Um retrato das transferências de
atletas no mundo: o Brasil vende muito e recebe pouco
O mercado brasileiro tem o maior
fluxo de entradas e saídas de jogadores para o exterior, mas os clubes
nacionais recebem muito menos com vendas que os europeus
Por Rodrigo Capello para a
revista “Época”
Alex Teixeira, aos 18 anos, era
conhecido como o jogador de R$ 100 milhões do Vasco.
Tudo porque, graças ao destaque
obtido à frente da Seleção Brasileira Sub-17 naquela época, o rapaz tinha
assinado com Eurico Miranda, então presidente vascaíno, em 2008, um contrato
cuja multa rescisória era de R$ 100 milhões redondos.
A ilusão acabou quando, em 2010,
o jogador foi vendido para o ucraniano Shakhtar Donetsk por € 6 milhões.
Dava pouco mais que R$ 15
milhões.
O sucessor de Miranda na
presidência, Roberto Dinamite, precisava do dinheiro para sanar as contas do
clube e topou vender por menos do que estipulava a multa em contrato.
O tempo se encarregou de punir o
Vasco.
Os ucranianos venderam Teixeira
para a China, no início de 2016, por € 50 milhões – a bolada, feita a
conversão, soma quase R$ 220 milhões.
O Vasco foi a "vítima"
da vez, mas podia ter sido qualquer outro clube brasileiro.
O futebol nacional vende muitos
jogadores para o exterior, mas ganha pouco.
A Fifa publicou um novo relatório
sobre as transferências de atletas em todo o mundo em 2016.
O Brasil faz jus à fama de
exportador de pé de obra: 806 jogadores profissionais deixaram o país rumo a
outros mercados.
Se você comparar com a quantidade
de atletas que outras nações exportaram, vai ficar com a impressão de que somos
grandes.
Logo depois do Brasil vêm a
Inglaterra, a Espanha e a Argentina.
Nas importações, o Brasil também
aparece no topo, com 678 atletas transferidos de clubes estrangeiros para
nacionais.
Depois aparecem Inglaterra,
Portugal e Espanha.
Numericamente temos, portanto, o
maior fluxo de entradas e saídas de jogadores profissionais no planeta.
Acima de europeus, dos vizinhos
latinos e da sensação, a China.
Mas não se deixe levar pela
quantidade.
O sistema da Federação também
registra os valores envolvidos nas transferências, e aí a coisa fica feia para
nós.
O Brasil é o décimo maior país em
investimentos, com US$ 85 milhões gastos por clubes daqui em atletas vindos de
lá.
A Inglaterra gasta 16 vezes mais
que o Brasil em transferências, mas, vá lá, sabemos que os ingleses têm o
futebol mais rico do mundo.
Só que o mercado brasileiro
também perde para o português, o russo e o belga.
Há explicações fora do controle
dos cartolas que amenizam a fragilidade financeira dos nossos clubes. Uma delas
é o câmbio.
Se o real vale um quarto do euro,
os times nacionais vão ter quatro vezes mais dificuldade para contratar quem
vem de fora.
Além disso, há territórios, como
a Rússia, em que bilionários do petróleo usam o futebol como ferramenta
política para bajular governos.
Só que nada disso explica o
quadro sobre quanto arrecadamos com exportações.
O Brasil, apesar de ser o maior
exportador de jogadores do mundo, é só o sétimo em arrecadação.
Os clubes brasileiros faturaram
US$ 264 milhões em 2016 com as vendas de atletas para o exterior, 29% mais do
que em 2015.
É menos da metade do que
arrecadaram os espanhóis.
Também estão à frente dos
brasileiros em faturamento italianos, franceses, portugueses, alemães e
ingleses.
Façamos um outro cálculo para
deixar mais clara a disparidade entre latinos e europeus.
Na média, cada jogador vendido
pelo Brasil custou US$ 327 mil ao clube estrangeiro.
A média argentina é um pouco
pior, com US$ 297 mil por atleta.
Ambas não se comparam com as da
Itália, França e Espanha, países com uma média superior a US$ 1 milhão
arrecadados para cada jogador vendido para o exterior.
Esse é um sintoma do futebol
brasileiro que também se nota na economia.
A matéria-prima exportada em sua
forma bruta tem um valor.
Aquela que recebeu algum tipo de
processamento e tecnologia, um valor muito maior.
Pare para pensar.
O jogador brasileiro tem
naturalmente uma desvantagem na língua: só se fala português no Brasil.
Os padrões táticos, técnicos e
físicos empregados por brasileiros são visivelmente desatualizados em relação a
europeus – você certamente já ouviu especialistas vaticinarem que uma revelação
precisava jogar na Europa para continuar a evoluir.
Também há adaptação ao clima, à
rotina, à sociedade.
É menos arriscado para um europeu
contratar um brasileiro que esteja em Portugal do que um vindo direto do
Brasil.
Não por acaso os portugueses têm
a quinta maior exportação numérica e a quarta em valores: cada jogador sai por
US$ 875 mil em média.
Em relação a esses fatores, não
há desculpa: o cartola brasileiro precisa qualificar melhor o atleta brasileiro
enquanto ele ainda está em casa, dentro e fora de campo, para não se sair tão
mal nas vendas.
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