Seu nome é Raimundo, mora em uma casa simples, num bairro afastado, sem saneamento básico, sem escola, sem posto de saúde e precisa todos os dias esperar minutos a fio, até que um ônibus resolva dar o ar da graça...
Raimundo assim como milhões de brasileiros não tem escolaridade, ganha um salário mínimo trabalhando o máximo e, com esse dinheiro sustenta os três filhos que com ele ficaram depois da morte da esposa.
Raimundo crê em Deus e em milagres...
Todo o dia olha esperançoso para o céu como se lá estivessem todas as respostas e todo dia carrega sua cruz com resignação.
Mas Raimundo assim como todo brasileiro, foi ainda muito jovem “atingido por uma imensa paixão”... O futebol!
Ainda menino tentou nos campos de areia imitar seus ídolos, mas seus dribles curtos e secos e seus passes precisos, nunca foram vistos por ninguém. Raimundo então acabou por “encerrar precocemente sua carreira de jogador”... Precisava ganhar o pão de cada dia.
Mas a paixão era avassaladora e, a cada dinheiro ganho, Raimundo separava alguns trocados que guardava a “sete chaves” para poder ao menos uma vez por mês, ir ao Machadão ver seu amor jogar.
Ainda hoje, Raimundo separa trocados, levanta cedo, acorda os meninos, toma banho e juntos partilham o café e o pão com manteiga.
Depois, se arrumam para ir à festa e partem orgulhosos em direção ao ponto de ônibus. No caminho encontram adversários que os provocam, mas também encontram iguais, e com eles se confraternizam. Raimundo e seus meninos formam a mais coesa, a mais bela e a melhor das torcidas organizadas.
Não se importam com as gozações e não se sentem diminuídos... Mostram suas camisas e sorriem o sorriso que só os apaixonados sabem sorrir.
Dentro do ônibus, Raimundo não para de falar do orgulho que tem por “seu novo estádio” e da fé de que um dia estará entre os grandes da primeira divisão. Porém, constrangido diz aos filhos baixinho; “Olhem, é só um cachorro quente para cada um e um refrigerante. Não adianta pedir mais, pois o dinheiro é só esse”.
No estádio Raimundo e sua turma se transformam e junto com a massa passam a ser personagens principais do grande espetáculo que é o futebol.
Nesse instante, Raimundo perde a compostura e como todo torcedor, xinga, vaia, berra, se escabela e canta a plenos pulmões.
A cada gol do adversário, Raimundo se aproxima mais de seus filhos e com eles divide a dor. Mas quando a bola ultrapassa as redes do “inimigo”, Raimundo explode junto com seus meninos num contentamento tão intenso que parece que no mundo só eles existem.
Essa é a vida do Raimundo e de seus três meninos. Se perdem, perdem unidos e unidos voltam para casa com o coração partido.
Mas se a vitória lhes sorri, seus peitos transbordam de alegria e lado a lado, marcham altivos para o lar simples. Lá chegando, dividem o pouco que tem, certos de que nada há de separar a melhor torcida organizada que existe...
Raimundo hoje vestiu seus meninos e foi até o Maria Lamas Farache, não pode entrar, não havia ingressos a venda, era uma festa para os homens importantes...
Mas Raimundo e seus meninos estavam orgulhosos e com os olhos cheios de lágrimas, observaram de longe os fogos, os carros, as câmeras e os homens importantes. Depois se foram de mãos dadas, comemorar em casa o aniversário do seu ABC.
Nenhum comentário:
Postar um comentário