Segundo minha certidão de nascimento,
o relógio marcava 0 hora e 30 minutos do dia 10 de dezembro de 1955, quando
deixei o confortável e seguro invólucro onde permaneci guardado por nove meses
no interior do corpo de minha mãe...
Por sorte, não restou nenhuma lembrança
dos primeiros segundos, onde uma palmada me fez chorar, abriu meus pulmões e me
revelou a luz...
Certamente não seriam boas
lembranças.
Por azar, também não restou
nenhuma lembrança do aconchego nos braços de minha mãe, da maciez de seus
seios, do infinito prazer de suas mãos a me acariciar e da alegria imensa que
devo ter sentido quando seus olhos marejados e cheios de ternura encontraram os
meus...
Por certo, seriam doces
lembranças.
Hoje, completo, 56 anos...
Olho para trás e sinto saudade da
minha infância e dos anos dourados de minha adolescência...
Contos os muitos dias
ensolarados, azuis e felizes...
Conto também, alguns dias
tempestuosos, amedrontadores e opressivos.
Contos os muitos que conheci e os
poucos que chamei de amigos, mas curiosamente, não conto nenhum por quem tenha
sentido ódio.
Relembro os sonhos que o vento
dissipou e os que consegui realizar...
Penso nas coisas que não fiz, por
medo, por preguiça ou por ser arrogante demais...
Penso nas coisas que fiz e me
sinto feliz por tê-las feito, mas devo confessar que algumas, ainda me causam
arrepios, pois foram tão irresponsáveis e temerárias, que poderiam ter me
impedido de aqui estar.
Mas cá estou e não me envergonho
de nada...
Se não amealhei dinheiro, se não me
tornei célebre e não conquistei poder, posso perfeitamente explicar...
Em alguns momentos me faltou
gana, em outros, preferi manter princípios...
Foi melhor assim, meu telhado
hoje, tem mais telhas que vidros e, portanto, dificilmente, uma pedra irá estilhaçá-lo.
Honrei o nome de meus
antepassados, de meu pai e de minha mãe e acima de tudo, busquei manter honrado
meu nome, para que meu filho e agora, minhas netas, possam caminhar sob o sol
com a cabeça erguida.
Chego aos 56 anos, grato aos tantos
que me estenderam as mãos...
Alguns, talvez muitos, nem saibam
ou nem lembrem, mas eu me lembro de cada um.
Por falar nisso, aqui, agora e só
com meus pensamentos, me ocorreu um fato interessante...
Nunca fui um conquistador, um
garanhão, um colecionador de mulheres...
Nunca fiquei...
Sempre amei.
Sempre me extasiei a cada novo
encontro e sempre sofri desesperadamente a cada perda...
Não tive as tantas mulheres que
muitos dos meus amigos e companheiros de estrada ainda hoje se gabam...
Mas me gabo ao dizer a eles, que
das poucas que tive, ainda guardo o rosto e sei o nome.
Minhas mulheres não foram
raparigas de noites de festas e nem dos dias ociosos...
Foram sim, meninas doces, ternas
e bonitas, que me fizeram sentir na plenitude o prazer de ser macho e homem...
Nenhuma delas passou em minha
vida; todas deixaram seu cheiro, seu gosto, seus rostos, seus nomes e uma
serena saudade.
Chego aos 56 anos ainda as
amando...
Não com a paixão e a volúpia dos
anos idos, mas com ternura e gratidão...
Sem elas, eu jamais teria descoberto
o prazer e aprendido a sofrer.
Pois bem, o relógio agora, marca
0 hora e 30 minutos...
Minha mãe já não está aqui para
me abraçar e nem meu pai para sair proclamando aos quatro ventos ser eu um
varão.
Chequei enfim ao planalto de minha
vida e caminho agora para o declive que me levará ao ponto final de minha estada
no planeta...
Como é bom poder chegar aqui sem
nenhuma sacola de mágoa, sem nenhuma mochila de rancor ou mala repleta de ódio
e recalque...
Como é bom olhar para trás e não
sentir vergonha...
Como bom olhar para frente e
saber que ao fim da estrada, poderei deitar minha cabeça no colo da morte e
antes da escuridão poder suspirar e dizer baixinho: valeu a pena ter passado
por aqui.
Um comentário:
Parabéns Fernando Amaral ! Não apenas ao professor e blogueiro, bem como ao estadista do futebol.
Cordialmente,
José Leonardo
DO BLOG
Musica do Gol
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