O brasileiro é mesmo tão
apaixonado pelo time de futebol que torce?
Uma nova pesquisa do SPC aponta
duas conclusões: o torcedor não é tão fanático quanto ele pensa e ter a maior
torcida não diz muito se ela não for engajada ao clube
Rodrigo Capello para a revista “Época”.
“O Flamengo tem 35 milhões de torcedores.”
“O Corinthians possui 30 milhões
de fãs.”
As frases saem da boca de
dirigentes toda vez que precisam “vender” o clube – para conseguir um
patrocinador, por exemplo – e de torcedores na hora de contar vantagem nos
bares e nas redes sociais.
Há derivações para quase todo
time de futebol brasileiro que se considera "grande".
Pare para refletir.
A torcida de seu clube é mesmo
tão numerosa assim?
Ou melhor: ela é tão apaixonada
quanto as afirmações de grandeza fazem parecer?
O modo como o mercado conta
torcedores é conhecido: institutos como Datafolha e Ibope fazem pesquisas
amostrais e determinam que, de toda população, 18% torcem para o Flamengo e 16%
para o Corinthians.
Esses percentuais em um país com
mais de 200 milhões de habitantes fazem qualquer um parecer gigante.
Mas a conta não deveria ser tão
simples assim.
Afinal, se há tantos milhões de
torcedores no Brasil, como conceber que o Campeonato Brasileiro tenha uma média
de público em torno de 17 mil pagantes por jogo?
A resposta está em quão
apaixonados são esses milhões.
As torcidas de futebol podem ser
colocadas em réguas de engajamento.
O fulano que está lá no topo é
aquele que lê as notícias do clube, vai ao estádio, viaja para ver o time jogar
fora de casa, paga mensalidades de sócio-torcedor e assina pacotes de
pay-per-view.
Sente-se mal quando o time perde
e gasta mais do que poderia com seus produtos.
É o fanático.
O fã.
O sujeito que fica na outra ponta
simpatiza pelo clube, diz que torce por ele, mas não faz nada disso com tanta
frequência.
Assiste aos jogos e compra
produtos eventualmente.
Não tem tanto envolvimento
emocional assim.
Na teoria, tudo certo. Na prática
é que o problema engrossa.
A medição do engajamento de cada
torcedor é rara dentro dos próprios clubes – os departamentos de marketing,
quando têm equipe, investem seus esforços mais em tarefas comerciais, como
buscar patrocinadores, do que efetivamente de marketing, algo que envolve
pesquisa.
No mercado, de modo conjuntural,
as pesquisas são ainda mais raras.
A boa-nova é que o Serviço de
Proteção ao Crédito (SPC), aquele órgão reconhecido por cobrar dívidas, fez uma
pesquisa que levou em conta as diferenças entre fanáticos e simpatizantes.
Os torcedores brasileiros acham
ser mais fanáticos do que realmente são.
Ao responder ao questionário do
SPC, metade dos entrevistados, 50%, afirmou ser “aficionada”, o mais elevado
nível de engajamento. Só 13% se identificaram como “simpatizantes”.
O órgão então fez perguntas mais
direcionadas para “checar” se aquela impressão era real.
Com que frequência você lê
notícias sobre seu time?
A quantos jogos assistiu no
último mês?
Assim em diante o SPC identificou
que a prática está distante do discurso.
Na régua da entidade, só 8% são
“aficionados” e 43% são “simpatizantes”.
Não amamos tanto assim.
O SPC também montou uma tabela
que divide os torcedores por time em “aficionados”, “médios” e “simpatizantes”.
Prepare-se para a polêmica.
O São Paulo, campeoníssimo na década
de 2000, tem uma proporção maior de simpatizantes do que de aficionados.
O Palmeiras, pelo contrário, tem
mais aficionados do que simpatizantes.
Na prática, isso quer dizer que,
apesar de os são-paulinos aparecerem à frente dos palmeirenses em pesquisas de
tamanho de torcida tradicionais, como a do Datafolha, os palmeirenses consomem
o clube com mais intensidade.
Se você lembrar que o Palmeiras
teve uma média de 29.633 pagantes por jogo no Brasileiro de 2015 enquanto o São
Paulo ficou em 20.562, a conclusão do SPC ganha mais um indicador que a
corrobora.
É claro que as conclusões merecem
um paragrafão de ressalvas.
A pesquisa do SPC, como as do
Ibope e da Datafolha, é amostral e, portanto, não deve ser considerada como
definitiva.
Uma coisa é entrevistar os 200
milhões de brasileiros para ter certezas, mas aí haja custo.
Outra é entrevistar 620 pessoas
em 27 capitais e estimar o comportamento de grupos maiores a partir da amostra.
O método é sério, embasa
pesquisas no esporte, na política e na economia, mas tem uma margem de erro.
No caso são 3,5 pontos
percentuais que podem mudar os resultados de figura.
Mais: a pesquisa do SPC descartou
entrevistados que não gostam de futebol.
Isso porque o valor que elas
gastam com futebol, por exemplo, quase nada, puxaria a média toda para baixo, e
o intuito do órgão era entender padrões de consumo do torcedor, não da
população.
Tenha em mente: a pesquisa tem
limitações.
Mas é um bom ponto de partida
para qualificar o debate sobre os milhões de apaixonados por futebol.
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