Imagem: Getty Images
Padre, treinador de futebol e, agora, suspeito de molestar garotos em
São Paulo
Antes de flagrante com material de pornografia infantil, sacerdote do
interior paulista já havia sido afastado pela Igreja por suspeitas de abuso
sexual
Breiller Pires de São Paulo para o El País
Ao longo de quase três anos, as
missas na igreja de São Sebastião, em Guapiaçu, uma cidade do interior de São
Paulo com menos de 20.000 habitantes, eram celebradas pelo padre Manoel Bezerra
de Lima na mais serena normalidade.
O fato de estar sempre rodeado de
meninos, com os quais se encontrava regularmente dentro e fora da paróquia,
jamais levantou desconfianças.
Até que, no último dia 30 de
novembro, o sacerdote de 66 anos foi preso por suspeita de abuso e exploração
sexual.
Em sua casa, policiais
encontraram fotos e vídeos pornográficos de adolescentes, preservativos,
lubrificantes e várias carteirinhas de crianças que haviam sido treinadas por
ele em um time de futebol amador.
Além da batina, padre Manoel era
reconhecido pela atuação como técnico de equipes infantis na cidade vizinha de
Cedral.
Desde que chegou a Guapiaçu para
assumir a posto de vigário após a morte do padre João Maria Zanzi, pároco do
município por mais de 30 anos, ele tinha se afastado da atividade nos campos,
mas, segundo relatos de garotos que conviviam com o religioso, costumava se
apresentar como um descobridor de talentos e prometia levar jovens para testes
em clubes da região.
Ganhava a confiança de
adolescentes com longos papos sobre futebol, convites para pescarias, presentes
e, principalmente, nos supostos encontros de “aconselhamento espiritual” que
promovia na residência paroquial de uma capela no condomínio fechado onde vivia
e celebrava missas há alguns meses.
Vizinhos confirmam o frequente
entra e sai de garotos com idades entre 14 e 17 anos na casa do religioso.
A polícia começou a investigá-lo
somente depois da denúncia de uma mãe à Vara de Infância e Juventude de São
José do Rio Preto.
Ela relatou que o filho, de 17
anos, deixou de ir à escola e chegava a passar períodos superiores a uma semana
hospedado com o padre.
Promotores de Justiça tentaram
entrar no condomínio em duas oportunidades, mas acabaram barrados na portaria.
Só então a Justiça emitiu um
mandado de busca e apreensão.
Foram abertos um inquérito contra
o padre e outro contra um homem que o acompanhava no momento da batida.
Ele não foi detido nem teve a
identidade divulgada, mas seu celular também foi apreendido por armazenar
imagens pornográficas.
Bezerra de Lima deixou a
delegacia de Guapiaçu no mesmo dia de sua prisão.
Dois padres de cidades próximas
pagaram a fiança de 3.000 reais por orientação da Diocese de São José do Rio
Preto, responsável pelas paróquias da região.
A entidade afirmou em um
comunicado que o sacerdote já não celebrava missas na capela do condomínio
tampouco na igreja de São Sebastião.
Ele havia sido afastado de suas
funções em 7 de novembro pela Diocese, que repreendeu a conduta do padre devido
ao fluxo de adolescentes na residência paroquial.
Na ocasião, segundo o bispo Dom
Tomé, a instituição ofereceu ao acusado “uma série de considerações que deveria
tomar em sua vida”.
Apesar do afastamento, a
administração eclesiástica não levou a suspeita interna às autoridades, mas
informa que o religioso “responderá por suas atitudes à medida que o processo (judicial)
avançar”.
A princípio, padre Manoel foi
indiciado por armazenamento de pornografia infantil, que prevê pena de um a
quatro anos de prisão.
Porém, a Promotoria da Infância e
Juventude investiga a suspeita de que o acompanhante do sacerdote no momento da
prisão seja um ex-padre, hoje professor de educação física, e a suposta
existência de uma rede de exploração sexual na região.
O material apreendido será
analisado por peritos para apurar se o padre participou da produção das imagens
com adolescentes.
Na próxima semana, a mãe
responsável pela denúncia e o filho, que sonha virar jogador profissional,
prestarão depoimento na delegacia de Guapiaçu.
Autoridades envolvidas na
investigação também pretendem localizar os garotos identificados nas
carteirinhas do time de futebol – atualmente, alguns deles já são maiores de 18
anos.
“Vamos averiguar se esses meninos
foram vítimas de assédio ou abusos sexuais do padre”, afirma o promotor da
Infância e Juventude, André Luis de Souza.
Enquanto responde ao processo,
Bezerra de Lima se mantém recluso na residência paroquial.
Em seu primeiro depoimento às
autoridades, ele revelou já ter mantido relações sexuais com homens adultos.
Entretanto, negou abusos contra
os adolescentes que frequentavam o condomínio.
“A próxima etapa do processo é
ouvir possíveis vítimas e aguardar a conclusão dos exames periciais para
determinar se o padre será indiciado por outros crimes”, diz o delegado
responsável pelo caso, Marcelo Ferrari.
Moradores de Guapiaçu, ainda
tentando digerir o escândalo que chocou a cidade, descrevem o padre Manoel como
uma pessoa pacata e humilde.
Dos campos de futebol ao altar,
ele apresentava credenciais que justificam a indiscreta proximidade dos
garotos, mas que agora, além do constrangimento para a comunidade religiosa,
cercam de descrença a reputação construída entre a bola e a Bíblia.
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