Imagem: Arquivo Pessoal
Alessandra:
“O basquete brasileiro não soube se impor como o vôlei fez”
A pivô da seleção que conquistou o Mundial de 1994 afirma que a chave
para reverter a crise do basquete é não apenas renovação técnica, mas a
massificação do esporte
Por Joana Oliveira para o El País
Em junho e julho, quando a
atenção dos brasileiros estava voltada à Copa do Mundo de Futebol, a seleção de
basquete disputava, discretamente e com bem menos audiência, os jogos
classificatórios para o Mundial de 2019.
Alessandra de Oliveira, a pivô
número 13 da seleção feminina que conquistou o primeiro Mundial da modalidade
para o Brasil em 1994 —além da prata nas Olimpíadas de Atlanta, em 1996, e do
bronze em Sydney, em 2000— acompanhou cada jogo, ansiosamente.
Aos 44 anos, Alessandra é a única
da "geração de ouro" (foi companheira de Paula e Hortência) a
continuar nas quadras, com seus exatos 2 metros de altura.
"Jogo 3x3 e estou me preparando para os Jogos Olímpicos de 2020.
Mesmo com 50 anos, se me chamarem, eu vou", afirma.
A concretização desse plano, no
entanto, não depende apenas do seu preparo físico e mental.
A seleção feminina ainda não está
classificada e vai lutar pela vaga a partir do dia 30 de setembro, no
Campeonato Sul-Americano.
Depois de toda a crise que passou
o basquete nos últimos tempos, com problemas de gestão e corrupção dentro da
própria CBB (Confederação Brasileira de Basquete) —a gestão anterior à de Guy
Peixoto, presidente da Confederação há pouco mais de um ano, deixou uma dívida
de R$ 40 milhões— a categoria que mais sofreu com renovação e busca de novos
talentos foi a feminina.
Após a conquista do bronze no ano
2000, as jogadoras começam a sair do Brasil por falta de oportunidades, entre
elas, Alessandra, que jogou em 15 países.
Os títulos importantes não foram
suficientes para fazer a modalidade crescer.
Para a pivô, a ruptura entre o
panorama dos anos 1990, com as arquibancadas cheias nos estádios, e o panorama
atual, é justamente consequência da má administração.
"A CBB tem esse passado negro, deixou um rombo muito grande e não
fez uma renovação quando precisava", comenta ela, que chegou a
processar a confederação em 2006, depois de sofrer uma lesão no ombro durante a
derrota por 88 a 76 diante da Austrália, na semifinal do Mundial de 2006,
realizado no Brasil.
Alessandra acusou a entidade de
não pagar o seguro previsto em caso de contusão durante o campeonato, mas
perdeu a ação judicial em 2010.
Em meio ao turbilhão atravessado
pela CBB e diante de várias trocas no comando técnico, a seleção brasileira não
chegou a se classificar sequer para a fase de grupos nas Olimpíadas do Rio, em
2016, e repetiu o mau resultado no ano seguinte, na Copa América de 2017,
quando perdeu a disputa do terceiro lugar para Porto Rico, ficando fora da
final pela primeira vez em 58 anos.
Depois desses sustos, a temporada
de 2017 da LBF (Liga de Basquete Feminino) passou a dar mais oportunidades para
novas jogadoras e ter um pouco mais de visibilidade.
Alessandra comemora esse primeiro
passo, mas acredita que ainda faltam mais iniciativas.
"Ainda precisamos aumentar o número de técnicos e, principalmente,
o número de praticantes. Primeiro, temos que massificar o esporte,
principalmente o feminino e, depois, teremos atletas. Agora mesmo não estamos
nem massificando, nem formando seleção, nem tendo resultado", lamenta.
A pivô compara o cenário de sua
modalidade com o do vôlei brasileiro:
"Pegaram todas as meninas do meu tamanho, que seriam a base do
basquete, e jogaram no vôlei. Eles souberam ganhar espaço, enquanto nós paramos
no tempo. Não soubemos nos impor", afirma e acrescenta:
"Mas ainda bem que fizeram isso, senão praticamente não teríamos
esporte feminino no Brasil".
Massificação
Alessandra concedeu a entrevista
a EL PAÍS em uma quadra do Parque Aclimação, em meio a um treino das Magic
Minas, um time de basquete feminino amador, que pretende estimular o acesso das
mulheres aos esportes coletivos.
É uma noite fria e chuvosa de
inverno, mas apesar de ser ao ar livre, a quadra está cheia (com 30 jogadoras)
para acompanhar os movimentos da eterna número 13 da seleção.
"Quando falo da importância de massificar o esporte, me refiro a
isto. Esse encontro já é um incentivo para mostrar que, além do futebol, há
outras possibilidades", comenta a jogadora, que também realiza
projetos sociais e dá aula para crianças.
"Nada contra o futebol, mas nós temos que fazer atletas. Só na
região de Campinas, mais de 50.000 meninos vão fazer todo ano peneira de
futebol, e, segundo os dados da Unicamp, não passam nem 100. Se eles fossem
incentivados a praticar outros esportes, com certeza seríamos uma potência
olímpica", acrescenta.
Ela já vê, no entanto, uma luz ao
final do túnel, graças à nova gestão da CBB que, em suas palavras, "quer passar a página", com o
fim da suspensão, em junho, que a FIBA (Federação Internacional de Basquete)
havia imposto ao Brasil por problemas administrativos e com a popularização das
ligas de basquete, principalmente a NBA —que em 2016 abriu sua primeira filial
na América Latina, com uma loja no Rio de Janeiro.
"Percebo que a NBB (Novo Basquete Brasil, liga nacional) já está
entrando na cabeça das pessoas também. Converso sempre com a criançada, por
exemplo, pergunto se viram o jogo e eles comentam as jogadas e tal e tal
jogador. É do micro para o macro mesmo", conta.
Alessandra pondera, no entanto,
que a modalidade feminina ainda não segue o mesmo ritmo:
"Todo mundo conhece o LeBron James, mas a Diana Taurassi [jogadora
da WNBA, liga feminina norte-americana] ganha o mesmo que ele e ninguém sabe
quem ela é".
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