A humilhação dos cartolas
Por Paulo Calçade para o “Estado
de São Paulo”
Engana-se quem enxerga a Medida
Provisória do futebol como intervenção do Governo no comando do esporte
brasileiro, como acreditam Fifa, CBF e seus filhotes, as federações.
A MP é mais que isso, é a
humilhação dos cartolas responsáveis pela falência dos clubes, avalistas da
miserável qualidade do jogo que se pratica por aqui.
Para entender a abrangência da
proposta, agora no âmbito do Congresso, ainda fortemente influenciado pelo
esgoto da gestão esportiva, é necessário deixar de lado as questões
partidárias.
Esqueça, nesse caso, o ringue da
batalha política cotidiana.
A bancada da bola abriga gente
pró e contra o impeachment da presidente Dilma.
No mundo particular do futebol
existe, porém, apenas uma agremiação.
Não se iluda, a lógica que
moldura, tais interesses é diferente de tudo o que você conhece.
A principal voz de oposição ao
projeto vem do próprio PT, o deputado Vicente Cândido, sócio de Marco Polo Del
Nero, eleito presidente da CBF, em escritório de advocacia.
Não custa lembrar que a primeira
proposta de socorro aos clubes tentou emplacar o pagamento de apenas 10% das
dívidas.
O restante seria saldado com a
formação de atletas olímpicos.
Ninguém reclamou dessa mamata,
como protestam em relação ao investimento no futebol feminino, uma das
contrapartidas exigidas pela MP.
O novo texto é um avanço
fenomenal, tenta restringir a ação dos mandachuvas que arruinaram o futebol do
País.
É natural que essa turma mobilize
seus agentes para evitar regras de gestão e de responsabilidade fiscal.
Dinheiro fácil para financiar
loucuras, todos desejam.
Trabalhar com as contas
controladas e auditadas, ninguém suporta.
Por isso gritam contra a
limitação dos gastos com folha de pagamento e direitos de imagem dos jogadores
a 70% da receita bruta anual.
Não é difícil entender porque os
clubes estão falidos.
Ninguém é obrigado a aderir ao
refinanciamento das dívidas, que fique bem claro.
No entanto, para desfrutar do
pacote de bondades é preciso uma adequação ao que poderia muito bem ser
definido como Projeto de Saneamento da Cartolagem Nacional, como aceitar
participar somente de campeonatos nos quais os mandatos dos cartolas estejam
limitados a uma reeleição.
É pouco oito anos de poder?
Joseph Blatter, desde 1998
presidente da Fifa, atendendo a demandas pessoais e de Marins & Afins, teve
a cara de pau de relembrar que a entidade não tolera interferências dos
governos no futebol.
E, como sempre, colocou-se à
disposição: se a CBF solicitar, ele manda investigar o caso.
Governos são mesmo péssimos para
Blatter.
A receita bruta do Mundial de
2014 foi de R$ 15,7 bilhões, a maior da história da competição.
Só de isenção de impostos, a Fifa
embolsou R$ 1,1 bilhão da bondade brasileira.
E o cartola ainda faz ameaças?
E sobre o calendário obsceno da
CBF, alguma menção?
E a demissão em massa de
jogadores ao final dos estaduais, está preocupado?
O resultado comercial da Copa do
Mundo de 2014 foi tão extraordinário, tão fenomenal, que deixou os cartolas da
Fifa boquiabertos.
Mas não a ponto de perderem os
sentidos e a oportunidade para ampliar seus próprios salários.
Como se trata de uma entidade
privada, sabemos que eles não precisam explicar o dinheiro faturado com o
futebol, mesmo sendo uma medida simpática e transparente.
A edição da Medida Provisória é o
apito inicial do Fla-Flu que tomará o Congresso na discussão da MP.
É impossível prever o que vai
acontecer.
Certo é que os interesses ficarão
expostos.
E tem clube achando que a saída
da crise é recuperar o mata-mata!
Isso explica o caos nosso de cada
dia.
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