sábado, fevereiro 29, 2020

Um esqueleto no armário de Felipão...

Imagem: Autor Desconhecido

Um esqueleto no armário de Felipão

Uma declaração sobre Pinochet, dada pelo treinador há mais de 20 anos, causou a fúria de uma parte da torcida do Colo Colo contra a contratação de Scolari

Pedro Henrique Brandão Lopes

Bastou a imprensa chilena ventilar as primeiras notícias sobre o interesse da diretoria do Colo Colo em contratar Luiz Felipe Scolari, para despertar uma onda de protestos da torcida organizada do clube que se posicionou contra a chegada do treinador.

Difícil entender como pode um bem-sucedido treinador, campeão de Copa do Mundo e gabaritado com títulos e passagens vitoriosas em grandes clubes do Brasil, ser rejeitado pela torcida de um time que não anda nada bem nos últimos tempos.

É preciso retornar ao longínquo ano de 1998. Naquele ano, Felipão dirigiu o Palmeiras em sua primeira e mais vitoriosa passagem pelo clube.

O gaúcho já havia conquistado muita coisa importante no Grêmio e era bastante calejado no contato com a imprensa, mas o choque dos primeiros contatos com os jornalistas paulistas causou algumas situações que ajudaram a caricaturar o já naturalmente polêmico Felipão.

São desse período as acaloradas coletivas de imprensa que se transformavam em ringue em que jorravam declarações como a “turma do amendoim”.

Quando o pedido por uma entrevista exclusiva era atendido, estava aberta a Caixa de Pandora do treinador.

Foi numa dessas exclusivas, que Felipão deu uma declaração sobre a prisão de Augusto Pinichet, na Inglaterra. Disse o treinador à Rádio Jovem Pan, no dia 28 de outubro de 1998:
“Pinochet fez muita coisa boa também. Ajeitou muitas coisas lá (no Chile). O pessoal estava meio desajeitado. Ele pode ter feito uma ou outra retaliaçãozinha aqui e ali, mas fez muito mais do que não fez… Há determinados momentos que ou o pessoal se ajeita ou a anarquia toma conta”.

Felipão errou no tom, no conteúdo, se meteu em algo que visivelmente desconhecia, pois ignorou as mortes, a tortura, as prisões, o roubo e até o tráfico de drogas do regime de Pinochet.

Errou ainda mais por se entregar ao afã do qual padece boa parte de nosso povo: uma necessidade incontrolável de ter opinião sobre tudo.

Afinal o que o treinador do Palmeiras teria de opinar sobre a prisão de um ditador latino-americano que aconteceu no Reino Unido?

Pois é, nada.

Porém, em última análise, Felipão deu uma declaração de apoio ao absurdo regime totalitário e isso marca qualquer um.

A conta, às vezes demora a chegar, mas sempre chega.

Hoje em baixa, depois de ser escorraçado do Palmeiras, mesmo depois de conquistar o Brasileirão 2018, Felipão poderia encontrar no Colo Colo a reabilitação de seu trabalho e a saída para uma aposentadoria digna.

É bom lembrar que a declaração foi usada despudoradamente pela imprensa chilena antes do confronto da seleção daquele país contra o Brasil, válido pelas oitavas de final da Copa do Mundo de 2014.

A ideia era inflamar os chilenos que fossem ao Mineirão e incendiar as arquibancadas contra os donos da casa com gritos de “Felipón, amigo de Pinochet torturador y ladrón!”.

Dessa vez a repercussão foi imediata. Além da reação de repúdio e a declaração de guerra à Felipão feitas pela torcida organizada Antifascistas De La Garra Blanca, a diretoria agiu rápido para abafar o mal-estar com seus torcedores e parece ter desistido da negociação:

“É verdade que a gente sondou o Scolari e ficamos de fazer uma reunião quando ele decidisse. E aí, este tema apareceu. Seria uma imprudência considerar este técnico depois de conhecer estas declarações.”, falou à ESPN, o diretor do Colo Colo Ángel Máulen.

Apesar da inconteste idolatria em Grêmio e Palmeiras, além do ótimo serviço na Seleção Brasileira em sua primeira passagem quando venceu o Mundial, Felipão tinha um esqueleto no armário e os Antifascistas De La Garra Blanca, ao exumar o tal esqueleto, descobriram que era de Augusto Pinochet e, principalmente, em razão dos tempos tão conturbados no Chile, estão dispostos a declarar guerra ao veterano treinador.

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