Eu confesso!
Por André Kfouri
Não é na hora de dormir que a
consciência enquadra quem tem algo a esconder.
Comprimidos e doses variadas
resolvem o problema.
Para os homens, a hora da verdade
chega de manhã, diante do espelho, ao fazer a barba.
Não dá para fugir do momento
“olhos nos olhos”.
Eles têm de estar bem abertos,
para evitar acidentes.
É quando começa o acerto de
contas.
Eu faço a barba diariamente, e
não suporto mais.
Minhas mãos tremem, o estômago se
revira.
Penso em cortar minha própria
jugular.
Não quero mais viver assim.
Esta coluna é uma confissão.
Lamento pelos problemas que
causarei, mas nunca é tarde demais para fazer o que é certo.
Sou membro de uma organização
secreta.
O nome é “Imprensa Unida para
Prejudicar o Seu Time”.
Auto-explicativo.
Nosso único objetivo é criticar,
desrespeitar, humilhar e, finalmente, acabar com o seu time de futebol.
Não todos, ou a maioria, mas só o
seu.
Somos tão antigos quanto o
próprio jogo.
Temos conexões em todos os
países, mas nossa célula mais numerosa é a brasileira.
Quase todos os jornalistas que
trabalham com futebol no país fazem parte dessa verdadeira seita, uma rede sem
fim que domina o conteúdo dos jornais, revistas, TVs, rádios, sites, blogs,
twitters…
Chegamos às nossas redações, sete
dias por semana, com o solitário propósito de prejudicar o seu time.
Não nos afastamos dessa “linha
editorial” por nada.
E não toleramos a concorrência.
Quando surge um jornalistazinho
metido a neutro, imparcial, o coitado não dura um mês.
Vai procurar outro ramo para
exercer sua independência.
Graças à internet, hoje as
redações estão interligadas, em constante comunicação.
Combinam manchetes, distorcem
declarações, ignoram a pluralidade, rasgam os manuais.
Tramam, dia e noite, sórdidos
esquemas de perseguição ao seu time.
Há até um prêmio para o comentarista
mais venenoso, o autor do texto mais deletério.
O troféu “O Exterminador do
Futuro dos Times” é entregue anualmente, na semana da última rodada do
Campeonato Brasileiro.
Nosso grupo clandestino é
poderoso, ninguém escapa.
Se não vamos com a cara de um
jogador, ele será sempre criticado (mas só quando jogar no seu time).
Se não gostamos de um cartola,
ele será implacavelmente perseguido (mas só se for do seu time).
E se descobrimos algo errado no
seu clube (mas só no seu, nunca nos outros), sai de baixo, é campanha de
difamação.
Quando criticamos um time (o
seu), é porque queremos aniquilá-lo.
Quando elogiamos um time (nunca o
seu), é porque queremos destruir os outros.
E quando simplesmente não tocamos
no nome de um time (às vezes, o seu), é porque queremos castigá-lo com a
obscuridade.
Se você acha que seu clube é
visado demais, ou sempre esquecido, se não consegue evitar a sensação de que “a
imprensa torcedora” tem um plano maquiavélico contra ele, e já está se
convencendo de que sofre de complexo de inferioridade, não se flagele.
A culpa é nossa.
Nós, da “IUPST”, temos até um
cumprimento secreto.
Quando você for ao estádio,
preste atenção.
Após o aperto de mãos, há sempre
um sorrisinho sarcástico.
Significa “hoje vamos acabar com
esse timinho”.
E é sempre o seu.