domingo, maio 24, 2020

A despedida do Parque Antártica...

Imagem: SE Palmeiras

A despedida do Parque Antártica

Há 10 anos, o Palmeiras goleou o Grêmio na despedida do estádio em que jogou por mais de 90 anos, deixou o Palestra Itália para dar lugar a reforma que ergueu o novíssimo Allianz Parque e catapultou o clube ao novo século

Pedro Henrique Brandão/Universidade do Esporte

Com o início dos anos 2010, uma boa nova chegou ao palmeirense: o estádio Palestra Itália seria reformado e se transformaria numa das arenas mais modernas do mundo.

Para isso, porém, o velho Parque Antártica de tantas alegrias teria de ir ao chão num ambicioso projeto arquitetônico que usaria o mesmo espaço do antigo estádio, reaproveitaria a arquibancada existente atrás do gol e faria surgir uma imponente arena para 40 mil torcedores.

Mesmo que a promessa fosse de um passaporte para o futuro, 11 entre 10 desconfiados palestrinos estavam com o porco atrás da orelha.

Como assim, demolir nossa casa?

Colocar abaixo o lugar onde conquistamos a América?

Onde vamos jogar?

É bom lembrar que há pouco tempo, o Palmeiras havia retomado o hábito de mandar seus jogos em casa e vivera a breve felicidade de sua história recente, por lá.

O Paulistão de 2008 havia sido conquistado no Jardim Suspenso, com direito a gás de pimenta, cala boca aos tricolores e goleada na Ponte Preta.

A identificação era evidente, era como se o Palmeiras nunca tivesse saído do Parque Antártica.

O investimento feito nos idos anos 1920 havia valido a pena.

O Palestra mandava seus jogos por ali desde 1917 e até 2010 conquistou um histórico invejável:

1569 jogos
1063 vitórias
318 empates
188 derrotas
3698 gols-pró

Foi no Parque Antártica, inclusive, que foi disputado o primeiro dérbi da história quando o Palestra venceu o Corinthians por 3 a 0 no campo que virou casa própria três anos depois.

Adquirir o Parque Antártica, antigo clube da cervejaria, foi rotulado como uma loucura para a época, mas foi sobretudo fruto de um grande desejo palmeirense como disse ao jornal Fanfulla, Menotti Falchi, presidente alviverde em fevereiro de 1920:

“Clubes menores possuem um campo. Temos de achar uma casa. Não é qualquer terreno que nos agrada, pois a grandeza da comunidade italiana e de nossos torcedores não concordaria. Um estádio moderno é o desejo de todo palestrino”

Por isso, naquele 22 de maio de 2010, um sábado, o palmeirense rumou a caminho da rua Turiassu.

O jogo contra o Grêmio estava marcado para as 18h30min, porém, a venda de ingressos pela internet ainda não era tão comum e chegar cedo em ocasiões como aquela poderia fazer a diferença entre conseguir ou não um ingresso.

Exatos 18.365 torcedores conseguiram comprar seus ingressos para assistir à última vez em que a bola rolou oficialmente no Parque e lotaram a casa.

Antes de a bola rolar, porém, a torcida protestou muito contra a diretoria pelo momento conturbado nos bastidores, afinal, ainda era maio e o Palmeiras já havia demitido dois treinadores e os prometidos reforços não chegavam ou quando vinham não eram nem de longe o que o torcedor esperava.

Quem entrou viu um Palmeiras com ânimo para driblar o momento ruim que o time vivia depois da ressaca do triste 2009.

Mesmo em crise e com um treinador interino no comando, o Palmeiras arrancou um placar animador contra o Grêmio: 4 a 2.

O Tricolor Gaúcho também não estava bem das pernas.

Aquela era a terceira rodada do Brasileirão 2010 e ao fim da partida, o Grêmio somava apenas um ponto.

Dirigido por Jorge Parraga, interino que era auxiliar de Antônio Carlos Zago, que por sua vez assumira o comando alviverde após a demissão de Muricy Ramalho, esse caótico Palmeiras entrou para sua última partida oficial no Parque Antártica com Marcos; Vitor, Léo, Danilo e Pablo Armero; Edinho, Márcio Araújo, Marcos Assunção e Cleiton Xavier; Ewerthon e Vinicius. Entraram no decorrer da partida Paulo Henrique, Maurício Ramos e Souza.

Àquela altura, o palmeirense reclamava dos nomes duvidosos que surgiam aos montes depois da implosão do projeto Luiz Gonzaga Beluzzo, mas nem imaginava o calvário que ainda enfrentaria nos anos seguintes.

Os elencos do título da Copa do Brasil 2012 e do quase rebaixamento em 2014 provam que o fundo do poço sempre poderia ser revogado.

Contrariando tudo que a imprensa poderia prever sobre aquele confronto, o primeiro tempo foi animado e logo aos 16 minutos o Palmeiras tirou o zero do placar com Ewerton.

Mais 15 minutos e Marcos Assunção começava a provar a importância que teria para o elenco em sua passagem pelo Alviverde, o volante lançou na área e Vinícius anotou o segundo tento palestrino.

No último minuto do primeiro tempo, Jonas descontou para o Grêmio.

A primeira etapa poderia acabar assim, mas Douglas e Marcos Assunção trocaram gentilezas nos acréscimos e expulsos foram curtir mais cedo a noite do sábadão paulistano.

Com menos homens em campo, o ritmo poderia cair na etapa final, mas os times repetiram exatamente o mesmo desempenho do primeiro tempo.

Porém, dessa vez, o Grêmio foi quem tomou a frente e empatou o jogo logo aos 3 minutos com Hugo.

Pressionado e motivado pelo Parque Antártica, o Palmeiras foi o time da virada pela última vez no Jardim Suspenso.

Aos 16 minutos, Mauricio Ramos subiu mais que a zaga gremista e colocou o Verdão na frente.

Empurrado pela voz do velho Palestra Itália, o Palmeiras se manteve no ataque e fechou a fatura com Cleiton Xavier.

Ao apito final, muitos torcedores ficaram um pouco mais dentro do estádio numa despedida comovente.

Outros foram se dispersando assim que o jogo acabou e proporcionaram pela última vez a bonita cena do fosso do Jardim Suspenso cheio de gente como se fosse a torcida que segurasse o time nos ombros.

Outro jogo de despedida foi marcado para o dia 9 de julho, mas o adversário — o Boca maldita — venceu e estragou o que era para ser festa.

Portanto, para qualquer bom palestrino que se preze, o que valeu foi a goleada no Grêmio naquele 22 de maio de 2010.

Os portões do número 1840 da rua Turiassu ficaram fechados por longos 4 anos e 5 meses até a inauguração do novíssimo Allianz Parque no dia 19 de novembro de 2014 e como na compra do Parque Antártica, a construção do moderno estádio foi taxada de loucura, mas isso é história para daqui a cem anos.

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