Falácias a respeito do problema do futebol argentino
Por Rodrigo R Monteiro de Castro via blogue do Juca Kfouri
O diário “Lance!” publicou
interessante matéria na edição de 11 de maio passado em que trata dos problemas
da estrutura do futebol argentino.
O ponto de partida é um projeto
apresentado pelo governo do presidente Mauricio Macri, que tem como propósito
induzir – ou determinar – a passagem dos clubes associativos, sem fins
lucrativos, para a forma de sociedades empresárias.
De acordo com a matéria, o
projeto deverá atrair, na ótica governamental, recursos da iniciativa privada
para o desenvolvimento do esporte e, consequentemente, contribuirá para o
fortalecimento da economia nacional.
Porém, dezenas de clubes
apontaram, em carta divulgada ao público, que o governo estaria privilegiando o
capital privado em detrimento do Estado, e que, num contexto de fragmentação
social, “a presença dos clubes, como articuladores e promotores”, seria vital
para a sociedade e para o futebol.
As questões que se colocam,
diante desse aparente dilema, são relativamente óbvias: vital para quem? E qual
o conceito de vitalidade que se pretende adotar, diante da decadência do
futebol argentino, que depende, como nunca antes em sua história, de um Messias
para salvá-lo do abismo.
A situação argentina se assemelha
à brasileira.
Todos os times profissionais daquele
país adotam a forma de associações civis, sem fins lucrativos, e existe uma
resistência, indisfarçada, à mudança do modelo, que abalaria, portanto, a
secular estrutura de dominação que prevalece não apenas nos clubes, mas,
sobretudo, na entidade local de regulação, administração e organização do
futebol, a AFA – Asociacion del Futbol Argentino.
Outro aspecto peculiar, também
indicado na matéria, envolve o Racing Club.
O Racing é um time tradicional e
vitorioso, que já levantou uma vez a Copa Libertadores.
Após se atolar em uma crise
financeira e passar por uma decretação de falência, estruturou um projeto que
previa a administração do futebol por uma sociedade anônima.
Apesar da restrição estatutária
contida no estatuto da AFA, inventou-se, com o seu apoio, uma brecha para que o
Racing, controlado por uma companhia, participasse de campeonatos
profissionais.
O modelo não deu certo, os
investimentos não apareceram, dívidas voltaram a crescer e o controle foi
retomado.
Esse fracasso passou a servir, no
imaginário coletivo, para demonstrar que propostas reformistas não são
convenientes, que os clubes devem permanecer amadores sob a batuta de
dirigentes não profissionais e que, no caso argentino, o Estado deve manter o protagonismo.
Aí está a consagração da fórmula
do insucesso. Insucesso vivido, aliás, por praticamente todos os times
argentinos, que se tornaram, assim como os brasileiros, exportadores de
commodities.
O debate não evoluirá de modo
adequado enquanto interesses corporativos e pessoais prevalecerem em relação
aos verdadeiros valores que envolvem o futebol.
O problema do Racing, por
exemplo, não nasceu da sociedade anônima; ela foi usada como remédio miraculoso
para o tratamento de doente terminal.
Além disso, a “solução Racing”
foi montada sobre uma estrutura casuística, que se prestava apenas a salvar um
time tradicional e a pacificar uma possível crise social.
O que se tentou, assim, foi o
salvamento – ou a manutenção – do que existia.
Não tinha como dar certo.
Como também não funcionarão novas
tentativas de resgate, que não forem construídas sobre um sistema sustentável,
pensado para, de um lado, proteger o futebol como bem cultural e, de outro,
atrair investimentos privados.
O Brasil tentou, com a Lei Pelé,
impor uma nova cultura.
Também não funcionou porque se
pensou apenas em aspectos formais.
Achava-se que a transformação em
empresa seria, por si só, a solução para os desmandos clubísticos.
Não foi e não será, pois,
empresas que não têm acesso a recursos, a financiamentos, a meios de
desenvolver suas atividades também não resistem e desaparecem.
Assim como os clubes brasileiros
e argentinos estão desaparecendo diante do poderio dos europeus, que se
organizaram para captar, investir e dominar.
Aí estão os motivos da crise do
futebol no Brasil e na Argentina.
Ambos os países, aliás, estão fazendo um
esforço monumental para destruir ativos que europeus e asiáticos pagam bilhões
para se apropriar.
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