Oficialmente, Natal foi anunciada como uma das 12 cidades-sedes do mundial de 2014, no dia 31 de maio de 2009...
Mais de dois anos se passaram e ainda se discute sobre ombros de quem deve pesar a responsabilidade pela falta de um estádio alternativo em Natal.
Para ser totalmente verdadeiro, o problema se arrasta desde o dia 4 de junho de 1972, quando o Estádio João Cláudio de Vasconcelos Machado (Machadão) foi inaugurado – de lá até cá, jamais se pensou nessa possibilidade...
O Machadão visto como a redenção do futebol norte-rio-grandense e símbolo de sua pujança – mesmo que nunca tenha sido concluído –, havia chegado para ficar e com ele, segundo se imaginou todos os problemas estavam resolvidos...
Não estavam.
Ninguém imaginou dias cinzentos.
No Brasil não se imagina dias cinzentos, quando alguém ousa tocar em tal possibilidade, logo é acusado de pessimista, derrotista, fracasso-maníaco ou de sofrer da síndrome do vira-lata...
Nessas terras banhadas pelo mar e iluminadas pelo sol, desejos e decretos resolvem tudo, mas caso não seja bem assim, logo aparece um espertalhão e cria um embuste, um “jeitinho” e todos aplaudem a manobra...
Somos todos, mesmo sem saber, personagens da Terra do Faz de Conta.
E, foi fazendo de conta que tudo estava em seu lugar, que seguimos radiantes com o novíssimo Machadão.
O Juvenal Lamartine foi deixado à própria sorte e de berço da história do nosso futebol, passou a ser moradia de baratas e ratos.
Até mesmo um velho bode passou anos a caminhar sereno e tranquilo pelo gramado que um dia viu desfilar os nossos primeiros ídolos, a podá-lo como se máquina de cortar grama fosse.
Mas, quem se importava afinal?
Ninguém!
O Machadão lá estava e era o grande orgulho da cidade e de seu futebol.
Essa era a palavra de ordem, o chavão ufanista cantado em prosa e verso pelos líderes da época e reverberado exaustivamente pelos animadores de plantão sempre prontos a dar seu quinhão de colaboração para tornar a manada dócil, satisfeita e crédula que Deus, os Orixás e todos os espíritos do bem que vagueiam pela terra, são brasileiros e votam sempre na situação.
O Machadão, era lindo, era grande, era moderno e nos colocava no primeiro escalão do mundo da bola.
O tempo voou e passou...
O futebol brasileiro saiu dos feudos estaduais e se nacionalizou...
Nossas equipes, mal ou bem, entraram na disputa.
Era preciso estar pronto, ter uma alternativa, caso algum imprevisto atingisse o colosso de concreto chamado Machadão...
O Alecrim vitima de um gerenciamento personalista, amador e de curta visão, perdeu sua capacidade de investir...
O clube ainda hoje, luta para se manter vivo: construir um estádio é delírio que nenhum alecrinense pode se dar ao luxo de ter.
O América teve sua chance...
Foi lá pelos idos de 1999, quando vendeu o Estádio General Everardo...
Mas, salvo honrosas exceções, prevaleceu a arrogância e o estádio foi trocado pela construção do Centro de Treinamento Abílio Medeiros, que chegou a ser tratado na época por alguns, como Centro Internacional de Treinamento Abílio Medeiros (quem criou tal adjetivo, certamente nunca foi sequer a Bolívia).
A ideia era segundo seus defensores, transformar o CT numa fábrica de craques e, concomitantemente, atrair para Natal clubes europeus para realizar no local, suas pré-temporadas...
O mais triste é que teve muita gente boa que acreditou que formar craques era tarefa corriqueira, barata e de fácil colheita...
Talvez essas pessoas ainda estivessem influenciadas pela carta de Pero Vaz de Caminha, que dizia: “Nessa terra, em se plantando tudo dá”.
O pior é que muitos acreditaram que bastava mandar um folder ou fazer uma visitinha a Europa e logo, haveria filas de times do velho continente a tentar sua inscrição na longa lista de espera por uma vaga para treinar sob o sol de “Parador”.
No final, nem craques, nem o Rosenborg, nem o AIK Stockholm, nem o KB Kobenhavn, nem o Ilves Tampere e nem qualquer outro clube europeu, veio se bronzear por essas plagas.
Sol por sol, essas equipes preferiram continuar a frequentar a costa croata, italiana, francesa ou as cidades africanas banhadas pelo mediterrâneo.
Natal é longe demais...
E, se alguém se der ao trabalho de pesquisar, vai descobrir que o que não falta na Europa são hotéis, estâncias e locais prontos para receber com conforto e infraestrutura qualquer equipe de futebol.
Mas e daí?
Devem ter pensado os dirigentes americanos...
Agora, não podemos investir em nossas categorias de base, pois temos que contratar times capazes e vencer competições – afinal, futebol é resultado e nossa torcida é exigente –, um dia o faremos e até lá, com um pouco de sorte, surgirá um Souza a cada dois anos.
Se os clubes europeus não se interessaram, devem ter dito: azar o deles!
Mal sabem que o que estão perdendo...
Vão deixar de passear nas dunas, ir ao circo da folia, curtir o forró com o turista, pegar um bronze em Ponta Negra e o pior: nunca vão poder contar que participaram do maior carnaval fora de época do mundo.
Foi mais ou menos assim, que o estádio rubro virou fumaça.
Veio então o ano de 2006...
O ABC apostou suas fichas na construção de seu estádio...
Surgiu o Maria Lamas Farache...
Enfim, Natal tinha seu estádio alternativo.
Mas, um pequeno detalhe foi esquecido...
O estádio recém-construído era particular e para seu proprietário, o ABC, o Maria Lamas Farache não era alternativo...
Era sua casa definitiva, seu canto, sua morada.
O América então cunhou um slogan para curar a dor de cotovelo: “O Machadão é nosso”!
Não era e nunca foi...
O Machadão sempre foi um patrimônio público e como tal, administrado pelo poder público – pessimamente administrado, diga-se de passagem – e, portanto, sujeito aos caprichos ou necessidades de seus administradores.
Mais uma vez o tempo passou e a sonolenta Natal foi sacudida com sua escolha para sediar um dos grupos do mundial de futebol a ser realizado em 2014 no país...
Projetos surgiram...
Alguns simples, outros megalomaníacos...
Uns propunham a construção de um novo estádio e outro defendia a derrubada do velho Machadão para em seu lugar ser erguido mais um símbolo da grandeza verde e amarela...
Acabou vencendo a ideia de se derrubar o velho e construir um novo...
Aplausos, protestos e todo o tipo de reação surgiram...
Porém, ninguém parou para pensar...
E aí galera, mas o que vai ser de América e Alecrim quando o Machadão cair?
Ninguém teve esse bom senso...
Muito pelo contrário...
Mais uma vez, o governo sem nenhuma politica desenvolvimentista voltada para o esporte, se fingiu de morto.
Ao invés de conciliação, alvinegros e alvirrubros, partiram para alimentar uma rivalidade primata, estupida, desprovida de qualquer racionalidade ou visão econômica...
O Alecrim, que pouco ou nada podia fazer, diante da briga dos “dobermanns” ensandecidos, esperou e confiou que alguma solução surgiria...
Errou!
Nenhuma solução surgiu...
O governo não tinha nenhuma solução a ofertar e fez o que sempre fazem os governos: acham algum politico pateta disposto fazer às vezes de negociador, marcam pomposas reuniões, ouvem, e por fim, prometem...
Prometem e não cumprem, pois sabem que nada vai acontecer a não ser um grito ali, um muxoxo acolá e no fim, todos vão cantar e dançar nesse eterno baile da ilha fiscal que é o Brasil.
Para não me alongar mais ainda, nesse texto repleto de verdades históricas facilmente comprováveis, mas com alguma pitada de romanceio; digo que nada pode ser mais triste para uma pessoa, um povo ou uma instituição, que o marasmo, a inércia e a completa falta de planejamento...
Um dia, em algum lugar do passado, foi possível mudar o futuro, mas alguém deve ter dito que havia tempo de sobra e que o futuro estava longe demais para causar preocupação.
Talvez por isso, a realidade seja hoje, o Nazarenão em Goianinha.
Talvez por isso, tenhamos construído um país bem menor do poderíamos ter.
2 comentários:
Caro Fernando Amaral;
Parabéns por mais um brilhante texto, onde você de forma pitoresca retrata a verdade que muitos não ousam falar.
Ainda custo para acreditar que Natal, deformada como está, seja sede de alguma coisa! Vão destruir o Machadão e nada será construído.... E toda a população mais uma vez ficará inerte, aguardando usufruir o legado de uma copa que passou por aqui, pela quantidade de dinheiro já gasto e que não aconteceu, em razão falta de visão dos que fazem de Natal a princesa adormecida de uma copa que ao menos por aqui não vai acontecer.
Parabéns,Fernando Amaral,por nos presentear com mais um texto de qualidade,caracteística que lhe é peculiar.Governos estadual e municipal,FNF(Zé Vanildo)Henrique Eduardo,as diretorias do América e do Alecrim...dormiram em berço esplêndido e agora querem a todo custo atribuir ao ABC FC a responsabilidade de fazer acontecer as Séries "C" e "D" no Maria Lamas Farache.Enquanto as"formigas" trabalhavam, as "cigarras"cantavam.Esse é o preço...
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