Vinícius Segalla
Do UOL, em São Paulo
11 das 12 obras consideradas
prioritárias dentro do planejamento brasileiro em mobilidade urbana para a Copa
do Mundo de 2014 ainda não estão prontas ou já foram abandonadas pelo poder
público.
Dessas, nove só ficarão prontas depois dos Jogos Olímpicos de 2016,
com mais de dois anos de atraso.
Em janeiro de 2010, o Governo
Federal e os governos estaduais, do Distrito Federal e das 12 cidades-sede
assinaram a chamada Matriz de Responsabilidades da Copa, que continha, entre
outras metas, a principal obra de mobilidade urbana a ser erguida em cada
cidade, sempre um sistema de corredor de ônibus ou de transporte urbano sobre
trilhos.
O planejamento trazia previsões
de início e término das obras, custos para cada ente administrativo (União,
governos estaduais e municipais) e divisão das responsabilidades na execução
dos projetos.
Uma apresentação do Ministério do
Esporte de janeiro de 2011 apontou a principal obra em cada um dos municípios
que recebeu jogos durante o Mundial de futebol, bem como a previsão de custo e
divisão dos pagamentos em cada projeto.
Conforme anunciava o Ministério
do Esporte à época, todos os projetos estariam finalizados e em funcionamento
até dezembro de 2013.
Este plano - o de desenvolvimento da mobilidade urbana
nas 12 capitais brasileiras que receberiam os jogos da Copa - era considerado o
grande legado do evento internacional.
Veja, abaixo, como está
atualmente cada uma das 12 principais obras viárias planejadas para a Copa de
2014.
Como estão as principais obras da
Copa?
Belo Horizonte: duas mortes e
três anos de atraso em corredor
O projeto previa um corredor
exclusivo de ônibus do tipo BRT (Bus Rapid Transit, na sigla em inglês), com 25
estações e 16 quilômetros de extensão, ligando o aeroporto de Confins ao centro
da capital mineira, passando próximo ao complexo esportivo onde está situado o
estádio do Mineirão.
Em janeiro de 2010, o governo
previu que estivesse pronto em setembro de 2012.
Durante a Copa das
Confederações, em junho de 2013, entulho, vigas de madeira e de metal e outros
objetos serviram de armas nas mãos dos manifestantes que enfrentaram a polícia ao
fim de uma marcha que teve início no centro da cidade e pretendia terminar em
frente ao Mineirão, mas que foi bloqueada pela PM ainda na avenida Antônio
Carlos, com livre acesso ao quilométrico canteiro da obra.
No dia 3 de julho de 2014,
durante a realização da Copa no Brasil, um viaduto ainda em obras do sistema
viário na avenida Pedro I desabou, matando duas pessoas.
Já em abril deste ano,
um relatório encomendado por uma equipe pericial da Polícia Civil de Minas
Gerais concluiu que a construção de três viadutos erguidos na avenida Pedro I
continham erros em série de projeto, execução e fiscalização.
A obra foi entregue à população
no fim do primeiro semestre deste ano, mas até hoje seguem feitos reparos e
ajustes pontuais ao longo do trajeto.
Brasília: trem vai ficar pronto
para a Copa da Rússia-2018
Uma linha de VLT (Veículo Leve
sobre Trilhos) era a principal obra de mobilidade urbana de Brasília para o
Mundial de 2014.
O sistema de trens urbanos deveria ligar o aeroporto ao
terminal de ônibus da Asa Sul.
O processo licitatório realizado
pelo Governo do Distrito Federal foi concluído em 2010.
No início do ano
seguinte, já havia liminar na Justiça paralisando os trabalhos.
Em abril de
2011, a Justiça determina a anulação do contrato da obra e a realização de uma
nova licitação.
É que houve fraude no processo, que teria sido feito, de acordo
com a Justiça, para beneficiar empresas ligadas a José Gaspar de Souza, então
presidente do Metrô do DF.
Diante do tempo exíguo e da
complexidade da obra, o governo distrital anunciou - já em 2012 - a retirada da
obra da Matriz de Responsabilidades da Copa.
O projeto, então, foi redesenhado
e, atualmente, a expectativa é que a construção tenha início no ano que vem.
Se
isso ocorrer, pode-se esperar a conclusão para 2018.
Cuiabá: trem bilionário segue com
obras paradas
Em junho de 2011, a Assembleia
Legislativa de Mato Grosso aprovou a construção de uma linha de VLT (Veículo
Leve sobre Trilhos), de custo então previsto de mais de R$ 1 bilhão, na cidade
de Cuiabá.
A obra foi incluída no plano de mobilidade urbana da cidade para a
Copa do Mundo de 2014, contrariando a opinião unânime de técnicos em
engenharia, que eram favoráveis à construção de um sistema de corredores de
ônibus na cidade (por metade do preço da linha do VLT), que era o que estava
incluído na Matriz de Responsabilidades original.
O sistema de transporte não ficou
pronto a tempo para a Copa. Até hoje, a capital de Mato Grosso é cortada por
linhas inacabadas do VLT, cuja construção chegou só até a metade, está parada
desde o ano passado e já consumiu cerca de R$ 1 bilhão dos cofres estaduais.
Se
for concluída, deverá custar pelo menos mais R$ 1 bilhão.
Para explicar o motivo de ter
alterado radicalmente o planejamento de mobilidade urbana montado para a Copa,
o deputado Romualdo Júnior (PMDB), que era presidente da Assembleia quando a
substituição de modal foi aprovada na Casa, afirmou: foi "euforia do
momento".
Corredores em Curitiba: conclusão
prevista para 2016
Os principais projetos da Matriz
de Responsabilidades previstos para a capital paranaense eram dois corredores
viários que integrariam os municípios da região metropolitana de Curitiba e
suas vias radiais e também fariam a ligação do aeroporto Afonso Pena à zona
hoteleira da cidade e ao estádio Arena da Baixada.
A obra totalizaria 92 quilômetros
de pistas de rodagem e dez obras de arte especiais (pontes, viadutos e
trincheiras), a um custo previsto de R$ 250 milhões.
A previsão era entregar
tudo até maio de 2013.
Até hoje, pouco mais da metade
dos projetos foi entregue.
A parte do corredor da avenida Cândido de Abreu, por
exemplo, foi retirada da Matriz e não será executada.
Já a requalificação das
vias já existentes e que passariam a integrar o Corredor Metropolitano só será
concluída no ano que vem.
VLT de Fortaleza: ficou para 2017
Na capital cearense, o principal
projeto era de uma linha de VLT ligando o terminal Intermodal do Bairro de
Parangaba à região portuária e hoteleira do Mucuripe, passando pela rodoviária
e pelo aeroporto.
Seriam 13 quilômetros e dez estações.
A entrega era prevista
para junho de 2013.
Nada saiu como o esperado. O
governador do Estado rompeu em junho de 2014 o contrato com o Consórcio CPE-VLT
Fortaleza, responsável pela execução da obra.
A decisão foi anunciada após
sucessivas notificações de atraso feitas pela Secretaria de Infraestrutura às
empresas.
Em maio do mesmo ano, a pasta estadual admitiu que a obra não ficaria
pronta até a Copa do Mundo. Já o prazo então estipulado era junho de 2014.
Após essa paralisação, duas
outras licitações foram abertas e fracassaram, uma por questões técnicas e a
outras porque não apareceram empresas interessadas.
Atualmente, após a
realização de três novas licitações e divisão do projeto em trechos, a obra
está cerca de 50% executada e tem prazo de conclusão para o início de 2017.
Manaus: projetos engavetados
O planejamento oficial de governo
federal, Estado do Amazonas e Prefeitura de Manaus, estabelecido em janeiro de
2010, previa que a sede amazônica da Copa receberia investimentos da ordem de
R$ 1,7 bilhão.
O governo estadual comprometeu-se a construir uma linha de
monotrilho e o município de Manaus assumiu a obrigação de fazer um sistema de
corredores de ônibus integrado.
Prazo de conclusão dos trabalhos: dezembro de
2013.
Na hora de construir, porém,
constatou-se que Estado e prefeitura não haviam se dado conta de que os
projetos de monotrilho e BRT deveriam ter sido pensados juntos e, em muitos
pontos, passariam pelas mesmas localidades, chegando até a ter pontos de parada
previstos exatamente no mesmo local, o que seria impossível de operacionalizar.
Na metade de 2012, o governo
amazonense reduziu seu plano inicial do monotrilho a ser entregue até a Copa
dos originais 39 quilômetros para menos da metade, ou 15,5 quilômetros.
Já em
novembro do mesmo ano, quando as obras ainda não tinham saído do papel, governo
e prefeitura informaram oficialmente à população que já não pensavam mais em
construir os sistemas de transporte a tempo para a Copa, e que por isso estavam
retirando as obras da Matriz e passariam, a partir dali, a projetar um novo
plano de mobilidade urbana para a cidade, que ainda não foi executado.
Natal: ligação com o aeroporto
ficou para 2016
Na capital potiguar,
investimentos de R$ 430 milhões eram previstos para contruir, asfaltar,
requalificar vias e erguer pontes e viadutos na rodovia que deveria ligar o
novo aeroporto de São Gonçalo do Amarante (Grande Natal) ao setor hoteleiro da
cidade, passando pela Arena das Dunas.
A previsão de entrega era julho de 2013.
A obra dos acessos do aeroporto foi licitada em 2009, mas só teve início em
agosto de 2013.
A obra não está concluída até
hoje. Foi só no dia 26 de outubro deste ano que o Governo do Rio Grande do
Norte anunciou a liberação do trânsito no viaduto de um dos dois acessos ao
terminal aeroportuário.
A conclusão do chamado Acesso
Norte agora depende do término da duplicação da BR-406. A previsão atual - a
quinta desde o início dos trabalhos, é para dezembro deste ano.
Já o acesso sul
tem previsão de ser concluído em 2016, segundo informa o Departamento de
Estradas e Rodagens do Estado.
Porto Alegre: obras ainda sem
previsão de início
O plano de mobilidade urbana
montado por Porto Alegre não trazia nenhuma obra preponderante.
Era composto por
dez projetos viários, todos eles de responsabilidade municipal.
Estavam
previstas a construção de três corredores de ônibus, obras de arte relacionadas
e monitoramento destes três corredores.
Além disto, previa-se também a
construção de três BRTs, uma obra viária e melhorias no Complexo Viário da
Rodoviária.
De um total de dez obras, apenas
cinco foram concluídas até hoje: três viadutos e a ampliação de duas vias,
estas no entorno do estádio Beira-Rio.
As restantes ou estão inacabadas ou
ainda não saíram do papel.
Um dos casos é emblemático.
O
prolongamento de dois quilômetros da avenida Severo Dullius, na zona norte, era
uma obra planejada para compor o anel viário que daria acesso ao aeroporto
internacional da cidade e tida como essencial dentro do plano de mobilidade
urbana do município para receber a Copa.
Apesar disso, a obra ainda não
saiu do papel.
A última previsão do governo municipal para início dos trabalhos
seria 15 de setembro deste ano, o que não ocorreu.
Atualmente, a prefeitura de
Porto Alegre informa que não há previsão.
Recife: mais de dois anos de
atraso na Via Mangue
A Prefeitura Municipal do Recife
pretendia concluir até setembro de 2013 as obras do Corredor Via Mangue, que
ligaria a região central da capital pernambucana aos aos bairros de Boa Viagem
e Pina. Não ocorreu desta maneira.
O corredor, que deveria ter pista
dupla, opera até hoje em pista simples.
Os trabalhos começaram em junho de
2011. Até dezembro de 2013, ou três meses após a previsão inicial de entrega da
obra, apenas 63% dos trabalhos estava concluído, segundo estimativa do Tribunal
de Contas do Estado.
Dois meses antes, o órgão havia apresentado uma série de
estudos apontando que a Via Mangue não seria entregue antes de 2016.
A obra ficaria, então, para abril
de 2014. O tráfego, no entanto, só foi liberado em junho daquele ano, em pista
simples, e só no sentido Pina-Boa Viagem.
O restante seria entregue até
dezembro do ano passado.
Depois disso, porém, uma série de
irregularidades foram encontradas no contrato e na execução da obra.
Os
trabalhos foram paralisados por quase 12 meses, e retomados em maio deste ano,
após a assinatura de um novo convênio entre a prefeitura do Recife e a Caixa
Econômica Federal.
O prazo de conclusão atual é dezembro de 2015.
Transcarioca, no Rio de Janeiro:
a única obra entregue
A Transcarioca é a obra mais cara
entre todas as realizadas para a Copa do Mundo de 2014.
O sistema de BRT
ligando a Barra da Tijuca ao Aeroporto do Galeão tinha prazo de conclusão para
maio de 2013 e custo previsto de R$ 1,6 bilhão.
Estourou o prazo e o preço, mas
está em pleno funcionamento.
Ainda inacabado, foi oficialmente
inaugurado em abril do ano passado após consumir R$ 2,2 bilhões.
Sua construção
trouxe benefícios a quem usa o transporte público, mas ainda apresenta
problemas que estão sendo resolvidos pouco a pouco.
A verdade, porém, é que a obra
funciona e agrada à população.
Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em
maio deste ano aponta que 74% dos passageiros aprovam o sistema de transporte.
Salvador: projetos abandonados
Em janeiro de 2010, foi inserido
na Matriz de Responsabilidades da Copa um projeto para construir dois
corredores de BRT em Salvador.
A empreitada custaria pouco mais que R$ 570
milhões.
Em agosto do mesmo ano, foi
assinado um contrato entre os governos federal e estadual da Bahia, que se
comprometeram a entregar a obra até maio de 2013.
No fim de 2011, porém, o
governo estadual entendeu que seria necessário mudar radicalmente o plano de
mobilidade urbana de Salvador para a Copa.
A ideia de fazer o sistema de BRT
foi abandonada.
Decidiu-se que o ideal era investir na conclusão e expansão do
Metrô de Salvador.
A obras do metrô soteropolitano
começaram, no ano 2000.
Deveriam ter durado 40 meses, mas já duraram 180.
Ficou
pronto, em fase de testes, no mês da Copa, junho de 2014.
A expectativa é de
que o projeto integral desenhado em 2014 seja concluído em 2017.
São Paulo: quatro anos de atraso,
e monotrilho fica para fim de 2017
A única obra que o Governo do
Estado de São Paulo inseriu na Matriz de Responsabilidades da Copa em 2010 foi
a Linha 17-Ouro do Metrô.
A linha terá 17,7 quilômetros de extensão e 18
estações.
Quando assinou a Matriz, a promessa do governo estadual era entregar
a obra toda até março de 2013.
Já quando assinou o contrato com
o consórcio vencedor para construir o monotrilho, em julho de 2011, os prazos
eram outros.
A previsão passou a ser entregar somente dois terços da obra até
meados de 2014.
O terceiro trecho passou a ter previsão de entrega para meados
de 2015.
Em novembro do mesmo ano, o Estado passou a dizer que, a tempo para a
Copa do Mundo, apenas pouco mais de um terço da linha, ou 7,7 quilômetros,
estariam prontos.
Já em novembro de 2012, após
atrasos nas desapropriações necessárias para a obra, que enfrentaram
contestações judiciais em virtude dos baixos valores indenizatórios ou
problemas nas políticas de habitação relacionadas, o governador Geraldo Alckmin
(PSDB) admitiu que o primeiro trecho da obra só deveria ficar pronto, se
ficasse, no final de 2014.
Não ficou.
Atualmente, o Estado
do São Paulo promete que irá entregar toda a obra - prometida para março de
2013 - até o final de 2017.
Após a publicação desta reportagem, o governo
paulista entrou em contato com o UOL Esporte e passou sua quarta versão desde
2011 para justificar os atrasos.
Ela pode ser lida no seguinte endereço: http://esporte.uol.com.br/futebol/ultimas-noticias/2015/11/17/apos-reportagem-do-uol-governo-de-sp-lanca-4-versao-sobre-atraso-no-metro.htm