Hoje vou pedir desculpas aos meus leitores, aos meus amigos e aos que por aqui passam sem o compromisso de voltar...
Essas linhas não são sobre futebol e nem tão pouco sobre nenhum assunto de interesse geral...
Hoje escrevo para mim mesmo.
Há quatros anos, conversava com meu filho Alexandre e com um amigo dele, o Fernando, que, aliás, acabei “adotando” com um filho – engraçado, alguns amigos de meu filho, acabaram se tornado, “filhos” também –, falávamos sobre cães...
Num determinado momento, comecei a divagar sobre o Basset Hound, um cão de pequeno, orelhudo e de olhar melancólico...
Depois de alguns momentos afirmei que gostaria muito de ter um, pois acreditava como ainda acredito que nos daríamos bem.
Encerrei a conversa dizendo: “seria bom ter um companheiro melancólico para sentar comigo na varanda nas madrugadas chuvosas”.
Os dois riram e fomos cada um para seu canto.
Dias depois, Fernando me chamou e disse ter um amigo que tinha um Basset Hound para doar, pois a família não tinha tempo para cuidar do animal como devia.
Pensei: “um melancólico e rejeitado, esse é o cara certo”!
Sem pestanejar disse: “vá busca-lo, traga-o para cá, eu o quero”!
Fernando e Alexandre saíram em disparada e momentos depois, chegavam com o “sujeitinho”...
Tinha cerca de uns seis meses, creio eu...
Pequenino, marrom, comprido e cheio de vida e energia, mas...
Não era um Basset Hound!
Era um Dachshund – aquele cãozinho que ficou famoso nos comerciais dos amortecedores COFAP e que as pessoas costumam chamar de “salsicha”!
Olhei para os dois com cara de reprovação e eles, perceberam minha decepção, mas insistiram dizendo:
- “Ele não é bonitinho”?
Era sim!
Pensei com meus botões: “duas rejeições numa vida só é um golpe duro até para um cãozinho”.
E ele ficou.
Seu nome?
Bill...
Isso, já veio “batizado”.
Pois bem, o “carinha” era mesmo um cãozinho.
Cheio de energia conseguia mesmo sem ser grande, preencher todos os espaços.
Usou o terreno da casa onde moro como ninguém, fez desse terreno seu território e nele reinou.
Foi meu “amigo” e meu “confidente”...
Adorava ser acariciado e deitava para ser empurrado com pés pelo chão, mas odiava ser carregado no colo, abraçado e apertado – rosnava e deixava claro que para ele, carinho era uma coisa e “frescura” outra.
Bill não era meu, eu era dele!
Quando levava sua comida, não podia me afastar, caso o fizesse ele imediatamente parava de comer e só voltava ao “prato” quando eu voltasse a me postar a seu lado; fosse em pé ou sentado.
Gostava de dormir com a cabeça recostada nos meus pés e ficava irritado quando ao mexer os pés, o acordava.
Poderia contar muitas coisas sobre esse nobre camarada, poderia falar horas e horas das nossas corridas pelo jardim, dos chutes que ele me obrigava a dar numa bolinha que recebeu de presente do Vítor, filho de Marisa e Cleto.
Poderia tentar descrever a hilária cena por ele protagonizada, quando Alexandre ia treinar boxe na varanda e ele, pegava uma pedrinha e ficava com as patas tentando reproduzir o que Alexandre fazia com saco de areia.
Poderia contar que foi o único cão que vi correr atrás de um limão, antes de mordê-lo e "chupá-lo" sem a menor careta ou repulsa...
Poderia falar de como ele adorava acerola, manga, goiaba, pitanga e qualquer fruta que estivesse ao seu alcance.
Poderia falar de como ele ficava deprimido quando a chuva caia, pois ficava impedido de ir para o portão, ladrar, rosnar e brincar com as crianças da vizinhança, que do lado de fora lhe faziam gracinhas e carinho.
Mas infelizmente, hoje, só posso falar da minha dor, da minha tristeza e da minha amargura.
Meu amigo ficou doente repentinamente, nada físico, nada que pudesse ser detectado ao olhar...
Levei-o ao veterinário e por mais de vinte dias, ficou internado...
Tudo foi feito, ele foi vasculhado de ponta a ponta, de fora para dentro e de dentro para fora, nenhum esforço ou dinheiro foi poupado...
Nada foi possível fazer.
Bill mudou...
Ficou agressivo, feroz e intratável...
Atacava a todos...
Mas uma coisa me chocou...
Quando eu me aproximava dele, ele ficava confuso...
Abanava a cauda, mas agredia, rosnava e tentava morder.
Tentei com proteção especial segurá-lo...
Impossível!
Ao mesmo tempo, que mordia e agredia, abanava a cauda...
O tempo passou e ele foi ficando pior.
Ontem, fui conversar com o Dr. Arnaldo e ficamos um bom tempo fazendo rodeios, sabíamos onde iríamos chegar, mas tentamos fugir.
Bill havia conquistado o coração do veterinário, assim como conquistou o coração de todos na clínica.
No fim, o Dr. Arnaldo me disse: “não há cura, não posso fazer mais nada e me sinto frustrado e impotente”...
Senti emoção em suas palavras...
Depois de algum silencio, ele falou: “a decisão é sua”.
Pedi para ver o Bill e quando cheguei ao canil, os dois rapazes que cuidaram dele estavam calados.
Bill estava deitado acuado num canto...
Seu olhar estava perdido e ele só rosnava.
Chorei, mas não o fiz só; os rapazes do canil tinham lágrimas nos olhos.
Voltei para o consultório e fiz o que tinha que ser feito...
Assinei a ordem para que Bill fosse sacrificado.
Ao sair da clínica, me deparei com um final de dia lindo e me senti só, perdido, confuso e sem rumo...
Caminhei por toda a Avenida Engenheiro Roberto Freire até minha casa na Vila de Ponta Negra...
Ao chegar, o jardim era o mesmo, mas jamais será como antes...
Eu era o mesmo, mas jamais serei igual, pois ontem, assinei a sentença de morte de um amigo e isso nunca mais conseguirei esquecer.
Bill, não era um cão, não para mim!
Bill era um companheiro e um amigo...
Desculpem o desabafo...
Ontem “brinquei” de ser Deus e confesso, não sirvo para tão alto posto!