Imagem: Autor Desconhecido
Assinaturas contra a injustiça
Poderíamos recolher assinaturas
para exigir uma revisão minuciosa de todas as jogadas polêmicas nos jogos de
futebol
John Carlin para o El País
A Internet é muitas coisas, entre
elas a globalização da estupidez.
Antes alguém dizia uma asneira e
a coisa ficava em casa ou no bar.
Alguém proporia, por exemplo, que
fosse realizado outra vez o recente jogo da Champions League em que o Barcelona
eliminou o Paris Saint-Germain.
Quatro amigos apoiariam felizes a
moção e fim da história.
Hoje, quando alguém tem a mesma
ideia, vai para a Internet e envia uma mensagem ao mundo: assinem uma petição
para que a partida injustamente vencida pelo Barcelona seja jogada de novo.
E 200.000, 300.000 pessoas
assinam.
A bobagem do bar de bêbados se
globaliza.
Epidemias similares de emaranhada
imbecilidade conduzem a absurdos tais como a escolha de um troll tuiteiro para
presidente dos Estados Unidos.
É o mundo em que vivemos.
Não há nada a fazer.
Já que é assim, vamos participar da festa.
Abaixo apresento outras causas
que também merecem assinaturas em massa.
Primeiro, uma breve lista de
jogos que devem ser realizados novamente:
O Arsenal x Bayern da última
rodada da Champions.
Sim, é verdade que o Arsenal
perdeu a eliminatória por um total de 10 gols a 2.
Mas, como bem se queixou o
treinador da equipe londrina, Arsène Wenger, a intervenção decisiva foi a do
árbitro.
Expulsou um jogador do Arsenal
quando a vantagem do Bayern era só de 5 a 2 faltando ainda 35 minutos para o
fim do jogo.
O Inter de Milão x Barcelona nas
semifinais da Champions em 2010.
A Inter venceu pela contagem
mínima, mas o árbitro não viu que o decisivo gol italiano foi marcado em
impedimento.
Isso tampouco foi visto pelo
técnico da Inter naquele jogo, José Mourinho.
Outro jogo da Champions, dessa
vez em 2006, que o Barcelona ganhou por 2 a 1 contra o Chelsea de Mourinho.
O português acusou Lionel Messi
de ter enganado o árbitro para forçar a expulsão de um defensor do Chelsea.
Depois do jogo, Mourinho disse:
“Vamos ver se a UEFA manda realizar o jogo novamente”.
Pois então, vamos assinar que não
é tarde demais.
Todos os jogadores daquela
partida ainda estão vivos.
O problema é o que fazer com
injustiças históricas como a vitória da Inglaterra na Copa do Mundo de 1966,
uma partida que não seria muito viável voltar a jogar hoje.
Uma solução seria recolher
assinaturas para que se aja retroativamente, como no atletismo: quando se
descobre anos depois que o vencedor de uma corrida estava dopado, o ouro vai
para quem ficou em segundo.
A mesma lógica aplicada ao
futebol daria a possibilidade de que o terceiro gol inglês contra os alemães,
que só foi visto pelo bandeirinha russo (outro ressentido, neste caso, pela
invasão nazista de seu país na Segunda Guerra Mundial) seja apagado da história
e que a Copa do Mundo 66 seja concedida à Alemanha.
As possibilidades são quase
infinitas.
Assinaturas poderiam ser
recolhidas para exigir uma revisão completa de todas as jogadas controvertidas
de todas as partidas que foram transmitidas pela televisão em todo o planeta
nos últimos 60 anos.
Supondo que fosse possível
confiar a missão a um comitê imparcial dotado de poderes divinos, os
signatários vislumbrariam a feliz possibilidade de que a Holanda e não a
Alemanha acabasse ganhando a Copa do Mundo de 1974, o Peru e não a Argentina a
Copa de 1978, a Espanha a de 2002; que o Atlético de Madrid acabasse com sua
trágica seca na Liga dos Campeões e ganhasse o torneio três vezes; que os seis
troféus conquistados pelo Barcelona na primeira temporada de Pep Guardiola como
treinador fossem reduzidos a zero; que todos os times que Mourinho treinou
fossem proclamados vencedores de todos os jogos e todos os torneio que
disputaram.
A primeira coisa, é claro, seria
recolher bilhões de assinaturas para que o princípio retroativo fosse aceito no
futebol.
Uma vez aceito, cada partida a
que assistíssemos daí em diante se abriria à possibilidade de ser disputada
novamente, eliminando o acaso e o suspense do futebol de uma vez por todas.
O esporte seria extinto em
questão de semanas, claro.
Mas a satisfação dos que recolhem
as assinaturas seria eterna.
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