quarta-feira, dezembro 05, 2012

O mendigo era uma farsa, o policial, não...




 
 Imagem: Jennifer Foster


Quem conta uma história tem que ter compromisso com a veracidade dos fatos contados...

Afinal, pouco importa se a história contada chegou a um ou a milhares de ouvidos.

Publiquei há alguns dias um fato acontecido em Nova York, onde o policial Larry DePrimo, em sua ronda normal pela cidade, acabou por ganhar as manchetes do mundo por fazer algo que deveria ser comum, normal...

DePrimo comprou do seu próprio bolso, um par de botas e um par de meias e doou a um mendigo que descalço sofria com o frio.

Aproveitei e contei como meu filho, membro do Corpo de Segurança Operacional do metrô de Brasília, costuma tratar com meninos e meninas de rua que povoam as imediações do metrô, consumindo crack e cola de sapateiro.

Ambas as histórias me pareceram dignas de compartilhar...

DePrimo não reclamou, nem podia – ele não lê o Fernando Amaral FC...

Mas meu filho sim...

Leu e me ligou para me repreender...

- “Pai, isso não era para ter ido parar no seu blog”...

Ouvi, desliguei e ri...

Fiquei pensando como os tempos mudaram...

Meu filho me repreendeu.

Entretanto, compreendo seus motivos...

O conheço, somos mais que pai e filho, somos amigos, parceiros, cumplices – enfim, somos uma dupla e tanto.

Mas voltado a Larry DePrimo e o mendigo...

Continuei a monitorar a história, sabia que haveria desdobramentos...

Uma coisa assim, não tem fim sem que antes os veículos de comunicação mexam e remexam em busca de mais informações.

Sabia que o mendigo seria procurado, sabia que iriam tentar entrevistá-lo, fotografá-lo e torná-lo uma celebridade.

Vivo nesse meio, sem como funciona.

Para a mídia, a estrela era o mendigo e não o policial...

Policia só vende quando o policial erra.

Eu estava certo, os jornais americanos “caçaram” o mendigo.

No entanto, o que encontraram vai causar profunda decepção na maioria...

Não em mim – explico depois.

O nome do mendigo é Hillman...

Hillman tem um apartamento no Bairro do Bronx, cedido pelo Departamento de Assunto de Veteranos em 2011...

Hillman, paga aluguel usando um voucher para veteranos sem teto e sua renda é complementada pelo Seguro Social.

Segundo Seth Diamond, assistente social que trabalha com moradores de rua em Nova York, Hillman é conhecido por não aceitar nenhum tipo de ajuda...

"Ele tem uma casa estável. Nós trabalhamos com Hillman por anos"...

"Sei como isso pode ser frustrante para a população. Temos tentado ajudá-lo, mas ele tem um histórico de negar qualquer ajuda", disse Diamond à rede NBC.

O assistente social ainda diz que, além de eventuais drogas e problemas mentais, Hillman deve ir para a rua descalço para poder receber mais doações das pessoas.

Bem, como fui eu que propaguei a história aqui no Facebook, achei ser meu dever, contar a verdade sobre Hillman...

Porém, quem Hillman é e o que faz, não diminui DePrimo, nem apaga o gesto.

DePrimo é sim, o policial que todos gostaríamos de cruzar num rua escura às 4 horas da manhã, quando a lei dorme e a truculência está acordada.

DePrimo é sim, exemplo e seu gesto não foi em vão.

Quanto ao fato de não me decepcionar, explico como prometi...

Já andei demais, já vi demais, já li demais e já vivi demais para sofrer com as falhas de caráter de meus semelhantes...

Cunhei numa brincadeira, mas que gosto muito:

“Devia existir prótese para caráter. Só assim, saberíamos quem perdeu e como”.

Por fim, a vida e as coisas que vivi me ensinaram a não crer que todo pobre é bom, que todo gay é vítima, que todo negro é perseguido e violentado em seus direitos...

Assim como, nem todo rico é perverso e insensível, nem todo heterossexual é homofóbico e nem todo branco é membro da Ku Kux Klan...

Canalhas e cafajestes permeiam todas as classes, todos os credos e todos os gêneros...

Por isso, não me assusto mais e nem sofro mais...

Apenas lamento, mas meu lamento é meu e como sou um só, morrerei sem ver um mundo sem canalhas e cafajestes.

Ah, quando conversei com meu filho, soube que um de seus “companheiros de lanche”, morreu...

Foi assassinado por um traficante a quem devia uns trocados...

Perguntei a meu filho o que ele sentiu quando soube...

Depois de um longo silencio ele disse:

“Ela já estava morto em vida pai, o Estado apenas sepultou seu corpo”.

“Se o senhor quer saber, fora aqueles que conviviam com ele e eu, que me senti impotente e vazio quando soube – ninguém mais ligou”...

“Ele foi enterrado como indigente. Não havia ninguém, além da policia e dos coveiros”...

“Infelizmente pai, esse é o mundo real”.


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