Por AIRTON GONTOW*
Aconteceu na manhã de ontem, 29 de novembro, no mercado ver-o-peso, na bela Belém do Pará.
No último dia de uma rápida viagem a trabalho, encontrei tempo para fazer compras pessoais e, claro, procurar alguns presentinhos para a família.
Ao chegar a uma banca de bolsas, vi que havia duas interessantes.
Uma era colorida e muito bonita.
E tinha a cara da minha mulher!
A outra, embora também tivesse lá a sua beleza, era menos encantadora e, definitivamente, não fazia o estilo da minha esposa!
Infelizmente, um jornalista – o jovem repórter Rafael Seixas, do jornal "A Crítica", de Manaus, chegou um pouco antes.
O rapaz descobriu as duas bolsas e decidiu que levaria uma. Olhou para mim e disse: "Eu não tenho bom gosto para este tipo de coisa.
Qual você acha mais bonita?"
Meu coração bateu forte.
Pensei em dar a resposta errada.
Dizer que a mais bela era justamente a bolsa que eu não queria levar.
O presente era para a mulher!
Olhei para o repórter amazonense e disse, ainda que com dor no coração: "a mais bonita, sem dúvida, é a colorida."
Por que eu disse a verdade?
A resposta é simples e até óbvia: porque era o correto, independente do meu desejo.
Penso nesta pequena história vivenciada ontem diante do dilema de qual deve ser a atitude do meu Grêmio no decisivo jogo de domingo, contra o Flamengo, no Maracanã: o Grêmio deve entrar com o time titular contra a equipe carioca, lutar com todas as suas forças para empatar ou ganhar e, indubitavelmente, dar o título de campeão brasileiro ao grande e tradicional adversário?
Ou deve entregar o jogo para não ajudar a dar mais uma glória ao terrível e centenário rival?
Para mim não há discussão.
O Grêmio deve jogar com toda a sua tradicional garra e matar-se em campo em busca da vitória, ainda que o Inter conquiste pela quarta vez o título brasileiro.
Não importa que o Inter tenha jogado com o time reserva no ano passado contra o São Paulo, ainda que em contexto completamente diferente, já que disputava simultaneamente a taça sul-americana; não importa que o diretor Fernando Carvalho, não bastasse à trapalhada que fez no ano passado, com a história do vídeo denúncia, já tenha voltado a falar bobagens; não importa que, com mais essa conquista, o colorado gaúcho aumentará consideravelmente o seu já espantoso número de associados, venderá mais camisetas e diminuirá a desvantagem que tem em número de torcedores em relação ao Grêmio.
Não importa nem mesmo a opinião momentânea da maioria da torcida gremista, que é favorável à entrega da partida.
O Grêmio deve buscar a vitória ou empate contra o Flamengo porque – apenas isso – essa é a atitude correta.
Independentemente dos nossos desejos e sentimentos.
Como gremista, só detesto o Internacional porque o respeito como adversário.
E certamente há apenas um time que respeito mais que o grande rival.
Este time é o Grêmio.
E por respeitar o meu imortal tricolor exijo a dedicação total na partida do Maracanã.
Além disso, convenhamos, mesmo com o quarto título brasileiro os colorados não vão poder se vangloriar por estarem em vantagem em relação ao Grêmio.
Terão quatro Brasileiros e uma Copa do Brasil contra dois títulos do Brasileiro e quatro Copas do Brasil gremistas.
E uma Taça Libertadores contra duas do Grêmio.
Os colorados gostam de tripudiar em cima das quedas gremistas para a segunda divisão do país, mas é justamente aí que mora a principal diferença entre os dois grandes clubes do Rio Grande do Sul.
Por maior que seja, o Internacional não tem a dimensão épica gremista.
Não tem a incrível história do goleiro Eurico Lara.
Não tem títulos importantes conquistados no estádio dos adversários.
Não tem a Batalha dos Aflitos.
O que poderia ser desonra, para nós, gremistas, é motivo de filme!
Que outra torcida no mundo tem, no fundo, mais orgulho de uma inacreditável conquista na Segunda Divisão arrancada com sangue, suor e lágrimas, com sete jogadores, em um acanhado de Recife, que do título mundial, conquistado em Tóquio?
O jogo do Maracanã, com todos seus dilemas, poderá ser uma nova Batalha dos Aflitos na memorável e história gremista.
Vencer e dar o título ao maior adversário, apesar da maior rivalidade do país, segundo votação recente entre jornalistas esportivos de todo o Brasil.
A dor de ser digno e dar o título ao inimigo.
A tristeza de ouvir os rojões colorados infernizando durante toda a noite o sono dos gremistas.
A tristeza – e o orgulho – de ser um Cirano de Bergerac.
Ajudar o rival na conquista da mulher amada.
Com digna e bela melancolia.
É preciso lutar – com garra e espada mosqueteira no Maracanã.
É melhor não dormir devido ao barulho ensurdecedor dos vermelhos, do que ter o sono estragado pela vergonha de não ter jogado com dignidade.
É melhor aguentar o rival que sucumbir aos nossos mais primitivos anseios, como o de "entregar" a partida.
Que atender ao grito desesperado e irracional da maioria.
Vamos fazer o que é certo, Grêmio!
Melhor assim, que ver-o-peso doendo na nossa consciência e manchando nossa história épica e inigualável.
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