Ao me propor escrever sobre história do futebol e de seus personagens, não tinha idéia de por onde começar queria fugir do lugar comum, queria evitar a mesmice e dar um novo enfoque ao tema. Seria fácil escolher alguém conhecido e repetir os mesmos elogios, falar das grandes partidas e dos momentos inesquecíveis... Uma mudança aqui e outra acolá, daria uma cara nova e transformaria em novidade um assunto velho e batido. Então resolvi buscar algo novo, algo que fosse além, algo que contivesse mais que passes brilhantes, gols fantásticos e dribles impressionantes.
Encontrei Walter Tull.
Neto de escravo, filho de um imigrante das Ilhas Barbados e uma jovem inglesa de Folkestone, Walter Tull foi o homem que derrotou por duas vezes o preconceito e a intolerância. Venceu uma infância trágica e se foi ainda jovem, num tempo em que a morte colhia sorridente nos campos da Europa meninos, rapazes e homens.
Nascido em 1888, Walter foi o sétimo e último filho dos Tull, sua mãe morreu logo após o parto e seu pai desgostoso e infeliz, faleceu dois anos depois. A família de sua mãe sem posses para cuidar da prole, entregou Walter e seu irmão mais velho Edward aos cuidados do Orfanato Metodista em Bethnal Green, Londres.
Ambos permaneceram no estabelecimento até completarem a maior idade, Edward tornou-se um bem sucedido dentista em Glasgow na Escócia, enquanto Walter permaneceu em Londres, vivendo de pequenos serviços e de sua habilidade como jogador de futebol. Ainda garoto foi convidado a participar do time do Clapton, equipe amadora que disputava as ligas menores da Associação Inglesa de Futebol, porém sua maneira de jogar, seu estilo técnico e sua garra, logo chamaram a atenção dos treinadores do Tottenham Hotspur.
Em 1908, Walter assinou contrato profissional com os Spurs e ao lado do goleiro Arthur Walton do Preston North End tornaram-se os primeiros negros profissionais no futebol inglês. Fez parte da delegação do Tottenham em uma excursão à Argentina e Uruguai e a cada jogo sua fama crescia e seu futebol brilhava. Mas um negro, vestindo a camisa de um grande de Londres e ainda tendo a ousadia de desmoralizar defesas e estraçalhar adversários, não poderia ficar impune, na puritana e conservadora Inglaterra de então.
Em uma partida contra o Bristol Rovers, Walter foi covardemente caçado, sob os olhos complacentes do árbitro, após marcar 4 dos 5 gols na goleada sobre o Rovers. Ao final, Walter saiu gravemente contundido e permaneceu inativo por um longo período, e ao retornar, o treinador o colocou entre os reservas, dando-lhe poucas chances de voltar a jogar. Em 1910 Walter deixa o Tottenham, ali parecia estar encerrada a carreira do negro hábil, forte e marcador de gols. Durante um ano Walter permaneceu parado, até que Herbert Chapman lendário treinador inglês, o convidou para se unir ao time do Northampton Town e disputar a Southern Liga.
Foram 110 partidas pelo novo clube, o estilo permanecia o mesmo, Walter ainda continuava a humilhar defensores e derrotar os fortes esquadrões do reino. Chega o ano de 1914, o Rangers de Glasgow forma um grande time e vai buscar no Northampton seu principal reforço. Mas a Europa já não era a mesma, o império Austro-Húngaro invade a Sérvia e a Alemanha sua aliada marcha sobre a França, termina assim o sonho do Rangers, de Walter e de milhares de jovens futebolistas em todo o continente europeu... A primeira Grande Guerra chega à ilha de sua majestade e Walter se alista no 17º Regimento de Middlesex, é incorporado como sargento ao 23º Batalhão, que ficaria famoso por ser o “batalhão dos futebolistas” dado ao grande número de jogadores de futebol em suas fileiras. Walter participa da primeira batalha do Somme em território Frances e da frente italiana. O craque da bola, também se mostra um grande soldado, faz história entre seus companheiros, ganha o respeito de seus superiores e retorna de licença a pátria como herói.
Em Londres seu amor pelo futebol é mais forte, e ele enverga a camisa do Fulham na temporada de 1915, com o mesmo sucesso, com a mesma habilidade e com o mesmo faro de gols. Em 1818 é reconvocado e devolvido aos campos de batalha e é nesse momento que Walter conquista sua maior vitória. Volta à guerra como o primeiro oficial negro da história do exército da Grã Bretanha, mas não foi uma vitória fácil, os manuais militares ingleses de 1914, eram específicos: “Nenhum homem negro poderia comandar brancos”.
Walter mais uma vez era o centro das atenções, os oficiais conservadores, lutaram contra a sua nomeação, mas os oficiais que o comandaram não abriram mão, mantiveram a indicação de Walter e foram até as últimas instâncias para verem concretizado o que eles chamavam de “justa promoção”. Ao final dessa curta, mas renhida batalha o Supremo Comando das Forças Armadas Inglesas, apoiado em relatórios e depoimentos, promoveu Walter Tull a segundo tenente do 23º Batalhão do 17º Regimento de Middlesex.
A guerra já dava mostras de que não iria longe, seu fim estava próximo e o Rangers voltou a procurar Walter, mas essa história não tem um final feliz. Numa última e desesperada tentativa de reverter o curso da guerra, os alemães lançam um grande ataque que ficou conhecido como a segunda batalha do Somme e em março de 1918, perto de Favereuil, morre aos 29 anos Walter Tull. Chega ao fim à história de um homem simples, filho de um modesto trabalhador, neto de escravo e cuja vida trágica, não o impediu de ser maior que a maioria de seus contemporâneos. Muito pelo contrário, fez dele um forte, um determinado, que enfrentou a solidão, o preconceito e estupidez, da mesma forma que entortou zagueiros, demoliu esquemas táticos e curvou o estado maior das forças armadas britânicas.
Walter não pode desfilar sua categoria no gramado do Ibrox Park, nem comemorar vitórias sobre os Celtic boys, mas é o maior símbolo da luta contra o racismo na Inglaterra e todos os anos no Walter Tull Memmorial Garden, próximo ao Sixfields Community Stadium do Northampton Town, centenas e centenas de fãs do Tottenham, Fulham e Northampton, prestam a ele homenagem.
Conta-se nos pub’s, que em um jogo entre Liverpool e Tottenham Hottspur, a torcida do Liverpool entoou cânticos racistas contra um jogador do Tottenham, em resposta os torcedores dos Spurs, gritaram em coro o nome de Walter Tull e que o goleiro Bruce Grobelaar e Graeme Souness jogadores do Liverpool pediram silêncio a seus torcedores. Diante disso, os vermelhos calaram-se.
Fernando Amaral.
Encontrei Walter Tull.
Neto de escravo, filho de um imigrante das Ilhas Barbados e uma jovem inglesa de Folkestone, Walter Tull foi o homem que derrotou por duas vezes o preconceito e a intolerância. Venceu uma infância trágica e se foi ainda jovem, num tempo em que a morte colhia sorridente nos campos da Europa meninos, rapazes e homens.
Nascido em 1888, Walter foi o sétimo e último filho dos Tull, sua mãe morreu logo após o parto e seu pai desgostoso e infeliz, faleceu dois anos depois. A família de sua mãe sem posses para cuidar da prole, entregou Walter e seu irmão mais velho Edward aos cuidados do Orfanato Metodista em Bethnal Green, Londres.
Ambos permaneceram no estabelecimento até completarem a maior idade, Edward tornou-se um bem sucedido dentista em Glasgow na Escócia, enquanto Walter permaneceu em Londres, vivendo de pequenos serviços e de sua habilidade como jogador de futebol. Ainda garoto foi convidado a participar do time do Clapton, equipe amadora que disputava as ligas menores da Associação Inglesa de Futebol, porém sua maneira de jogar, seu estilo técnico e sua garra, logo chamaram a atenção dos treinadores do Tottenham Hotspur.
Em 1908, Walter assinou contrato profissional com os Spurs e ao lado do goleiro Arthur Walton do Preston North End tornaram-se os primeiros negros profissionais no futebol inglês. Fez parte da delegação do Tottenham em uma excursão à Argentina e Uruguai e a cada jogo sua fama crescia e seu futebol brilhava. Mas um negro, vestindo a camisa de um grande de Londres e ainda tendo a ousadia de desmoralizar defesas e estraçalhar adversários, não poderia ficar impune, na puritana e conservadora Inglaterra de então.
Em uma partida contra o Bristol Rovers, Walter foi covardemente caçado, sob os olhos complacentes do árbitro, após marcar 4 dos 5 gols na goleada sobre o Rovers. Ao final, Walter saiu gravemente contundido e permaneceu inativo por um longo período, e ao retornar, o treinador o colocou entre os reservas, dando-lhe poucas chances de voltar a jogar. Em 1910 Walter deixa o Tottenham, ali parecia estar encerrada a carreira do negro hábil, forte e marcador de gols. Durante um ano Walter permaneceu parado, até que Herbert Chapman lendário treinador inglês, o convidou para se unir ao time do Northampton Town e disputar a Southern Liga.
Foram 110 partidas pelo novo clube, o estilo permanecia o mesmo, Walter ainda continuava a humilhar defensores e derrotar os fortes esquadrões do reino. Chega o ano de 1914, o Rangers de Glasgow forma um grande time e vai buscar no Northampton seu principal reforço. Mas a Europa já não era a mesma, o império Austro-Húngaro invade a Sérvia e a Alemanha sua aliada marcha sobre a França, termina assim o sonho do Rangers, de Walter e de milhares de jovens futebolistas em todo o continente europeu... A primeira Grande Guerra chega à ilha de sua majestade e Walter se alista no 17º Regimento de Middlesex, é incorporado como sargento ao 23º Batalhão, que ficaria famoso por ser o “batalhão dos futebolistas” dado ao grande número de jogadores de futebol em suas fileiras. Walter participa da primeira batalha do Somme em território Frances e da frente italiana. O craque da bola, também se mostra um grande soldado, faz história entre seus companheiros, ganha o respeito de seus superiores e retorna de licença a pátria como herói.
Em Londres seu amor pelo futebol é mais forte, e ele enverga a camisa do Fulham na temporada de 1915, com o mesmo sucesso, com a mesma habilidade e com o mesmo faro de gols. Em 1818 é reconvocado e devolvido aos campos de batalha e é nesse momento que Walter conquista sua maior vitória. Volta à guerra como o primeiro oficial negro da história do exército da Grã Bretanha, mas não foi uma vitória fácil, os manuais militares ingleses de 1914, eram específicos: “Nenhum homem negro poderia comandar brancos”.
Walter mais uma vez era o centro das atenções, os oficiais conservadores, lutaram contra a sua nomeação, mas os oficiais que o comandaram não abriram mão, mantiveram a indicação de Walter e foram até as últimas instâncias para verem concretizado o que eles chamavam de “justa promoção”. Ao final dessa curta, mas renhida batalha o Supremo Comando das Forças Armadas Inglesas, apoiado em relatórios e depoimentos, promoveu Walter Tull a segundo tenente do 23º Batalhão do 17º Regimento de Middlesex.
A guerra já dava mostras de que não iria longe, seu fim estava próximo e o Rangers voltou a procurar Walter, mas essa história não tem um final feliz. Numa última e desesperada tentativa de reverter o curso da guerra, os alemães lançam um grande ataque que ficou conhecido como a segunda batalha do Somme e em março de 1918, perto de Favereuil, morre aos 29 anos Walter Tull. Chega ao fim à história de um homem simples, filho de um modesto trabalhador, neto de escravo e cuja vida trágica, não o impediu de ser maior que a maioria de seus contemporâneos. Muito pelo contrário, fez dele um forte, um determinado, que enfrentou a solidão, o preconceito e estupidez, da mesma forma que entortou zagueiros, demoliu esquemas táticos e curvou o estado maior das forças armadas britânicas.
Walter não pode desfilar sua categoria no gramado do Ibrox Park, nem comemorar vitórias sobre os Celtic boys, mas é o maior símbolo da luta contra o racismo na Inglaterra e todos os anos no Walter Tull Memmorial Garden, próximo ao Sixfields Community Stadium do Northampton Town, centenas e centenas de fãs do Tottenham, Fulham e Northampton, prestam a ele homenagem.
Conta-se nos pub’s, que em um jogo entre Liverpool e Tottenham Hottspur, a torcida do Liverpool entoou cânticos racistas contra um jogador do Tottenham, em resposta os torcedores dos Spurs, gritaram em coro o nome de Walter Tull e que o goleiro Bruce Grobelaar e Graeme Souness jogadores do Liverpool pediram silêncio a seus torcedores. Diante disso, os vermelhos calaram-se.
Fernando Amaral.
Um comentário:
Infelizmente o racismo é uma doença grave que ainda se alastra pelo mundo a fora. Negros, brancos, amarelos, pardos... Somos todos SERES HUMANOS! Ou os torcedores se esquecem que o maior jogador de todos os tempos ERA NEGRO?
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