Imagem: El País/Carlos Juica
O fenômeno dos Ronaldos no México
A fase áurea do centroavante brasileiro inspirou o nome de mais de
8.120 bebês no país; 123 deles viraram jogadores de futebol, e um já chegou à
primeira divisão
Por Diego Mancera para o El País
Mario Cisneros assistia a
qualquer jogo que pintasse na telinha.
Aproveitava que havia contratado
um canal pago.
Nos finais de semana, via o
Barcelona e, em especial, aquele centroavante que sempre marcava.
Era Ronaldo Nazário.
Cisneros não lembra o dia, mas
sim que o brasileiro fez três gols.
Teria sido contra o Valencia?
Contra o Atlético?
Tanto faz.
O fato é que, por causa daquele
hat-trick, esse cidadão de Torreón, (norte do México) decidiu que seu filho se
chamaria Ronaldo.
“Não precisamos mais procurar um nome. Vou colocar Ronaldo”, disse
Mario à sua esposa, Olga, quando esperavam o primeiro filho.
Ela preferiu assim, em vez de o
menino herdar o nome do pai ou do avô.
Mas a euforia de ter encontrado o
nome ideal diminuiu quando ela pensou nas consequências disso para o garoto.
“E se ele não gostar de futebol? Nunca se sabe. Talvez ele goste, mas
não jogue bem. Se não gostasse, talvez dissessem que ele não joga nem bola de
gude. Com esse nome iriam rir dele”, comenta o pai na sala da sua casa.
Cisneros foi ao cartório de
registro civil com uma folha de papel.
Plantou-se na frente da
escrevente.
“Assim como está escrito”, pediu.
O papel dizia: Ronaldo Cisneros
Morell.
“Levei o nome por escrito para que não errassem”, comenta,
lembrando as frequentes correções nas certidões de nascimento mexicanas.
O nome Ronaldo se popularizou no
México a partir do estrelato do atacante brasileiro.
Segundo um pedido de informação
feito pelo EL PAÍS ao registro civil, a partir de 1996 começaram a ser
registrados bebês com esse nome.
Num período compreendido entre
1º. de janeiro de 1996 e 24 de abril de 2017 há 8.129 mexicanos batizados dessa
forma.
O primeiro deles a virar jogador
de futebol tem o sobrenome Cisneros.
Na base de dados da Federação
Mexicana de Futebol há 123 atletas chamados Ronaldo.
Nomes como Ronaldo Romário Cinta,
José Ronaldo Piña, Oliver Ronaldo e Ronaldo Zinedin, que por sinal é colega de
Cisneros.
Todo um catálogo de combinações
onomásticas.
Estes nasceram a partir de 1994,
ano em que o Brasil foi campeão do mundo.
Nos registros também se destacam
nomes como Beckham Martínez e Ronaldinho Marroquín.
O futebol se tornou essencial
para alguns mexicanos na hora de escolher o nome dos filhos.
Ronaldo Cisneros tem 20 anos.
É atacante e joga no Santos
Laguna.
Seus amigos o chamam de Ron.
“Com os professores eu tive vários problemas. Me chamavam por outro
nome: Rolando, Rodolfo, ou achavam que esse não era o meu nome”, lembra o
garoto, que já vestiu a camisa do México no Mundial Sub-20 deste ano e marcou
dois dos quatro gols da Tricolor.
E usou o número nove.
Do nome herdou o apetite
artilheiro.
“No primário me perguntavam por que tinham me dado esse nome, se era
pelo Cristiano Ronaldo ou por causa do Fenômeno”, conta o jovem, que usava
camisas com o nome e sobrenome de ambos – e também de Messi.
O pequeno Ronaldo começou a jogar
bola aos cinco anos.
Seu treinador no Peñoles o
colocou como centroavante.
“Nunca o tiraram dessa posição. Quando joga, responde. A cada dia vejo
que se especializa mais. Tem facilidade para fazer gols”, diz o pai.
Cisneros foi goleador desde
pequeno, no sub-17, no sub-20 e em torneios internacionais com a seleção de
base.
Na sua casa, em meio aos troféus,
se destaca a chuteira de ouro que ganhou como artilheiro do pré-mundial sub-20.
Atualmente, está inscrito na
equipe principal do Santos Laguna, embora jogue entre os juvenis, onde soma
nove gols em oito partidas – um a cada 69 minutos.
– Você daria ao seu filho nomes
como Pogba, Neymar, Ibrahimovic ou algum outro jogador?
– Sim, se eu gostar do nome –
responde Ronaldo. – Se for o nome de um jogador, de um cantor ou da Bíblia, se
respeita e é normal, porque a gente gosta.
Seu Mario tinha no quarto um
pôster do Ronaldo brasileiro.
Seu filho tem as fotos de
Cristiano Ronaldo, Raúl, Van Nistelrooy e Beckham.
O pai dele nunca lhe comprou uma
camisa do Brasil, nem rapou seu cabelo como fez o brasileiro.
A idolatria pelo ex-craque não
chegava a tanto.
Ronaldo usa a nove desde as
categorias inferiores.
Mas no seu primeiro clube
precisou se contentar com a 29, e quando o Santos Laguna lhe permitiu escolher
e lembrou desse número.
“Me dá sorte”, diz.
Na sua temporada de estreia,
vestiu a 97, pelo ano do seu nascimento – e talvez também por ser, de alguma
forma, a combinação entre o nove de Ronaldo Nazário e o sete de Cristiano.
“A qualquer momento pode chegar a possibilidade. Atualmente as vagas no
ataque são ocupadas por estrangeiros”, reflete o atacante, que soma 127
minutos na primeira divisão.
O futebol do México, cada vez
mais carente de centroavantes, tem o seu Ronaldo.