Gol contra
Por Mariana Vieira*
É interessante ouvir homens
falando sobre agressores.
Hoje ouvi no rádio um
comentarista esportivo falando sobre o novo contratado do ABC - Wesley Pionteck
- que foi condenado, em 2019, a um ano e quatro meses por lesão corporal depois
de agredir a ex-namorada.
Dizia o comentarista com muita
convicção “Daqui a pouco todo mundo esquece isso. Basta mostrar jogo que
essa pequena minoria da torcida barulhenta esquece o que ele fez”.
É com essa mesma linha de
pensamento que agressores de mulheres se “mascaram” muito bem - e com
segurança - por trás de títulos, fama ou de ocupações de destaque na sociedade.
Acho que o Wesley tem direito a
um recomeço.
Pagou o que devia a justiça.
À justiça, que fique claro.
Como ficou o psicológico da
mulher e até mesmo o do Wesley, não sabemos.
Mas o limite entre a civilidade e
a barbárie é a justiça quem decide.
E é ela quem define o tempo de dele
voltar a fazer parte da sociedade com seus direitos e deveres restabelecidos e
garantidos.
Ok, Wesley, sobre você não tenho
o que falar.
Vá em frente e mostre o seu
trabalho.
Só acho que poderia ser em outro
clube, por isso meu questionamento é para o ABC.
As campanhas de incentivo a nos
sentirmos à vontade e seguras de irmos ao estádio e o lançamento da camisa roxa
contra a violência doméstica foi colocada no saco?
Essa camisa não foi vestida na
real por vocês?
Era só uma camisa de modinha, uma
edição especial que entrou em liquidação?
O ABC, fez as contas, concluiu
que estava marcando um golaço, confundiu os lados do campo e não percebeu que
foi um gol contra.
Vamos então fazer um comparativo
sobre o comentário feito na rádio…
Por que as mulheres não se sentem
encorajadas a denunciar seus agressores, ou, o que é mais triste, muitas delas
não tem nem consciência de que são “rebaixadas” diariamente pelos
companheiros?
Porque o agressor normalmente é
perdoado facilmente pelo seus “parças”.
Isso quando não são enaltecidos
por eles com frases do tipo “É! mostre quem manda” ou “Isso mesmo…
Tem que defender sua honra.”
E se esse indivíduo ostentar
algum destaque profissional ou um título importante então…
A palavra da mulher agredida será
questionada, duvidada, relativizada, desqualificada.
O caráter dela será colocado em
questão ou suposições de atitudes que ela teve levará a pensamentos ou até a
expressão do tipo “Ah! Ela fez por merecer”.
Enquanto a mulher fica sendo
apontada diariamente como aquela que expôs o “parceiro”, a família, a
relação e muitas vezes não recebem o apoio nem das outras com quem convive.
E mais uma vez.
Para reforçar mesmo…
Se o homem tiver um título importante
ou uma profissão considerada relevante, que atribui respeito?
E se ele for “endeusado”
tipo um João de Deus, tipo um médico, um pastor, um padre, um professor…
Aí é que a voz dessa mulher
dificilmente será ouvida e considerada.
Afinal, a gente aprende desde
criança que bonito é mulher comportada, que fala pouco e baixo, que não tem
opinião, que não se mete em conversa de homem, que se veste de maneira tal, que
é discreta.
Essa é uma lady, né?
Olho roxo dá para esconder.
Quem liga para os nossos corpos
se eles estiverem bem maquiados?
Mulheres maquiadas e homens
mascarados.
E assim seguimos.
Seguimos?
Quase vivas ou…mortas.
*Mariana Vieira/@marivieirafm_
Jornalista/Radialista
Estudante de psicologia
Um comentário:
Se o cara já "pagou" a pena, condenação ou corretivo legal tem direito de trabalhar em qualquer lugar. E que não repita a situação. Quanto ao reporter: não soube fazer a avaliação diante do caso específico. Para o clube e o atleta. Agora querer proibir o clube de contratar se trata de uma aberração dos paladinos e paladinos de plantão.
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