terça-feira, julho 30, 2019

Foram matá-lo, acabaram falando de futebol... Genocídio em Ruanda.

Imagem: Autor Desconhecido

A história do goleiro que sobreviveu ao genocídio de Ruanda

Foram matar Toto Murangwa em sua casa e acabaram falando de futebol

Juan José Lahuerta, jornalista do EFE, contou em um artigo recente a história de Toto Murangwa, goleiro de uma das equipes mais importantes de Ruanda, e uma das estrelas da liga.

Durante a guerra civil entre 1990 e 1994, o futebol no ficou à margem das tensões.

As três divisões da competição nacional se mantiveram, mas as equipes estavam infiltradas e politizadas pelos grupos em luta: os rebeldes da Frente Patriótica Ruandesa (RPF, sigla em inglês), dominada pelos tutsis, e os apoiadores do Governo de Juvénal Habyarimana, da etnia hutu.

“Os oficiais comandantes do Exército intimidavam árbitros e jogadores, inclusive mandando prender. Deixei de viajar para o norte de Ruanda – onde começaram os ataques do RPF – quando minha equipe jogava na região. Uma vez tive que sair correndo do estádio. Assim era a atmosfera. Com a queda do avião era possível esperar que aconteceria tudo que acabou acontecendo. Mas nunca imaginei que toda a população se voltaria contra os tutsis. Não ao nível em que vizinhos, amigos e, em alguns casos membros da própria família, fariam o que fizeram.”

A queda a que se refere Murangwa é do avião do presidente Habyarima, ocorrida em 6 de abril de 1994, pouco antes de aterrissar no aeroporto de Kigali. Seu assassinato foi o que motivou a matança coletiva iniciada por hutus radicais que exterminou entre 20 e 40% da população de Ruanda, que era na época o país mais densamente habitado da África, com sete milhões de pessoas.

Horas depois do atentado, Murangwa dormia em sua casa com um amigo.  Ao amanhecer do dia seguinte, meia dúzia de soldados entraram no local derrubando a porta, acusando os dois de pertencer a RPF e de haver colaborado com o plano que matou o presidente.

Quando estavam mexiam nas coisas e se preparavam para executar os dois, um album de fotos caiu no chão e abriu justamente na página em que aparecia uma imagem de Murangwa vestindo o uniforme do Rayon Sports.

Um dos soldados, torcedor fanático da equipe, reconheceu o uniforme do time.

“É você na foto? Sim.  Ele voltou a olhar a fotografia e me questionou se eu era Toto... Sim, sou eu”, contou o goleiro.

Neste instante, o soldado ordenou a seus subordinados que saíssem da casa.

Sentou-se no sofá com Murangwa e começaram a falar de futebol, especificamente de uma partida disputada contra um time sudanês.

“Você lembra daquele gol? Você se lembra daquele drible? Daquela entrada? Se recorda do fez aquele jogador?, me perguntava. Isso me deu esperanças. No fim, ele se foi.  Minha vida e a vida de meu companheiro havia sido poupada. Esse foi o primeiro dia do genocídio e foi nele que minha vida esteve perto da findar. Mas foi salva pelo futebol”.

Depois daqueles dias terríveis, Murangwa se reencontrou com cinco de seus companheiros do Rayon Sports e voltou a jogar.

Outras equipes fizeram o mesmo.

Foi tudo muito rápido, antes que percebêssemos estávamos jogando novamente.

As novas autoridades que assumiram o país depois da tragédia investiram pesadamente em programas de recuperação e de reaproximação entre as pessoas...

A Fundação Ishami (Ishami Foundation) é um desses instrumentos que buscam através do futebol e das histórias dos sobreviventes, erradicar o ódio e devolver aos que foram perseguidos e que sofreram com a dor de perder parentes e amigos a esperança na vida e no futuro.

“Nós que dedicamos nossas vidas à Ishami Foudation queremos que quando um jovem jogue futebol o faça sonhando em ser o próximo Messi, o próximo Ronaldo, ou o próximo Longin, o amigo me ajudou a sobreviver durante os anos de genocídio”.

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