Grandes eventos desportivos espalham estádios-fantasma pelo mundo afora...
Este é o título da matéria de
Paulo Cutado do jornal Público de Lisboa que pincei do blog de Juca Kfouri e
compartilho com s leitores do Fernando Amaral FC.
O texto é o original – isto é,
escrito como se escreve em Portugal.
Por Paulo Cutado,
Jornal PÚBLICO, de Lisboa.
Os recintos de Aveiro, Leiria e
Algarve são dos maiores exemplos de desperdício de dinheiros públicos na
construção de equipamentos desportivos.
O Mundial 2006, pelo contrário, é
um exemplo a seguir.
Ainda não são conhecidos os
números oficiais finais do investimento britânico nos Jogos de Londres, mas
dificilmente se aproximarão dos 32 mil milhões de euros de Pequim 2008.
Uma soma astronómica para um
evento que dura pouco mais de duas semanas.
Neste oceano financeiro, surgem
mitigados os 381 milhões de euros despendidos no “Ninho de Pássaro”, o Estádio
Olímpico que se transformou na bandeira do evento.
Hoje é uma atracção turística,
mas com os seus 90 mil lugares desertos grande parte do ano, apesar dos nove
milhões de euros de custos de manutenção.
É um dos “elefantes brancos” que
os mega-eventos desportivos espalharam pelo mundo, com Portugal a ter um lugar
de destaque.
São projectos muitas vezes
efémeros, quase sempre megalómanos, ávidos sorvedouros das receitas dos
contribuintes.
São estas as conclusões de um
relatório do Instituto Dinamarquês de Estudos Desportivos (IDED), publicado
recentemente, que alerta para o peso dos legados das grandes organizações
desportivas, construídos sem racionalidade ou planos de sustentabilidade.
O Euro 2004 e parte da sua
herança material, fardos atrofiantes para algumas autarquias, é visto como caso
exemplar de desperdício de fundos.
O estudo estima que a organização
nacional da prova da UEFA tenha implicado um investimento público na ordem dos
mil milhões de euros, entre os valores assumidos por autarquias e Governo.
O dobro da verba despendida, em
conjunto, pela Áustria e Suíça, no Euro 2008.
“Vários dos estádios construídos
ou renovados constituíram uma herança problemática”, refere o documento,
apontando os casos dos estádios de Aveiro, Leiria (Dr. Magalhães Pessoa) e
Faro-Loulé (Algarve), que registam baixos índices de ocupação anual.
Um cenário desolador, mas
perfeitamente previsível para este centro independente de investigação.
A falta de um plano racional e
sustentável dos equipamentos a prazo, que poderia ter passado por uma
diminuição da lotação, após o fim do Euro 2004, para reduzir os custos de manutenção
e adaptar os recintos às realidades futebolísticas locais, explica as
dificuldades actuais.
Os três estádios custaram
aproximadamente 218 milhões de euros (e juntos disponibilizam 84 mil lugares),
segundo números divulgados por uma auditoria do Tribunal de Contas, em 2005.
Montante sem IVA e que inclui o
estacionamento e as acessibilidades. A factura mais pesada do trio foi paga
pela Câmara de Leiria: 83,2 milhões de euros. Seguiram-se a de Aveiro, com 68,1
milhões, e as de Faro e Loulé, com 66,4.
“A experiência portuguesa é
ilustrativa para desmontar o lema “se construirmos estádios os espectadores
aparecerão”. Esta não é uma solução fiável. Alguns estádios foram postos à
venda e a maioria regista fraquíssimos índices de assistência”, refere o estudo,
em que participou o investigador da Universidade de Coimbra (UC) Francisco
Pinheiro.
Mas os portugueses não estão
isolados na forma irracional como avançaram para a construção de muitos dos
equipamentos.
Numa lista que engloba Jogos
Olímpicos de Verão e Inverno, Mundiais da FIFA, Europeus da UEFA, Taça das
Nações Africanas, Jogos Pan-Africanos, Jogos Pan-Americanos, Jogos Asiáticos e
Jogos da Commonwealth, num total de 65 estádios, em 20 países e seis
continentes, o desperdício de verbas públicas é, quase sempre, transversal.
Do Japão, surge o caso do Estádio
Olímpico de Nagano, uma memória pálida dos Jogos Olímpicos de Inverno de 1998.
Com uma capacidade de 30 mil
lugares, custou 87 milhões de euros. Durante o ano de 2010, todos os
espectadores somados ocupariam pouco mais de metade dos lugares.
Em Inglaterra, ainda a viverem a
ressaca dos Jogos, os contribuintes olham com apreensão para este passado de
esbanjamento, enquanto especulam sobre o destino do Estádio Olímpico, onde
investiram 590 milhões de euros.
O seu futuro, que tem sofrido
avanços e recuos nos últimos meses, continua incerto.
À partida, o projecto
arquitectónico deixou aberta a possibilidade de adaptações, como a redução dos
80 mil lugares para 25 mil, através da remoção do anel superior.
Neste momento existem alguns
clubes candidatos à utilização do recinto, destacando-se o West Ham.
Bom exemplo alemão
Apesar do cenário global
negativo, o estudo do IDED também apresenta casos de sucesso.
O maior deles é à organização
alemã do Mundial de 2006.
Aqui, a maioria dos estádios
envolvidos na prova, construídos de raiz ou remodelados, registou um
crescimento considerável da afluência de público, após o evento.
A explicação é simples: “A forte
tradição que o futebol tem por estas paragens, associada à competitividade da
Bundesliga, traduz-se num dos maiores índices médios de espectadores nos
estádios a nível mundial.”
Um oásis num deserto de
desperdícios.
“Este estudo pretende ser uma
espécie de memorando com um elenco dos erros que ciclicamente são cometidos em
particular algo que raramente é feito, como perspectivar o futuro dos
equipamentos construídos e promover a criação de um plano de actividades, pelo
menos para a década seguinte”, sintetizou ao PÚBLICO Francisco Pinheiro.
“Acredito que, nas próximas
décadas, os países que optarem por uma racionalidade do ponto de vista
financeiro, dificilmente irão candidatar-se a receber mega-organizações destas”,
prevê.
Apesar de tudo, não têm faltado
candidatos endinheirados à organização dos grandes eventos.
A 2 de Dezembro de 2010, a FIFA
atribuiu à Rússia a organização do Mundial de 2018 e ao Qatar a de 2022.
Para vencer a corrida, os dois
países comprometeram-se a construir mais de 20 novos estádios.
“Nem a Rússia nem o Qatar têm uma
infra-estrutura de equipamentos desportivos para uma prática satisfatória de
futebol, conforme é exigido pela FIFA, nomeadamente no que se refere à
capacidade dos estádios”, aponta o estudo.
Para obedecer aos regulamentos,
os russos fixaram um orçamento oficial de três mil milhões de euros para a
construção de estádios.
Já o Qatar (país com 1,8 milhões
de habitantes) vai investir 2,4 mil milhões de euros.
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