Imagem: Autor Desconhecido
Vadão, o
arquiteto do Carrossel Caipira
O treinador
Oswaldo Alvarez, o Vadão, morreu nesta segunda-feira, aos 63 anos, vítima de um
câncer hepático.
No início dos
anos 1990, Vadão foi o criador do Carrossel Caipira, um time do Mogi Mirim que
revolucionou o futebol brasileiro
Por Pedro
Henrique Brandão Lopes
A Copa do
Mundo de 1990 trouxe um trauma para o brasileiro que aprendia a gostar de
tática.
O 3–5–2 de
Sebastião Lazaroni decepcionou e ganhou a pecha de esquema falho, já que não
permitia atacar como tradicionalmente o torcedor da Amarelinha gostava e nem
fazia da defesa uma fortaleza intransponível - Caniggia e Maradona que
digam - como se esperava.
Naquele
cenário era improvável que qualquer treinador ariscasse o pescoço contra o
estigma do esquema tático.
Apenas alguém
que estivesse livre dos preconceitos da área e leve das responsabilidades de
treinador poderia experimentar o 3–5–2, àquela altura sinônimo de fracasso.
É preciso
coragem ou falta de opção para tentar o diferente e assim era o ambiente do
Mogi Mirim em 1992.
Depois de uma
péssima campanha no Campeonato Paulista de 1991, último colocado do grupo
verde, o presidente Wilson Fernandes de Barros decidiu dar novos ares ao
futebol do clube e montou a equipe apenas com jovens jogadores formados na base
ou contratações sem renome.
No comando da
experiência, Oswaldo Alvarez, um novato.
Vadão era
preparador físico do clube e foi convencido pelo presidente a dirigir a equipe.
Aceitou por
ter carta branca para tentar algo novo e surpreendeu por apresentar uma
revolução no estilo de jogo brasileiro.
Com tempo de
sobra para treinar antes da estreia, aquele time serviu como laboratório para
inovação tática no Brasil.
Inspirado na
Laranja Mecânica de Rinus Michels, em 1974, Vadão montou uma equipe
extremamente veloz na saída de bola e com imensa consciência tática que
permitia aos jogadores não guardarem posições fixas.
Despretensiosamente,
Vadão conseguiu romper com a tradição dos pontas do futebol brasileiro e
repaginou um conceito da última grande inovação do futebol mundial: o elemento
surpresa vindo de trás.
Foi uma
mudança de paradigma na tática do futebol brasileiro, pois até o início dos
anos 1990, os times eram montados a partir das ações ofensivas dos pontas.
O ataque era
pensado pelos lados do campo e Vadão percebeu que havia um vácuo no meio-campo.
Claro que era
preciso talento e qualidade técnica para colocar em prática o ousado esquema.
Rivaldo, Leto
e Válber eram os responsáveis pelo gingado brasileiro do Carrossel Caipira.
Com
versatilidade para entender o pensamento do treinador, o trio passou a atuar de
maneira diferente da que estavam acostumados.
A fórmula deu
certo e nas temporadas de 1992 / 93, o time do interior paulista teve um
destaque que não se equiparava ao modesto orçamento.
No primeiro
ano, o Sapão da Mogiana foi campeão da Copa 90 Anos de Futebol, organizada pela
Federação Paulista com os times do interior.
Em 12
confrontos, o Carrossel Caipira perdeu apenas uma partida.
No Paulistão,
o Mogi liderou o grupo B e se classificou para o quadrangular semifinal, porém,
não conseguiu a classificação às finais pelo saldo de gols.
Em 1993,
novamente campanha acima da média do Sapão.
Apesar de não
conseguir a classificação para a segunda fase do Paulistão, no Torneio João
Havelange - uma espécie de mini Rio/SP -, eliminou o Corinthians nas semifinais
e ficou com o dolorido vice-campeonato frente ao Vasco da Gama, nos pênaltis,
depois de devolver um 4 a 0 na decisão.
Antes do
final do ano, mais um título.
No Torneio
Ricardo Teixeira, que classificava à segunda divisão, vitória sobre o Bangu nas
semifinais e apenas uma derrota na competição, o Mogi sagrou-se campeão.
O sucesso,
porém, custou caro ao Mogi Mirim, pois os grandes clubes da capital avançaram
ferozmente sobre os talentos lançados por Vadão.
Corinthians e
Palmeiras se reforçaram com jogadores do Sapão, até reservas foram negociados
e, em 1994, sem seus principais atletas, o Mogi acabou rebaixado no Paulistão.
Vadão deixou
o clube após o rebaixamento e iniciou uma trajetória que o levou a dirigir 18
equipes em 28 anos de carreira.
Fez história
pelos times de Campinas, onde dirigiu tanto Guarani como Ponte Preta e ostenta
o feito de nunca ter perdido um único Dérbi Campineiro, em nove clássicos que
disputou- cinco vitórias (quatro pelo Guarani e uma pela Ponte) além de quatro
empates.
Ainda
comandou o São Paulo, onde é considerado o responsável por promover Kaká ao
time profissional, Corinthians e a Seleção Brasileira Feminina, este seu último
trabalho e o mais questionado.
Implacável, o
tempo deixou o vanguardista de outrora, ultrapassado no trabalho feito com na
Seleção Feminina e, por isso, após a eliminação na Copa do Mundo de 2019, Vadão
foi demitido e deu lugar a Pia Sundhage.
É assim com
todos, uma hora a novidade fica velha e cede espaço.
Marta,
Cristiane e inúmeras personalidades do esporte e da imprensa além de clubes se
manifestaram nas redes sociais lamentando o falecimento de Vadão e uma
característica é constante: a gentileza com que lidava com as pessoas.
Oswaldo
Alvarez foi um personagem marcante na modernização do futebol brasileiro.
Com poucos
recursos conseguiu montar um time diferente, que jogou o melhor futebol no
Brasil no ano de 1992 e que para sempre será lembrado como o Carrossel Caipira,
a maior herança futebolística que Vadão deixará ao esporte.
Para além
disso, nos relatos de quem conviveu com o treinador, Vadão foi um homem digno,
profissional comprometido e que deixou no duro meio do futebol sua marca além
das quatro linhas com sua gentileza conquistou amigos leais e uma família
afetuosa, essa sua herança definitiva como ser humano.
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