segunda-feira, fevereiro 15, 2016

O novo dilema do futebol...

Torcedores ou clientes?

Público nos estádios é sustento espiritual dos clubes, fazendo do futebol objeto de paixão

Por José Sámano

Para o El País

Dizia Mario Benedetti que um estádio vazio era “o esqueleto de uma multidão”.

As costelas ainda não estão aparecendo, mas o futebol já deveria estar atento, pois motivos não faltam.

No sábado passado, 10.000 torcedores do Liverpool deixaram o Anfield aos 77 minutos (32 do segundo tempo) do jogo contra o Sunderland.

O motivo: um aumento de 77 libras (443 reais) no preço da cadeira cativa na próxima temporada.

“Somos torcedores, não clientes”, “sem torcida o futebol não é nada”, lia-se entre os muitos cartazes de protesto.

Dias depois, os seguidores do Borussia Dortmund que viajaram a Stuttgart para uma partida da Copa da Alemanha retardaram em 20 minutos sua entrada no estádio, e uma vez lá dentro exibiram faixas com dizeres como: “O futebol precisa ser acessível! ”.

Não parou por aí.

No meio do jogo, a torcida do Dortmund começou a atirar bolas de tênis no campo, em referência aos ingressos habitualmente caros nos grandes eventos do esporte das raquetes.

Em Stuttgart, o ingresso para ver o jogo em pé custava um pouco mais de 20 euros (90 reais); sentado, 40.

Nos Campeonatos Inglês e Alemão, a lotação dos estádios está em torno de 95%.
Duas torcidas organizadas muito tradicionais, a The Kop, do Liverpool, e a Sudtribune, do Dortmund, acenderam esse pavio e agora podem fazer escola, pois a federação de torcedores ingleses não descarta um protesto geral.

A rebeldia das duas organizadas, e de outras que estão por vir, aborda um dos maiores desafios do futebol, o de combinar torcedores e clientes televisivos.

Os primeiros dão alma ao esporte, têm um sentido de pertencimento que vai muito além do mero magnata que esteja à frente do clube.

Os segundos, fiéis distantes, são o grande mercado, a mina de ouro dos operadores de TV paga, o maná por excelência do setor.

Por causa deles são definidos o calendário, as pausas do verão e os horários da temporada; por causa deles as bolas ficam coloridas, e os uniformes, mais berrantes.

Os torcedores in loco adaptam seus almoços e jantares, madrugam ou varam à noite, se molham ou suam…

Mas tudo tem um limite, sejam os caprichos de um dono cingapuriano de passagem por Valência ou de um financista norte-americano que compra o United sem pisar no Old Trafford.

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