quinta-feira, junho 02, 2011

Descanse em paz Márcia... vou sentir sua falta.


Nada tem haver com futebol e, certamente nada tem haver com os leitores desse espaço, mas desculpe caro leitor, esse espaço é meu e, por essa razão, quero dedicar algumas linhas a Márcia...


Márcia só... poderia ser seu nome completo...


Nunca soube seu sobrenome e esse fato nunca fez nenhuma diferença.


Mas sabia de sua solidão e isso, sempre fez muita diferença.


Márcia era uma moça como muitas outras moças...


Entretanto, em algum momento, a vida a abandou a sua própria sorte, ou quem sabe, ela tenha abandonado a vida e se deixado levar pelas mãos pelo infortúnio.


Márcia não era feia, poderia ter sido até bonita se as drogas, o álcool e o sexo sem cuidado e sem amor não a tivessem transformado numa caricatura de si mesma.


Márcia tinha um sorriso bonito, um olhar meigo e seus gestos eram suaves e doces...


Tinha o costume de me chamar de meu querido e jogar beijos quando a distancia cruzava meu caminho...


Mas ela sempre dava um jeito de se aproximar com suas roupas maltrapilhas, suas mãos sujas e seu jeito de menina meiga e assustada...


Chegava de mansinho...


Me abraçava, ficava na ponta dos pés e me beijava o rosto e dizia baixinho: “me dá um cigarro e uma pratinha”...


As pessoas à volta pareciam se incomodar... engraçado, nunca senti repulsa, nunca me esquivei ou a afastei...


Sempre retribui o beijo, mesmo quando o cheiro do álcool era quase insuportável.


Não sei quantos cigarros ou quantas pratinhas lhe dei...


Mas sei que gostava dela.


Certa vez, resolvi sentar a seu lado na pracinha do cruzeiro na Vila de Ponta Negra e lhe perguntei se havia alguma coisa que eu pudesse fazer por ela...


Ela sorriu e disse:


- Como assim meu lindo?


- Você não tem vontade de deixar tudo isso e tentar recomeçar?


- Não meu lindo... recomeçar para que?


- Não tenho para onde ir e nem para quem voltar...


Senti um nó na garganta quando ela com os olhos molhados de lágrimas, mas ainda sorrindo me segurou a mão e encerrou a conversa com as seguintes palavras.


- Meu lindo, eu sou ninguém e ninguém liga para quem é ninguém...


- Cuida de sua vida, mas nunca deixe me dar um cigarro e uma pratinha.


Levantei e segui meu caminho me sentindo um lixo.


Ontem, por volta do meio dia soube que seu coração havia parado e que ela estava morta...


Senti um imenso vazio e uma vontade enorme de ir vê-la, mas recuei e não fui...


Apenas lembrei-me de uma frase dita por um médico de um campo de prisioneiros na União Soviética a um prisioneiro que pranteava um companheiro morto pela fome e pelo tifo:


“Nenhuma morte é triste, quando o que havia antes, não era vida”.


Hoje, quando for trabalhar, possivelmente irei separar o cigarro e a pratinha, mas ela não virá e então, só me restará o desejo que a morte dê a Márcia a paz e o sossego que ela não conseguiu enquanto caminhou pelas ruas, vielas e becos da Vila de Ponta Negra.


2 comentários:

MÚSICA F. C. ! A VOZ DAS ARQUIBANCADAS. disse...

Belo texto e uma situação dramática.

HONÓRIO RIBEIRO DANTAS NETO disse...

QUANTAS MÁRCIAS NÃOEXISTEM EM NOSSA CIDADE, NESSE RIO GRANDE DO NORTE VELHO, NO BRASIL, IMENSO, COM MILHARES DE MÁRCIAS A LHE POVOAS AS ESQUINAS, TODOS OS DIAS, HEIM,FERNANDO? ATÉ QUE PONTO ELA ESCOLHEU SER UMA "NINGUEM"? QUANTAS MÁRCIAS DESISTEM DE SI MESMAS TODOS OS DIAS? FERNANDO, ME EMOCIONOU NÃO SOMENTE O TEXTO, MAS LHE CONHECENDO, EU AGRADEÇO, EM NOME DE TANTAS MÁRCIAS E MÁRCIOS QUE EXISTEM POR AÍ, CADA MINUTO EM QUE VOCÊ SENTOU JUNTO DELA. NESSES MINUTOS, AMIGO, POR TER ALGUEM A LHE ESCUTAR, A MOSTRAR CARINHO, COISA BÁSICA NA VIDA DE TODO SER HUMANO, ELA FOI ALGUEM... UM ABRAÇÃO DO AMIGO HONÓRIO.