Nos meus tempos de Rio de Janeiro, existia uma frase que era muito usada para identificar uma pessoa que abraçava uma causa, sem contar com nenhum apoio, ou que saia para as noitadas absolutamente “alone”...
Quem assim agisse, era logo identificado como membro do “bloco do eu sozinho”...
Muitas vezes na minha vida, “saí nesse bloco” e ainda hoje costumo fazê-lo.
No colégio Dom Bosco em Brasília, vivi minhas primeiras experiências no tal bloco...
Como era de se esperar, tínhamos duas vezes por semana aulas de religião, ministradas pelo Padre “Bututinha” – apelido carinhoso que os alunos que por ele passaram lhe deram e que, era confirmado a cada ano, pelas turmas subseqüentes.
Padre “Batutinha” era franzino, pequenino, de origem belga e que mesmo estando a mais de cinqüenta anos no Brasil, não havia perdido seu sotaque pesado e arrastado da valônia francófona, que ele orgulhosamente grafava no quadro negro como Wallonië, ao se apresentar a cada início de ano.
Culto, competente, eficiente e dono de uma bondade e de uma paciência santa, Padre “Batutinha” foi meu primeiro amigo, apesar de nossas divergências quando o assunto era fé.
O velho costumava me chamar em sua sala e me ajudar em matérias como matemática (minha eterna e incansável inimiga) e não raro, usava o recreio para corrigir meus enganos em história e geografia, matérias que sempre me fascinaram...
Mas também, me passava violentos carões, acompanhados de um gestual nervoso e melodramático, quando minhas freqüentes perguntas sobre questões religiosas o deixavam constrangido.
Lembro de uma vez, quando ele falava da vida eterna e eu o interrompi e perguntei: “Padre, se a morte é o único meio de todos nós chegarmos ao reino celestial, por que é que as pessoas a temem tanto”?
Silencio...
Inadvertidamente continuei: “Se morrer é ir para junto de Deus, por que as pessoas choram ao invés de comemorar e se alegrar com isso”?
A régua partiu-se sobre a mesa, após a forte pancada dada por ele e à aula foi encerrada.
Quando me levantei para sair, fui parado pela ordem: fique!
Sentei e antes mesmo que pudesse dizer qualquer coisa, o céu desabou sobre mim – começou num tom conciliador e dito num português afrancesado, mas logo se transformou numa tempestade de palavras gritadas que felizmente não consegui entender, pois nervoso e descontrolado, Padre “Batutinha” só conseguia se expressar em francês.
Dali em diante, abstive-me de perguntar e quando ele fazia qualquer questionamento e me olhava, eu balançava a cabeça em sinal de concordância – era inútil discutir com ele, e depois, não valia à pena, passar pro intermináveis e torturantes minutos de violenta e ameaçadora verborragia, numa língua estrangeira.
Hoje, me lembro dele com saudade...
Lembro que ele me defendeu ardorosamente na reunião de diretores e mestres, quando o colégio decidiu que era impossível conviver com um rapazola que contestava constantemente os ensinamentos das aulas de religião – foi voto vencido, mas não temeu contrariar seus superiores, na defesa do seu aluno “problema”.
Padre “Batutinha” nos ensinou o que significava “onisciência” – sempre sabia quem colava nas provas...
Mostrou a força da onipresença – sempre descobria os lugares onde nos escondíamos para fumar...
Soterrou-nos com sua onipotência – seus nãos eram irrevogáveis e suas decisões inquestionáveis.
Quando ele morreu aos 90 anos, eu já tinha 20 anos e haviam se passado três anos de minha “mudança forçada” de colégio, mas fui ao seu velório, toquei suas mãos, beijei sua testa e chorei por um longo tempo segurando suas mãos – havia perdido um grande amigo e um bom conselheiro.
Hoje, seu corpo repousa em Namur, na Bélgica, ao lado de seus ancestrais.
É dele uma frase que acho adorável e que define seu caráter – uma vez numa conversa na lanchonete, Robério, em tom de provocação perguntou: “Padre o senhor é Belga, o símbolo da seleção da Bélgica é o Diabo, como o senhor não se aborrece com isso”?
Padre “Batutinha” sorriu e depois, sério disse: “nós o convertemos há muitos anos, ele só mantém aquele aspecto e aquela cara feia, para assustar os pagãos do leste e do norte...
Ele se referia aos alemães e aos holandeses.
Pois bem, seguindo a mania do bloco do eu sozinho e da contestação, vou opinar sobre os destaques do ano no futebol do Rio Grande do Norte...
Ah, mas dessa vez no bloco vão dois: eu e Lupercio Luiz, ambos abraçamos a mesma causa.
ASSU e Alecrim são os clubes...
Centenário de Pau dos Ferros merece a menção honrosa...
Hugo Sales, o treinador – venceu os grandes na primeira divisão e não tomou conhecimento dos pequenos na segunda.
Francisco Diá divide as honras com Sales – Transformou um time comum, montado com jogadores parados, em uma equipe aguerrida e competitiva e, depois, pegou um barco furado, sem rumo e sem comando, e injetou um mínimo de dignidade num grupo dividido e, os fez recuperar o que propositalmente haviam jogado fora, quando decidiram derrubar um treinador.
José Vanildo é o dirigente – Vanildo deu respeitabilidade e decência à federação, excluiu os filiados fantasmas, aboliu o rastejar na CBF, pelo pleitear, defendeu o futebol numa solenidade, diante de uma prefeita atônita pela franqueza e crueza de suas palavras, investiu na modernidade e queiram ou não, foi o responsável direto pela costura que resultou na vitoriosa campanha do Alecrim na Série D.
Por fim, Vanildo deve conseguir o que muitos tentaram e não conseguiram: trazer a ALE/SAT, para dentro do futebol do Rio Grande do Norte.
Como?
Com um projeto consistente e com o apoio certo.
Ah, antes que alguém diga que minha posição em relação a José Vanildo se deve ao fato de eu estar à frente da editoria do site da federação, digo o seguinte: o que recebo para tal serviço, não me permite viajem mais longa que ir e voltar a Mossoró no mesmo dia, pois se ficar para dormir terei que pedir abrigo na casa do Lupercio ou do Accioly, pois não dá para pagar o hotel.
Sobre os craques, nada a declarar...
Como chamar de craques aqueles que rebaixaram um time e quase rebaixaram outro?