quarta-feira, julho 04, 2018

Brasileiros especiais alegram crianças em hospital público na cidade de Samara, Rússia...




Torcedores brasileiros visitam crianças com câncer e transformam hospital na Rússia em ‘arquibancada da Copa’

Ricardo Senra

Enviado especial da BBC News Brasil a Samara (Rússia)

Um grupo de torcedores brasileiros surpreendeu crianças com câncer de um hospital público em Samara, na Rússia, na véspera do jogo da seleção nas oitavas de final da Copa do Mundo.


Às 9h, enquanto as crianças recebiam medicamentos e passavam por sessões de quimioterapia, o grupo apareceu caracterizado como "doutores da alegria" vestidos de verde e amarelo.

Eles trouxeram um saco de presentes – de óculos de palhaço a balões e bandeiras do Brasil.

Repetindo o gesto da torcida nos estádios, de gritar os nomes dos jogadores escalados para os jogos da Copa, os pequenos russos internados no "Hospital Infantil 1" também tiveram seus nomes gritados pelos brasileiros.

"Dimitri! Dimitri! Dimitri"

"Ivan! Ivan! Ivan!"

"Olga! Olga! Olga!"

Os que conseguiam se levantar foram acompanhar a trupe nos corredores do hospital e chegaram a jogar futebol com os brasileiros com balões infláveis.

Os demais receberam visitas e ganharam presentes nos próprios quartos.

"O mais marcante foi um menino com os movimentos bem limitados que tocou pandeiro para os brasileiros sambarem. Deu pra ver que ele achou o máximo os próprios movimentos terem criado um ritmo para as pessoas dançarem", disse a brasileira Ohana Berger, que estuda em Samara e atuou como tradutora voluntária entre os torcedores e os pacientes, médicos e familiares.

"Me fez pensar em como, às vezes, uma coisa besta para a gente é motivo de alegria para um menino como aquele."

Patch Adams'

Por duas horas, os pequenos se fantasiaram com os mesmos apetrechos que os torcedores usam nas arquibancadas.

A surpresa foi divulgada, em russo, pela Prefeitura de Samara.

A imprensa local descreveu a visita como uma "festa para as crianças".

O grupo, formado por médicos, empresários, estudantes e jornalistas, inicialmente resistiu a conversar com a BBC News Brasil.

"Isso não é marketing. Fizemos de coração. Não queremos que isso seja percebido como oportunismo porque não é e nunca quisemos divulgar. Você que nos achou. Nós fizemos com amor", diz o mastologista paulista Fernando Pontes, após concordar em receber a reportagem.

Antes da surpresa em Samara, o mesmo grupo tentou fazer visitas a hospitais em Moscou e São Petersburgo, mas não obteve autorização das instituições.

O médico explica a motivação: "Desde que resolvi fazer medicina, meu principal ícone e exemplo é o Patch Adams. Fui a palestras dele em pessoa, cheguei a conhecê-lo", conta Pontes, que criou o grupo "Torcedores da Alegria" em 2008, junto a amigos.

Hoje com 73 anos, Adams ficou mundialmente famoso após ser interpretado pelo ator Robin Williams em filme homônimo.

O americano defende que medicina e alegria devem caminhar de mãos dadas.

"Queríamos levar a energia e a positividade do estádio para quem não tem condições de estar no campo porque está doente", resume o mastologista.

'Primeira coisa do tipo no hospital'

Para outro dos torcedores-palhaços, a iniciativa funcionou como "um banho de cachoeira".

"De ambos os lados. Nós lavamos a alma. Perguntamos a uma das crianças se ela gostava de futebol e ela respondeu: 'sim, torço para o Brasil'", diz o publicitário José Ricardo Mannis.

"No começo elas estavam ressabiadas. Não estavam acostumadas. Depois se soltaram, jogaram bola com bexiga, teve gente que se emocionou, chorou, a reação foi muito linda", completa o empresário Bruno Zangari.

"Eu estudo isso e sei que a risada e a energia positiva ajudam na recuperação. Os estudos provam que o alto astral traz imunidade e recuperação. Quando saímos, as crianças estavam com outro semblante", diz o médico Pontes.

A reação das crianças contaminou pediatras e oncologistas do hospital, que aceita doações para manter suas atividades.

"Todos os médicos ficaram encantados e disseram que foi a primeira coisa do tipo que aconteceu neste hospital", diz a tradutora voluntária Ohana Berger.

"E todas as crianças disseram que, além da Rússia, torciam para o Brasil."

A tradutora voluntária não vai esquecer o episódio tão cedo.

"Um momento que também me marcou foi quando a enfermeira disse: 'Quem puder, pode dançar com eles!'. Nem todas as crianças foram. Algumas só mexeram os braços do lugar de onde estavam sentadas, porque não conseguiam fazer movimentos muito abertos", lembra a estudante.

Os organizadores da visita também fazem parte do Movimento Verde Amarelo, que acompanha a seleção e equipes do Brasil de outros esportes para reunir a torcida brasileira em eventos nacionais e internacionais.

"A gente não vai colocar isso nas nossas redes sociais, nunca quisemos nos promover com isso. Por favor, é muito importante que isso fique claro, a ação não tem a ver com promoção", diz Zangari.

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