuízo ao clube, pois, se não estava rendendo, como disse o Gerente de
Futebol, a situação se agravaria a partir de maio/2012, com majoração em seu
salário em R$10.000,00, previsto em seu contrato (fl. 49), com o início do
campeonato Brasileiro da Série ‘B’, que o ABC passaria a disputar.
Ora, não é crível que o jogador,
com contrato a perdurar até novembro/2012, percebendo salário de R$15.000,00
para jogar o Campeonato Estadual, que findou em início de maio, e que passaria
a receber salário de R$25.000,00 para jogar o Campeonato Brasileiro da Série
“B” a partir de maio, abandonasse o emprego, exatamente no momento em que teria
significativa majoração na sua remuneração.
Ao contrário, é seguramente
plausível o entendimento de que o Clube, que não tinha mais interesse no atleta
por não apresentar o rendimento esperado, buscar um acordo para a rescisão do
contrato entre as partes, como ficou evidente, ou mesmo tentasse encontrar os
meios necessários e legais para rescindir tal contrato e se eximir do prejuízo
que só se acumularia no curso normal do contrato, como já destacado acima.
A alegação de que o autor acertou
contratação com o Marília Atlético Clube e, portanto, abandonou o emprego junto
ao ABC, não se sustenta, porquanto o documento de fl. 250 confirma a
contratação do jogador a partir de 30/08/2012, após já ter sido rescindido o
contrato com o ABC, mediante decisão proferida de pedido de antecipação de
tutela deferida nestes autos, desde o dia 05/07/2012 (fls. 185/186).
O fato de o reclamante haver
firmado contrato com novo clube configura apenas o exercício do seu direito,
como jogador profissional de futebol, buscar novo emprego, principalmente
diante da situação concreta em que se encontrava.
Enfim, não há prova efetiva do
abandono de emprego a embasar a justa causa para a demissão, mas, ao contrário,
há prova de que o autor permaneceu à disposição do empregador, seja
participando de alguns jogos, seja realizando treinamento na academia, como
declarado pela testemunha que arrolou (fls. 248/249).
Neste sentido, reconhecendo o
reclamado que o último pagamento de salário que efetuou para o jogador foi em
março/2012 (fl. 200), na data em que foi prolatada a decisão interlocutória que
deferiu o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho (05/07/2012) o
autor se encontrava a mais de três meses sem receber salário, incorrendo o
recorrente em mora, estando sujeito às conseqüências do art. 31 da Lei nº
9.615/98, que regula o desporto, cuja redação é a seguinte:
“Art. 31. A entidade de prática
desportiva empregadora que estiver com pagamento de salário de atleta
profissional em atraso, no todo ou em parte, por período igual ou superior a 3
(três) meses, terá o contrato especial de trabalho desportivo daquele atleta
rescindido, ficando o atleta livre para se transferir para qualquer outra
entidade de prática desportiva de mesma modalidade, nacional ou internacional,
e exigir a cláusula compensatória desportiva e os haveres devidos.
§ 1o São entendidos como salário,
para efeitos do previsto no caput, o abono de férias, o décimo terceiro
salário, as gratificações, os prêmios e demais verbas inclusas no contrato de
trabalho.
§ 2o A mora contumaz será
considerada também pelo não recolhimento do FGTS e das contribuições
previdenciárias.”
Desta forma, mantém-se a
sentença, quanto a este ponto.
Assim, perde força o argumento de
que a rescisão do contrato de trabalho ocorreu por culpa do autor, e se
justifica a condenação do recorrente ao pagamento de valor a título de cláusula
compensatória prevista no art. 28, da Lei Pelé, pois, tendo sido reconhecida a
rescisão indireta do contrato de trabalho é devida a referida multa, exatamente
nos termos do citado artigo, cujo teor é o seguinte:
“Art. 28. A atividade do atleta
profissional é caracterizada por remuneração pactuada em contrato especial de
trabalho desportivo, firmado com entidade de prática desportiva, no qual deverá
constar, obrigatoriamente:
(...)
II - cláusula compensatória
desportiva, devida pela entidade de prática desportiva ao atleta, nas hipóteses
dos incisos III a V do § 5o.
(...)
§ 5º O vínculo desportivo do
atleta com a entidade de prática desportiva contratante constitui-se com o
registro do contrato especial de trabalho desportivo na entidade de
administração do desporto, tendo natureza acessória ao respectivo vínculo
empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais:
I - com o término da vigência do
contrato ou o seu distrato;
II - com o pagamento da cláusula
indenizatória desportiva ou da cláusula compensatória desportiva;
III - com a rescisão decorrente
do inadimplemento salarial, de responsabilidade da entidade de prática
desportiva empregadora, nos termos desta Lei;
IV - com a rescisão indireta, nas
demais hipóteses previstas na legislação trabalhista; e
V - com a dispensa imotivada do
atleta”
Portanto, correta a decisão,
quanto a este aspecto.
Multa do art. 477, §8°, da CLT.
O recorrente sustenta que a multa
rescisória do art. 477, § 8º, da CLT é indevida, por se tratar de contrato por
prazo determinado, cuja rescisão foi causada pelo autor.
Como já analisado anteriormente,
o reclamante não deu causa à rescisão do contrato, o que dispensa o acréscimo
de novos fundamentos.
Quanto ao segundo aspecto, ocorre
que o § 6º do art. 477 da CLT não restringe a aplicação a qualquer espécie de
contrato, alcançando genericamente o pagamento das verbas rescisórias, nos
prazos ali especificados.
Nesse sentido, seguem os julgados
do c. TST:
RECURSO DE REVISTA. MULTA DO
ARTIGO 477 DA CLT. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. PERTINÊNCIA.
O artigo 477, § 6º, da CLT, ao se
reportar à multa pelo atraso na quitação das verbas rescisórias, não faz
nenhuma distinção quanto à modalidade de contratação, se por prazo determinado
ou indeterminado. Inexistência de violação do artigo 477, § 8º, da CLT. Recurso
de revista não conhecido.
(160300-50.2002.5.01.0021,
Relator: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 26/03/2008, 8ª Turma, Data de
Publicação: DJ 28/03/2008).
RECURSO DE REVISTA. PRAZO. MULTA
DO ART. 477, § 8.º, DA CLT. RESCISÃO ANTECIPADA DO CONTRATO DE EXPERIÊNCIA.
PRAZO PARA PAGAMENTO DAS VERBAS. ARTIGO 477, § 6.º, DA CLT. PROVIMENTO.
O artigo 477, § 6.º, da CLT
dispõe de dois prazos para o pagamento das parcelas contidas no instrumento de
rescisão ou recibo de quitação, a saber: a) o primeiro estende-se - até o
primeiro dia útil imediato ao término do contrato -; b) o segundo segue - até o
décimo dia, contado da data da notificação da demissão, quando da ausência do
aviso-prévio, indenização do mesmo ou dispensa de seu cumprimento -.
Cuidando-se de contrato por prazo determinado, que se extinga em seu termo
final preestabelecido, aplica-se o primeiro prazo. O curto lapso para pagamento
das parcelas referidas no instrumento rescisório (primeiro dia útil imediato)
justifica-se, uma vez que as partes já sabem, desde o início do pacto, o dia
certo do término contratual. No entanto, terminando antecipadamente o contrato
a termo, aplica-se o prazo mais amplo, tendo em vista que a previsão antes
existente quanto à data de encerramento do contrato não se concretizou. Logo,
observando o conjunto fático-probatório expresso no acórdão recorrido, se o
pagamento foi realizado dentro do prazo de 10 dias não é devida a multa do art.
477, § 8.º, da CLT. Recurso de Revista parcialmente conhecido e provido.
(264600-83.2005.5.15.0113,
Relator: Maria de Assis Calsing, Data de Julgamento: 26/10/2011, 4ª Turma, Data
de Publicação: DEJT 04/11/2011).
Logo, conclui-se que a multa do
art. 477, § 8º, da CLT é aplicável aos contratos por prazo determinado, cuja
rescisão ocorreu antes da data prevista.
Nessa esteira, considerando que
as verbas definidas na sentença não foram pagas no prazo legalmente
estabelecido, é cabível a aplicação da multa em questão, como decidido na
origem. Assim, mantém-se a sentença.
Multa do art. 475-J do CPC
O recorrente defende a
inaplicabilidade do art. 475-J do CPC ao Processo do Trabalho.
A multa prevista no art. 475-J do
CPC não encontra correspondência em nenhum dos artigos da CLT, e visa punir o
litigante judicial, sucumbente na ação, que deixar de adimplir voluntariamente
a obrigação de pagar (dinheiro) no prazo de 15 dias, expressamente cominado na
sentença transitada em julgado. Noutras palavras, trata-se, sim, de punição
para o devedor contumaz que não cumpre decisão judicial.
O artigo 880 da CLT, por sua vez,
indica quais os procedimentos que deverão ser adotados em caso de o devedor não
adimplir voluntariamente a obrigação, inclusive quanto à multa do art. 475-J do
CPC, ou seja, esses dispositivos legais regulam matérias totalmente distintas
entre si, daí o manifesto equívoco do recurso, no particular.
Por outro aspecto, essa multa de
10% do valor da condenação tem por finalidade estimular o devedor em quitar a
dívida, voluntariamente, o que imprimirá rapidez na prestação jurisdicional e,
com isso, atendido estará o preceito constitucional inserido no art. 5º, inciso
LXXVIII, da Constituição Federal, que dispõe: “a todos, no âmbito judicial e
administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade da sua tramitação”.
Além disso, este dispositivo se
coaduna com o princípio da proteção ao trabalhador e por isso deve ser também
aplicado às situações nas quais são discutidas verbas de natureza alimentar,
como no caso presente, em que a mora por si só pode representar dano
irreparável à subsistência da reclamante e de sua família.
Logo, o fato de a CLT regular o
processo de execução não obsta a aplicação da multa instituída pelo art. 475-J
do CPC.
Direito de imagem
Com relação ao argumento de que
há contra-senso no fato de o Juízo de origem considerar indevida a verba
referente ao contrato de cessão do direito de imagem, por considerar sua
natureza civil, no entanto, condenou o recorrente no pagamento dos salários de
abril a junho/2012, com integração dos valores pagos a título de direito de
imagem, a questão será abordada no recurso do reclamante.
Recurso do reclamante
Direito de imagem – natureza
Nas razões recursais, o
reclamante alega que o Juízo de origem reconheceu a rescisão indireta do
contrato de trabalho, deferindo verbas decorrentes desta rescisão, no entanto,
considerou apenas o salário registrado na CTPS para fins de cálculo dos
salários devidos sem acrescer o valor recebido a título de direito de imagem.
Assevera que o contrato de cessão
de direito de imagem defendido pelo reclamado não atendeu às exigências legais,
constituindo-se, na verdade, em fraude ao contrato de trabalho, de forma que
toda a remuneração recebida nada mais é do que contraprestação salarial, e os
valores recebidos a título de direito de imagem possuem natureza salarial.
À análise.
Extraem-se dos autos, que as
partes firmaram contrato de trabalho a ser cumprido no prazo de 02/01/2012 a
30/11/2012, estabelecendo-se o pagamento de R$8.000,00 reais na forma de
salário, R$7.000,00 pelo direito de imagem e mais R$1.500,00 a título de auxílio
moradia (fl. 49). Esses valores foram contratados para a participação do autor
nos jogos do Campeonato Estadual, pois a partir do início do Campeonato
Brasileiro da Série ‘B’, haveria majoração do valor fixado a título de direito
de imagem para R$10.000,00.
A priori, a cessão do direito de
imagem se faz mediante contrato de natureza civil, em que o atleta concede ao
clube o direito à utilização de sua imagem, a ser veiculada nos meios de
comunicação, por intermédio de campanhas publicitárias, e o valor pago sob esse
título não possui natureza salarial, não refletindo nas demais verbas
trabalhistas.
Difere do direito de arena,
tratado no art.42 da Lei nº 9.615/98, pago em parcela variável, da seguinte
forma: “vinte por cento do preço total da autorização, como mínimo, será
distribuído, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes, do
espetáculo ou evento” que tem natureza salarial, e é devido, em razão da
veiculação dos espetáculos ou eventos esportivos em que o clube participa.
Difere também do contrato de
trabalho, que é disciplinado pela legislação trabalhista, ao passo que o
contrato de cessão do direito de imagem, de cunho personalíssimo, tem natureza
civil, cujo objeto é a limitação da exploração da imagem do atleta.
No caso, o reclamado juntou aos
autos apenas o contrato especial de trabalho desportivo com o atleta, como se
observa às fls. 213/214, mas não o contrato de licença de uso de imagem. O
reclamante trouxe aos autos um pré-contrato, estabelecendo somente valores a
serem pagos a título de salário e de direito de imagem, sem consignar demais
cláusulas acerca dos direitos e obrigações das partes (fl. 49).
Diferente do contrato de
trabalho, o contrato de cessão do direito de imagem deve ser formalizado por
escrito, contendo os direitos, deveres e condições inconfundíveis com as do
contrato de trabalho, por força expressa do art. 87-A da Lei nº 9.615/98,
verbis:
“O direito ao uso da imagem do
atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste contratual de
natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis
com o contrato especial de trabalho desportivo.”
Portanto, os contratos de licença
de Ademais, não há prova, ou sequer alegação do clube, de que tenha havido a
utilização ou comercialização da imagem do jogador, veiculada em campanhas
publicitárias de forma a justificar o pagamento mensal de quase o dobro do
salário do jogador (R$7.000,00), se se considerar apenas o Campeonato Estadual.
Em verdade, o que se verifica na
prática, são os clubes de futebol, com o intuito de se eximirem das obrigações
sociais e tributárias, utilizam-se do expediente da elaboração de contratos
paralelos (de trabalho e de cessão do uso de imagem), o que justifica tamanha
disparidade entre os valores registrados na CTPS e os valores pagos a título de
direito de imagem que, no caso dos autos, considerando o Campeonato Estadual,
corresponde o direito de imagem a 87,50% do salário e, no caso do Campeonato
Brasileiro Série da “B”, corresponde a 212,50%.
O uso de imagem neste formato são
utilizados para mascarar a remuneração dos atletas, o que é defeso por lei,
devendo ser considerado nulo (art. 9º, CLT).
A jurisprudência do TST vem
adotando ente posicionamento, de reconhecer a natureza salarial da verba
recebida a título de direito de imagem, em razão do intuito fraudulento da
contratação, por alguns clubes de futebol.
“ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL -
CONTRATO DE LICENÇA DO USO DE IMAGEM - FRAUDE - NATUREZA SALARIAL DA VERBA
RECEBIDA A TÍTULO DE – DIREITO DE IMAGEM -. O quadro fático descrito pelo
Tribunal Regional revela o intuito fraudulento na celebração do contrato de
licença do uso de imagem, razão pela qual decidiu bem a egrégia Corte Regional
ao conferir natureza salarial à parcela percebida pelo reclamante a título de direito
de imagem. Logo, para se chegar a conclusão diversa, necessário seria o
revolvimento de fatos e provas, procedimento vedado nesta esfera
extraordinária, nos termos da Súmula nº 126 do TST, o que impede falar em
violação do artigo 28, § 7º, da Lei nº 9.615/98. Agravo de instrumento não
provido.” (Processo: AIRR - 800-86.2009.5.01.0025 Data de Julgamento:
24/10/2012, Relatora Desembargadora Convocada: Maria das Graças Silvany Dourado
Laranjeira, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 23/11/2012.) - destaquei
Em alguns julgados, o TST foi
além no sentido de considerar a natureza salarial de tal verba,
independentemente do caráter fraudador do contrato do uso de imagem, por
considerar que a renda auferida pelo uso de imagem constitui uma das formas de
remunerar o jogador, verbis:
“RECURSO DE REVISTA - DIREITO DE
IMAGEM - NATUREZA JURÍDICA - INTEGRAÇÃO À REMUNERAÇÃO. A renda auferida pelo
atleta profissional de futebol pelo uso de sua imagem por parte do clube que o
emprega possui natureza salarial e deve ser integrada à sua remuneração para
todos os fins. Isso porque constitui uma das formas de remunerar o jogador pela
participação nos eventos desportivos disputados pela referida entidade,
decorrendo, pois, do trabalho desenvolvido pelo empregado. Precedentes deste
Tribunal. (RR - 60800-81.2007.5.04.0011 Data de Julgamento: 04/05/2011, Relator
Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 1ª Turma, Data de Publicação:
DEJT 13/05/2011).” (g.n.) – destaquei.
Dessa forma, deve ser reconhecida
a natureza salarial da parcela mensal paga a título de “contrato de Direito de
Cessão de Imagem”, ao contrário do decidido na origem. Por conseguinte, não
prospera a insurgência patronal, no particular.
Cláusula compensatória
O recorrente defende que o valor
do salário a ser recebido a título de cláusula compensatória deve considerar o
valor registrado na CTPS, bem como o valor recebido a título do suposto direito
de imagem.
Com razão.
O Juízo de origem deferiu a
cláusula compensatória, considerando apenas o salário registrado na CTPS e o
valor pago a título de auxílio moradia, verbis:
“Quanto à cláusula compensatória
desportiva, as partes não pactuaram um valor, conforme lhes faculta o § 3º do
artigo 28 da Lei 9.615/98, tendo sido estabelecido apenas o montante da
cláusula indenizatória desportiva no contrato de fl. 50. O dispositivo citado
prevê, como limite mínimo, o valor total dos salários mensais a que teria
direito o atleta até o término do contrato de trabalho. Alei claramente se
refere aos salários, parcela de natureza trabalhista, o que exclui do cômputo
da cláusula compensatória desportiva os valores recebidos a título de cessão de
direito de imagem, porquanto o atleta não está mais vinculado à entidade
desportiva que o contratou, já podendo ter sua imagem ligada à (sic) outro
clube.
Assim, considerando que o salário
do reclamante correspondia a R$9.500,00 mensais, computado o auxílio para
moradia, fixo a cláusula compensatória desportiva, para o período de julho/12 a
novembro/12, no valor de R$47.500,00.” (fl. 344)
Ora, tendo sido reconhecida a
natureza salarial do valor recebido a título de direito de imagem, deve este
compor a base de cálculo também da cláusula compensatória.
No caso, segundo o estipulado no
contrato de fl. 49, o reclamante receberia R$15.000,00 por mês, sendo
R$8.000,00 registrados na CTPS e R$7.000,00 a título de direito de imagem, para
jogar no Campeonato Estadual previsto para o período de janeiro a abril de
2012.
Para o Campeonato Brasileiro da
Série ‘B’ (de maio a novembro/2012), a remuneração seria reajustada para
R$25.000,00, ou seja, o salário permanecia no valor de R$8.000,00 registrados
na CTPS, mas a verba destinada à remunerar o direito de imagem passaria para
R$17.000,00 mensais.
Entretanto, considerando que o
reclamante participou apenas do Campeonato Estadual, que findou em maio/2012 e,
embora ainda estivesse à disposição do reclamado quando iniciado o Campeonato
Brasileiro da Série ‘B’ (maio/2012), pois teve sua rescisão indireta do
contrato de trabalho efetivada em 05/07/2012 (fls. 185/186), o fato é que não
participou deste último, conforme já exaustivamente analisado, de forma que o
valor recebido a título de direito de imagem, para efeito do cálculo da multa
convencional, deve ser considerado apenas o referente ao Campeonato Estadual
que, no caso, é de R$7.000,00.
Verbas rescisórias
Alega que a rescisão antecipada
do contrato de trabalho, por descumprimento de cláusulas contratuais, implica
nas penalidades do art. 28, §9º da Lei Pelé, de forma que os percentuais de
férias, 13º e FGTS devem considerar o termo final do pacto firmado entre as
partes e não apenas até o rompimento do contrato.
Com razão, em parte.
O § 9º do art. 28 da Lei 9.615/98
apresenta a seguinte redação:
“Quando o contrato especial de
trabalho desportivo for por prazo inferior a 12 (doze) meses, o atleta
profissional terá direito, por ocasião da rescisão contratual por culpa da
entidade de prática desportiva empregadora, a tantos doze avos da remuneração
mensal quantos forem os meses da vigência do contrato, referentes a férias,
abono de férias e 13o (décimo terceiro) salário”
Para efeito de contagem dos
proporcionais de férias e 13º salário, deve ser considerado todo o período
contratado pelas partes, desconsiderando como limite a data em que houve
rescisão antecipada, como entendeu o Juízo de origem, na decisão dos embargos
de declaração (termo inicial e rescisão antecipada do contrato).
Este entendimento, aliás, já foi
previsto no mesmo art.28, quando tratou da cláusula compensatória, em que, em
seu § 3º estabelece que:
“O valor da cláusula
compensatória desportiva a que se refere o inciso II do caput deste artigo será
livremente pactuado entre as partes e formalizado no contrato especial de
trabalho desportivo, observando-se, como limite máximo, 400 (quatrocentas)
vezes o valor do salário mensal no momento da rescisão e, como limite mínimo, o
valor total de salários mensais a que teria direito o atleta até o término do
referido contrato.” (destaquei)
Portanto, de acordo com o comando
do artigo, deve ser considerado para efeito de 13º salário proporcional e
férias proporcionais o tempo de vigência do pacto, ou seja, de 02/01/12 a
30/11/12, tendo como base de cálculo, além do salário registrado na CTPS
(R$8.000,00) e auxílio moradia (R$1.500,00) já deferido na decisão, também o
valor do salário pago a título de cessão do direito de imagem (R$7.000,00).
Com relação ao FGTS, não há
previsão legal, neste sentido, devendo ser mantida a sentença, neste ponto.
Multa do art. 467 da CLT
Por fim, sustenta que o próprio
clube reconheceu o atraso no pagamento de salários, sendo devido, portanto, a
multa do art. 467 da CLT.
Sem razão.
A tese do abandono de emprego e,
por conseqüência, o não pagamento do salário, tornou controverso os títulos
rescisórias, devendo ser mantida a sentença, quanto a este aspecto.
III - Dispositivo
Ante o exposto, conheço dos
recursos ordinários e, no mérito, nego provimento ao recurso do reclamado e dou
provimento parcial ao recurso do reclamante para acrescer à base de cálculo da
cláusula compensatória o valor de R$7.000,00, recebido a título de direito de
imagem, bem como considerar os proporcionais de 13º salário e férias + 1/3 o
período de vigência do pacto de 02/01/12 a 30/11/12. Custas acrescidas de
R$400,00, calculadas sobre R$20.000,00.
Desembargador José Barbosa Filho
Relator
Acordam os Desembargadores
Federais e a Juíza da 1ª Turma de Julgamentos do Tribunal Regional do Trabalho
da 21ª Região, por unanimidade, determinar a correção de erro material na
Certidão de Julgamento de fls. 454, para fazer constar a seguinte decisão:
"por unanimidade, conhecer dos recursos ordinários. Mérito: por maioria,
negar provimento ao recurso do reclamado; vencidos o Desembargador Carlos
Newton Pinto, que lhe dava provimento parcial para afastar a natureza salarial
do direito de imagem ao reclamante. Por maioria, dar provimento parcial ao
recurso do reclamante para acrescer à base de cálculo da cláusula compensatória
o valor de R$ 7.000,00, recebido a título de direito de imagem, bem como
considerar os proporcionais de 13º salário e férias + 1/3 o período de vigência
do pacto de 02/01/12 a 30/11/12; vencido o Desembargador Carlos Newton Pinto,
que, apenas, considerava os proporcionais de 13º salário e férias + 1/3 o
período de vigência do pacto de 02/01/12 a 30/11/12. Custas acrescidas de R$
400,00, calculadas sobre R$ 20.000,00."
Natal, 25 de junho de 2013.
Desembargador José Barbosa Filho
Relator
Divulgado no DEJT nº 1255, em
27/06/2013 (quinta-feira) e Publicado em 28/06/2013 (sexta-feira). Traslado nº
00639/2013.
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