Os urubus no nosso quintal
Por Paulo Calçade
Para o jornal o Estado de São
Paulo
No tempo em que as novidades
demoravam a chegar por aqui, ninguém precisava se preocupar com o que Real
Madrid ou Milan faziam na Europa.
As potências do futebol não
competiam com os times brasileiros.
Estavam tão longe que a distância
bastava para proteger os gigantes erguidos em nosso quintal de qualquer tipo de
ataque.
Nosso esporte sempre funcionou na
banguela, movido pela força da gravidade e pela administração amadora dos
cartolas.
Era o suficiente para competir e
sobreviver.
Pouco importava se havia algum
ponto de intersecção com o resto do planeta.
Primeiro exportou-se o estilo,
depois o artista, hoje é normal encontrar jogadores da seleção brasileira
jogando no robusto mercado chinês.
Vale apenas pelo dinheiro,
tecnicamente a troca é insignificante.
Agora nossos “craques” abastecem
a periferia do futebol mundial.
Será que ninguém se pergunta o
que isso significa?
Seria um movimento natural?
O que se vê, incluindo o 7 a 1 da
Copa do Mundo, é um pedido de socorro já com o naufrágio em curso.
É impossível entender porque os
dirigentes não se mexem para importar boas ideias.
A maioria frequenta regularmente
as ligas organizadas, sabe muito bem como as coisas funcionam.
Então não custa fazer aquela
perguntinha clássica da coluna: a quem interessa o caos nosso de cada dia?
A semana começa com dois vetores
de mudança.
Um está na Câmara dos Deputados,
propensa a aprovar uma versão da Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte sem
as devidas e necessárias contrapartidas dos clubes, o outro virá do forno da
Casa Civil, que costura Medida Provisória mais abrangente, favorável ao País e
ao futebol.
A tarefa do governo é tentar
convencer os parlamentares a emplacar um projeto mais duradouro e moderno, que
faça realmente valer a pena renegociar uma dívida próxima dos R$ 4 bilhões.
O cenário político e as
características desse Congresso não animam, mas quem garante que a lógica não
possa ser contrariada.
Do jeito que está, A LRFE vai ser
apenas um remendo.
Nossas raízes nos levam a crer
que o futebol jogado por aqui é indestrutível.
Se vaidades forem deixadas de
lado para a construção de um compromisso de regulação do setor, uma nova e
surpreendente perspectiva será aberta para esta importante atividade econômica
e cultural do Brasil.
Mercados frágeis e desregulados
como o nosso estão sob intenso ataque.
É fato que clubes como o
Barcelona, por exemplo, não contentes em apenas levar nossos jogadores,
inclusive os meninos, agora fisgam também verbas do mercado publicitário
nacional, que poderiam muito bem ficar por aqui.
É o que ensina quem já aprendeu a
disputar o jogo globalizado.
Sem a expansão como negócio, para
que seja possível diminuir a desigualdade e ampliar a responsabilidade, vai
ficar tudo como está.
Não é apenas uma lei que vai
tornar um clube brasileiro capaz de competir mundialmente.
Mas é o ponto de partida.
Provavelmente o embate político
não tenha sensibilidade para perceber a delicadeza da situação.
A realidade pede esforço e
coragem para solucionar a crise administrativa e sua consequência técnica, que
nós tão bem conhecemos.
Na dúvida, assista aos moribundos
campeonatos estaduais, incapazes de preencher as necessidades de clubes grandes
e de pequenos.
Ricardo Goulart foi negociado com
o Guangzhou Evergrande e Diego Tardelli, também da seleção de Dunga, foi parar
no Shandong Luneng.
Jadson só não virou chinês porque
não aceitou o Jiangsu Sainty, oitavo colocado do campeonato do ano passado.
Choramos nossa insignificância ou
trabalhamos por uma nova regulamentação, para crescer e expulsar os urubus do
quintal?
A resposta está com nossos
parlamentares.
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